Uma das inteligências mais privilegiadas da história do pensamento
humano foi, sem dúvida, Santo Tomás de Aquino; já em vida, teve um enorme
prestígio. A sua obra filosófica e teológica continua sendo uma referência
obrigatória. Quando o Papa Urbano IV lhe propôs ser cardeal, Fr. Tomás não quis
aceitar tal dignidade. O Papa perguntou-lhe se recusava o título por razões de
humildade, ao que Tomás de Aquino respondeu: “Não, Santo Padre. Na verdade, eu
desejo algo maior”. O Papa surpreendido disse: “Você quer ser Papa?”. Então
Santo Tomás manifestou o seu desejo: “O que eu quero é que a festa de Corpus
Christi se estenda a toda a Igreja”. O Papa, antes de responder, ficou um pouco
meditativo; depois lhe disse: “Pedis muito, Tomás, mas o farei se me
prometerdes encarregar-vos da composição da liturgia da festa”. E assim foi! A
festa de Corpus Christi começou a celebrar-se em toda a Igreja Católica por
meio da Bula Transiturus, de Urbano IV, do dia 8 de setembro de 1264, e os
belíssimos textos que a liturgia da Igreja tem para essa solenidade, tanto na
Missa como na Liturgia das Horas, foram escritos por esse grande Santo.
A partir do século XIV, as procissões foram sendo incorporadas à
celebração desta festa. O Concílio de Trento reconhece que, pela piedade
popular, foi sendo introduzido na Igreja de Deus o costume de celebrar
anualmente, em dia festivo, o excelso sacramento e declara que, com honra e
reverência, seja levado em procissão pelas ruas e lugares públicos. Com essa
manifestação pública de fé, os cristãos e cristãs testemunham a sua gratidão
pelo dom da eucaristia, pelo qual se torna presente a vitória sobre a morte e a
ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo.
No dia de hoje, ao participarmos da Santa Missa e sairmos às ruas em
Procissão, façamo-lo com fé, com amor, com devoção, com dignidade, em espírito
de adoração. Sejamos esmeradamente cuidadosos com o Corpo e o Sangue de Deus.
Somente se soubermos cuidar o Corpo Eucarístico do Senhor, cuidaremos da
maneira que convém do Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja, e dos nossos
irmãos numa verdadeira fraternidade e solidariedade. Dediquemos ao culto eucarístico
os nossos melhores esforços, os melhores ornamentos, os melhores cálices, os
melhores cantos. Tudo para Deus!
Diante da presença de Jesus Cristo, sejamos educados, corteses,
elegantes. Ao entrar na igreja, não nos esqueçamos de usar um pouco da água
benta disposta nas paróquias para esse fim, a água benta nos lembra o nosso
batismo e nos livra das ciladas do demônio. Em seguida, procuremos onde está o
Sacrário e façamos uma genuflexão pausada diante do nosso Deus; que seja uma
genuflexão bem feita, isto é, dobrando joelho direito até o chão (não é jeitoso
benzer-se ao mesmo tempo, primeiro se faz a genuflexão e depois se benze, ou ao
contrário). Não conversemos dentro da Igreja, caso seja necessário falar algo
com alguém, façamo-lo em voz baixa. É de boa educação chegar uns minutinhos
antes na Missa, dessa maneira manifestamos que nós esperamos a Jesus. Escutemos
com atenção as leituras. Às palavras da consagração, está previsto que nos
ajoelhemos e não que fiquemos de pé (a não ser que haja alguma causa justa;
neste caso, pelo menos façamos uma “inclinação profunda enquanto o sacerdote
faz genuflexão após a consagração”); caso se receba a comunhão de pé, é bom
fazer alguma reverência antes de recebê-la. Depois da comunhão, não nos
esqueçamos de dar graças a Deus, normalmente se recomenda pelo menos uns 10
minutinhos em oração depois de comungar. Também seria muito bom se nos
acostumássemos a fazer visitas a Jesus no Sacrário, pois frequentemente o
Senhor está muito sozinho nos Sacrários das nossas igrejas e, além do mais, ele
está aí por você e por mim. Enfim, tenho certeza que o amor a Deus que está em
nossos corações nos sugerirá outros detalhes de carinho para com Jesus na
Santíssima Eucaristia. Quem ama é criativo!
COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
Leituras: Gn 14,18-20; 1Cor
11,23-26; Lc 9,11b-17
Hoje, a Igreja celebra o
mistério de uma Presença; o modo de presença por excelência, a presença
pessoal-sacramental de Cristo nas espécies eucarísticas. Naquele pão que não mais
é pão, naquele vinho que não mais é vinho, é o próprio Senhor morto e
ressuscitado, o Cordeiro de pé como que imolado, descrito no Apocalipse, que se
faz presente na sua Igreja, em meio a nós, para a vida do mundo. Na Eucaristia,
de modo particularíssimo – tão particular, que dizemos "presença
real" – Cristo cumpre continuamente sua última promessa: "Eu estarei
convosco todos os dias até a consumação dos séculos!".
Hoje, a Igreja celebra o
mistério da Presença indo às ruas do mundo inteiro em procissão. Quando surgiu
a Solenidade de Corpus Christi, no longínquo século XIII, era fácil e óbvio,
era apoteótico e triunfal ir às ruas com o Cristo-Eucaristia. O mundo de então
era cristão e a presença do Senhor era palpável, perceptível, num mundo
teocêntrico, impregnado do divino, empapado do sagrado. Naqueles tempos quase
metade dos dias do ano era de feriados religiosos. E ninguém estranhava, porque
era viva a consciência de que o tempo é de Deus e, por isso mesmo, é também
tempo do homem, tempo não só para o trabalho e a produção, mas também para o
louvor, o descanso e o saudável ócio que faz com que não deixemos de ser
humanos no momento do "negócio"...
Mas, os tempos mudaram.
Hoje, mais que em qualquer outro tempo, é necessário que a Igreja vá às ruas com
o Pão eucarístico. São ruas de um mundo sem Deus; ruas de um mundo no qual Deus
é sentido como Ausência, porque o estamos exilando do nosso coração, de nossas
famílias, de nossos negócios, de nossas relações, de nossas leis, de nossa
Pátria, de nossa sociedade, de nossos esquemas de moralidade... Sair hoje me
procissão, de modo solene e triunfal, com uma ínfima partícula de pão não
fermentado, fininho e delicado, pode parecer algo sem sentido para o mundo,
algo tolo, inútil, indigno da razão ilustrada e imanentista dos tempos
hodiernos. E, no entanto, é precisamente desse testemunho que o mundo mais
precisa hoje: de que os cristãos digam que Deus não está ausente, mas ele mesmo
é Presença, e presença encarnada na matéria desse mundo, na carne da nossa vida.
Ele é Presença sim! E não no que é grande, vistoso, midiático, mas no que é
pequeno e humilde, banal e ínfimo, como um pedacinho de pão e um pouquinho de
vinho. Eis: a Eucaristia não somente testemunha a presença do Senhor, mas
também o modo como ele quer ser reconhecido na sua presença: no que é simples,
corriqueiro, pequeno... como os sofrimentos, o pranto, os pequenos momentos de
vida, da família, do trabalho, do amor. Ele quer ser reconhecido como presença
no que sofre, no que precisa de nós, nos que para o mundo não contam nada e não
valem nada...
Hoje, Corpus Christi, ou
como se diz também no Brasil, Corpo de Deus, lá vai a Igreja, louca de alegria,
pasmo e fé, proclamando essa Presença, que faz o mundo ter sentido, o homem não
se sentir sozinho e a vida encontrar um rumo, o rumo da eternidade. "E
quando amanhecer o Dia eterno, a eterna visão, ressurgiremos por crer nesta
Vida escondida no pão!"
PARA REFLETIR
Visto que tratamos do
corpo do Senhor, reflitamos quantos de nós participamos do corpo, quantos
degustamos este sangue, que somos participantes do corpo que em nada difere ou
se distingue daquele corpo de Cristo, porque degustamos daquele que está
sentado no alto, e daquele que é adorado pelos anjos e que está junto da
virtude incorruptível. Ai de mim! Quantos são os caminhos para a nossa
salvação! Fez-nos seu corpo e nos deu o seu corpo, e, apesar de tudo, nada
disto nos aparta do mal. Ó trevas, ó abismo profundo, ó insensibilidade! Degustai, diz, as coisas do alto,
onde Cristo está sentado à direita de Deus. E depois disto ainda há aqueles
que estão preocupados pelo dinheiro, e outros que são escravos das paixões.
Não vês que até mesmo no
nosso corpo se corta e amputa o que é inútil e supérfluo? E que a isto, uma vez
amputado, morto, putrefato e corrompido, nada lhe aproveita o fato de ter
pertencido ao corpo? Não nos fiemos de sermos uma vez do corpo. Se este corpo,
apesar de ser algo natural, chega a dividir-se, que mal não padecerão as normas
de vida se não permanecem firmes e estáveis? Quando o corpo não é partícipe
deste alimento corporal, quando os canais estão entupidos, então morre; quando
tem algum membro entrevado, então fica mutilado. Da mesma forma nós, quando
fechamos os ouvidos, mutilamos nossa alma; quando não participamos do alimento
espiritual, quando as maldades, como humores putrefatos, nos corrompem, tudo
isto gera enfermidade, enfermidade grave, que atrai a decomposição, e depois se
necessitará aquele fogo, será necessária a amputação. Porque Cristo não
suportará entrar no tálamo com tal corpo. Se aquele ao qual ia vestido com um
traje manchado o dispensa e lança fora, o que não fará com o que manchou o seu
corpo? O que não lhe infligirá?
Vejo que muitos
participam do Corpo do Senhor de forma temerária e rotineira, mais por costume
e prescrição do que por consideração e desejo. Quando chegue, diz, o tempo da
santa Quaresma, quem quer que seja, participa dos mistérios, e ocorre o mesmo
no dia da Epifania. Contudo, este não é o momento de aproximar-se, porque a Epifania
e a Quaresma não nos tornam dignos da aproximação, mas sim a pureza e a
sinceridade de alma. Com estas virtudes aproxima-te sempre, e sem elas jamais. Quantas vezes,
disse, fizerdes
isto, anunciais a morte do Senhor. Isto é, recordais vossa salvação, meu
benefício.
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