Na última sexta-feira, 27 de março, pela
primeira vez, o mundo se uniu em oração ao Papa Francisco para acompanhar,
direto da Praça São Pedro vazia, a bênção extraordinária Urbi et Orbi – que
geralmente é feita apenas no Natal e na Páscoa. O momento de oração foi um
pedido pelo fim da pandemia do novo coronavírus. Além disso, Francisco concedeu
indulgência plenária – que é o perdão do mal causado como consequência do
pecado – aos fiéis.
Desde o início da pandemia no Brasil, inúmeros
momentos de oração, reflexão e pregação têm tomado conta das redes sociais.
Muitos deles sem fundamento algum na Doutrina Católica, que é constituída pelo
conjunto de dogmas, verdades de fé , ensinamentos, preceitos e leis que formam
o magistério da Igreja Católica Apostólica Romana.
O professor de teologia da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Fernando Altemeyer Júnior,
escreveu recentemente sobre amuletos e proteção. “Deus não escolhe uns e mata
outros de forma sádica ou como algo inevitável da roda cíclica da morte”,
disse.
Em um trecho do texto, o professor destaca que
“essa maneira de ver a religião como amuleto da sorte, ou posse de objetos
sagrados que me salvassem do mal que todos estamos submetidos é tremendamente
defeituosa e caricata. Falsifica Deus e o faz ser um agente do mal”.
Ainda segundo o texto, o teólogo afirma que a
oração não é vacina nem é antídoto. “Se fosse assim a dezena de padres mortos
em Bolonha estaria viva! Fé é a força da esperança de quem crê e confia sem
resultados aparentes. Pessoas de fé também morrem e às vezes mais que os
incrédulos. Fé não salva uns e mata outros, protegendo uns e discriminando
outros. Se fosse assim estaríamos dizendo que Deus detesta Itália e ama o
Brasil”.
O professor Altemeyer destaca no texto que
“Deus nos ama por igual, todos e cada um, crente ou ateu, mesmo se não rezássemos
nem um pai-nosso. Deus que é Pai perdoa antes que abramos a nossa boca. Atenção
para esse tipo de religião mágica de barganha e privilégios”.
Em uma rápida busca pela internet é possível
ver que as pessoas têm escrito e compartilhado “explicações” sobre os desígnios
de Deus a respeito da pandemia do coronavírus. Diante disso, o portal da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) conversou com o bispo de Santo
André e presidente da Comissão Episcopal para a Doutrina da Fé da CNBB, dom
Pedro Carlos Cipollini, que destacou que esta visão de que Deus castiga e pune
não está de acordo com a revelação que Jesus nos fez do Pai que não quer a
morte do pecador, mas que ele se converta de vida.
Leia a aqui entrevista completa:
Deus quem manda o vírus para converter o povo?
Não é Deus que manda. Esta visão de que Deus
castiga e pune não é de acordo com a revelação que Jesus nos fez do Pai que não
quer a morte do pecador, mas que ele se converta e viva. Jesus disse ainda:
quero misericórdia e não sacrifício.
Deus não manda, mas permite com um objetivo maior?
Deus permite? Sim, Deus permite as
consequências das ações do próprio homem que hoje por exemplo está de certa
forma destruindo a natureza, a terra, nossa casa comum. Isto porque Deus é Pai
mas não paternalista, ele permite que soframos as consequências de nossas
escolhas.
A fé pode ser uma armadura e evitar as infecções?
A fé é sempre uma armadura do espírito para,
mais que evitar, vencer o mal em todas as suas manifestações. Porém, a cura
pode ser fruto da própria ação inteligente do homem que consegue descobrir os
remédios necessários. Agora algumas curas são especiais e fruto da intervenção
direta de Deus sem explicações científicas.
Somente os não pecadores e convertidos serão salvos?
Esta pergunta sobre quem será salvo está lá no
Evangelho de Marcos (cap. 16,16) “quem crer será salvo” . Consideremos que este
ato misterioso de crer pode vir até em um último momento como veio para o bom
ladrão. Serão salvos os pecadores que reconhecem seu pecado e os que estão no
caminho da conversão. Deus quer que todos se salvem e nenhum se perca.
Como podemos enxergar coerentemente aos olhos da fé tudo que está
acontecendo?
Aos olhos da fé devemos ver a ação de Deus em
tudo. Ele está presente em tudo o que acontece mesmo que seja algo que
aparentemente seja absurdo como a morte de um inocente na cruz (Jesus). A fé
nos ensina além disso que tudo concorre para o bem dos que creem e amam a Deus.
Pois Deus sabe tirar o bem de situações que são ruins como a morte na cruz. Foi
passando pela cruz que Jesus ressuscitou. Morrendo destruiu a morte. A fé
aponta para o mistério pascal que está impresso em todas as realidades e também
nessa de pandemia. É um momento de sofrimento, mas Deus fará surgir uma luz. A
vida tem a última palavra, Deus tem a última palavra, esta é a visão da fé.
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CNBB
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