Caríssimos, ouvimos na primeira leitura desta
liturgia um pequeno trecho do cântico do Servo do Senhor no Livro de Isaías.
Este trecho refere-se a Israel, o filho predileto de Deus entre todas as
nações, por quem o Senhor nutre especial predileção. São Mateus em seu
evangelho e toda a tradição da Igreja nos ensinaram, porém, que é uma profecia
sobre Jesus. É, portanto, justo afirmar: Jesus tomou sobre si a dor de cada
homem. O abismo que nos separava de Deus. Quando, no alto do Gólgota, ele
gritava: “Deus meu, Deus meu, porque me abandonaste”, eram as nossas
dilacerações que o fazia gritar. Mais que a dor física, mais que a humilhação e
o cansaço, era a separação entre o homem e Deus que o fazia fremir e olhar o
céu com olhar vazio procurando, em vão, apoio no Pai. Ele “ofereceu sua vida em
expiação” para “derrubar o muro, a inimizade que nos afastava de Deus”. A nossa
dor era sua. Seu grito e seu abandono eram os nossos. Ele caiu no negro abismo
da ausência de Deus e da solidão absoluta para que não morrêssemos esmagados
pela consciência de que não amamos a Deus o bastante e ao próximo como
deveríamos. A ausência de amor no coração humano matou Jesus e nos mataria
também, se ele não tivesse levado em si todas as nossas dores e separações.
No Evangelho, Jesus fala aos seus discípulos do
cálice de dor que ele deve beber. Fala também aos discípulos que eles devem
bebê-lo. Não como uma predição do futuro, mas, muito mais como uma exigência do
seguimento de Cristo e sua imitação. No entanto, após falar do cálice de dor,
manda os discípulos se tornarem servos, pequenos e irmãos. Porque? Porque Ele
sabe que o cálice de dor é ainda insuportável para eles que querem ser grandes.
Só será compreensível e assimilável quando tiverem perdido tudo: casa, irmãos,
pai, mãe, por causa do reino e só será suportável se entre eles houver
verdadeiro amor: “ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos
amigos”. “Vós sois meus amigos”, lhes disse Jesus.
O cálice de dor é bebido pela salvação dos homens. Ele
é a cruz, ele é o amor crucificado. O amor crucificado é a autoimolação de
Jesus. Tem coragem, sê firme, sê forte e corajoso e imola na cruz teu desejo de
grandeza, de poder, de status social, de ser importante e proeminente, de ser
alguém aos moldes mundanos. Sê ainda mais forte, sê ainda mais corajoso e mais
firme e transforma tua dor em amor.
Uma mãe velou seu filho morto. Depois velou sua
filha que se suicidou. Agora cuida das três netinhas. Cada lágrima de dor e
saudade que escorre em seu rosto ela transforma em amor às suas netas. Serva
por amor.
Uma esposa traída ouviu de seu esposo a confissão
da culpa. A dor era imensa, a humilhação era grande demais. Mas, o amor era
maior. Junto às lágrimas de dor e desespero, angústia e sofrimento, havia a firme
decisão de amar quem não merecia mais ser amado.
Olhamos uma mãe e dizemos: tens o semblante da
Virgem Maria: serena, pacífica, humilde, toda recolhida em Deus. O que não
sabemos é que aquele coração de mãe e esposa fora tantas vezes ferido que decidira
amar, amar sempre e de novo, amar simplesmente. Fazer-se serva por amor.
Um filho não se dava com pai. Não conversavam. Eram
estranhos debaixo do mesmo teto. Como conviver com esse pai? Ama, disse o
diretor espiritual. Ama seu pai. Então ele resolveu amar. Um chinelo no pé, uma
xícara de café para o pai, um presente de aniversário e um olhar silencioso
desarmou o pai que descobriu que podia amar também. “Vem caminhar comigo”,
convidou o pai e foram juntos na santa viagem até sua partida para o céu. Servos
um do outro. Servos por amor.
Um jovem trabalhava no banco e na volta para casa
ia até os usuários de drogas que ficavam em uma esquina. Desviar deles? Fugir?
Chamar a polícia? O que fazer? Ama-os, disse o diretor espiritual, ama. Um dia
leva bolo de aniversário a um, noutro dia empresta sua própria bicicleta a um
daqueles viciados. Em outro dia se aproxima e não diz nada, apenas fica ali com
eles. Não faz pregação, não lê o evangelho, nem diz para pararem de usar as
drogas. Apenas ama. Um dia a esquina estará vazia, sem drogados, porque alguém
os amou. Um servo por amor.
Ouvimos na segunda leitura: “temos um
sumo-sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi
provado em tudo como nós”, mas “amou até o fim”. Por isso, “aproximemo-nos com
toda a confiança do trono da graça, para conseguirmos misericórdia e
alcançarmos a graça de auxílio no tempo oportuno”.
Amemos, amemos até o fim como pequenos servos uns
dos outros, irmãos no amor, servos por amor, pois, dizia Santa Terezinha do
Menino Jesus: “o amor tem em si todas as vocações”.
Se tentares viver de amor, perceberás que aqui na
terra, convém fazeres a tua parte. A outra, não sabes nunca se virá, e não é
necessário que venha. Por vezes, ficarás desiludido, porém, jamais perderás a
coragem, se te convenceres de que, no amor, o que vale é amar (Chiara Lubic).
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Autor e site:
Padre Luís Fernando
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