O incenso é uma resina aromática distilada em
lágrimas por árvores da família das terebintáceas (boswellia serrata e
boswellia carteri), que crescem espontaneamente na Ásia e na África. Pode-se
dizer que todo o mundo, pelo menos o mundo culto, conhecia o incenso para o uso
doméstico e religioso, seja com sentido catártico (para purificação e
relaxamento), seja apotropaico (para afastar ou destruir influências maléficas
e negativas).
a) O uso pagão. Na vida dos mártires se
fala inúmeras vezes da tentativa dos pagãos de seduzir os cristãos para a
apostasia, pelo incenso queimado aos ídolos.
b) O uso pelo povo eleito. Os israelitas
por preceito divino deviam oferecer o sacrifício de incenso sobre o altar de
ouro no interior do templo. Há inúmeras passagens da Escrituras que mencionam o
uso do incenso pelos judeus.
c) O uso cristão. Os cristãos, para evitar
a suspeita de idolatria, no princípio não empregavam o incenso na Liturgia, mas
sim na vida profana. Desde o século IV, com a quase total extinção do paganismo
no mundo cristão, foi usado como perfume para os lugares litúrgicos. Do costume
profano queimar incenso diante de pessoas de autoridade, deriva o rito de
incensar pessoas (devido à sua função litúrgica), altares e objetos.
Obviamente, o uso do incenso na Liturgia não tem mais a ver com o sentido
profano, mas remete à comparação do salmista “suba até Vós a minha oração como
o incenso” (Sl 140,2) e à metáfora do “suave odor de Cristo” que deve exalar do
testemunho cristão (2Cor 2,15).
Embora haja atualmente diversos tipos de incenso,
pela mistura de essências e perfumes, incluindo os incensos gregos de resina; é
o chamado Olibanum que mais se aproxima do incenso mencionado nas Escrituras,
embora não haja nenhuma determinação que limite a esse o uso litúrgico.
Nos ritos anteriores da Liturgia Latina, o incenso
era reservado apenas às Missas mais solenes. Hoje, longe do perigo de confusão
sobre a utilização do incenso, o seu uso é permitido em toda celebração do
Santo Sacrifício, mesmo os nos dias mais simples.
O ato de incensar exprime para os cristãos
católicos: a) adoração direta diante do Santíssimo Sacramento; b) adoração
indireta diante do Altar, do Evangeliário, do Crucifixo, do Santo Lenho da
Cruz, das Relíquias da Santa Cruz e das imagens do Senhor, por serem objetos
especialmente relacionados com o Redentor, por sua natureza, ou pela
consagração; c) veneração diante das imagens e relíquias dos santos; d)
reverência, quando feito a pessoas (devido à dignidade civil ou eclesiástica)
ou ao corpo inânime dos fiéis; e) comunicação de pureza, de santidade, de
auxílio às almas como sinal de oração dirigida a Deus e de oferta em favor
delas, e de proteção contra as influências do demônio; e, por fim, f) símbolo
da oração que sobe como fumaça aromática ao trono do Altíssimo.
O
uso na Liturgia: a Incensação
O modo de sustentar ou lançar o turíbulo mantém-se
o mesmo do rito extraordinário. O ministro que o sustenta (turiferário) tem na
mão esquerda, junto ao peito, a parte superior das correntes, e na mão direita
as correntes juntas próximo do opérculo (tampa) do incensário de modo a poder
comodamente apresentá-lo ou lançá-lo e puxá-lo para si (caso esteja
incensando), exceto se o mesmo ministro leva a naveta: nesse caso, suporta o
turíbulo apenas pela parte superior das correntes, com a mão esquerda e leva a
naveta na direita. Durante as procissões, contudo, sustenta o turíbulo apenas
pela mão esquerda oscilando para frente e para trás, independentemente de ter a
naveta na direita. O ministro da naveta (naviculário) a sustenta e apresenta
sempre com a mão direita. Se não houver naviculário, no momento da incensação o
turiferário entrega a naveta a outro ministro para poder incensar. O ministro
tenha o cuidado de lançar o turíbulo com gravidade e decoro, sem mover
juntamente o corpo e a cabeça, com a mão esquerda firme e segura diante do
peito. Tanto o turíferário quanto o naviculário, como quaisquer outros
ministros, devem dispor a mão livre sobre o peito.
Os manuais e livros antigos de Liturgia Latina,
anteriores ao Concílio Vaticano II, definem dois movimentos básicos do turíbulo
ou incensário, o ictus e o ductus, com algumas particularidades para o ductus.
Vejamos o que está exposto no Curso de Liturgia publicado pelo padre João
Batista Reus, sj em 1944, citando diversas vezes o Cerimonial dos Bispos (C.E.)
na edição vigente na época, que datava de 1886:
749. O modo de incensar é o seguinte. Quem faz a
incensação coloca a mão esquerda com o disco do turíbulo no peito (Caeremoniale
Episcoporum I, 23, n.8), a mão direita, i. é, os dedos, nas cadeias junto do
opérculo, levanta o turibulo até à mão direita chegar à altura do peito (um
ductus) e conduz a mão com o turibulo pendente em direção à pessoa ou ao objeto
a ser incensado, retrai a mão e move-a outra vez para a frente (dois ictus) sem
mover o corpo ou a cabeça. Este gesto (ductus duplo) se repete três vezes,
sempre de modo que o turíbulo, quando retraído, esteja debaixo do braço, que o
suporta (C.E. 1. c.). Arremessar o turíbulo para o alto ou para a frente é
contra as rubricas. 750 O ductus duplo (de 2 ictus) compete a) ao
Santíssimo Sacramento, à cruz, às imagens dos santos, às relíquias,
evangeliário antes do canto do evangelho; b) a todas as pessoas do coro ou do
altar incensadas individualmente. O ductus simples (de 1 ictus) usa-se, quando
são incensadas mais pessoas juntas; na incensação do altar, bênção das velas,
da cinza, dos ramos.
São incensados individualmente a) pelo diácono: os
cônegos, com dois ductus duplos e em primeiro lugar, depois o subdiácono;
outros sacerdotes com um ductus simples; b) pelo turiferário: o diácono com
dois ductus duplos, depois o Mestre de Cerimônias com um ductus duplo,
fazendo-se inclinações antes e depois;
São incensados juntos pelo turiferário a) os dois
acólitos com 1 ductus simples; b) os outros clérigos juntos, com três ductus
simples: no meio, à esquerda e à direita; c) o povo no meio diante da entrada
no coro com três ductus simples.
Do texto citado podemos definir bem o que é o ictus
e o que é o ductus. Ictus é o lançamento do turíbulo para a frente, enquanto o
ductus é o erguimento do turíbulo à altura do peito, seguido de um determinado
número de ictus. Deste modo, o movimento mais importante da incensação é o
ictus, pois pode ser executado seguidamente, como no caso da incensação do
altar, sem erguer o turíbulo à altura do peito, ou em movimentos espaçados com
altura determinada, compondo o ductus.
Analisando bem o trecho citado, particularmente o
n. 749, observamos que o movimento padrão do ductus é o outrora chamado ductus
duplo (composto por dois ictus), que coaduna perfeitamente com o próprio termo.
Esse movimento é repetido, por padrão, três vezes. Em situações específicas
pré-determinadas, tanto o número de ictus do ductus quanto o número de
repetições variava.
Os livros litúrgicos da Liturgia Latina atual
mencionam ambos os movimentos do turíbulo, mas não tratam de situações que
alterariam o padrão, isto é, não se mencionam particularidades do ductus quanto
ao número de ictus que o compõem. Vamos ao texto do Cerimonial dos Bispos de
1987 (edição vigente), mais rico ao tratar das particularidades da incensação
que a Instrução Geral do Missal Romano.
91. Antes e depois da incensação, faz-se inclinação
profunda à pessoa ou ao objeto que é incensado; não, porém, ao altar nem às
oferendas recebidas para o sacrifício da Missa. 92. São incensados com três ductus do turíbulo: o
Santíssimo Sacramento, a relíquia da Santa Cruz e as imagens do Senhor
solenemente expostas, as oferendas, a cruz do altar, o livro dos Evangelhos, o
círio pascal, o Bispo ou o presbítero celebrante, o coro e o povo, o corpo de
defunto. Com dois ductus incensam-se as relíquias e as imagens dos Santos
expostos a pública veneração. 93. O altar é incensado com ictus sucessivos dos
turíbulo, do seguinte modo: a) se o altar estiver separado da parede, o Bispo
incensa-o em toda a volta; b) se o altar não estiver separado da parede, o
Bispo incensa-o passando primeiro ao lado direito, depois ao lado esquerdo. Se
a cruz estiver sobre o altar ou junto dele, é incensada antes do altar; caso
contrário, o Bispo incensa-a ao passar por diante dela. As oferendas são
incensadas antes da incensação do altar e da cruz. 94. O Santíssimo Sacramento é incensado de joelhos. 95. As relíquias e as imagens sagradas expostas a
pública veneração são incensadas depois da incensação do altar; à Missa, porém,
só no início da celebração. 96. O Bispo, quer esteja no altar quer na cátedra,
recebe a incensação de pé, sem mitra, a não ser que já esteja com ela. Os
concelebrantes são incensados pelo diácono, todos ao mesmo tempo. Por fim, o
diácono incensa o povo, do lugar mais conveniente. Os cônegos que porventura
não concelebrem ou o coro duma comunidade são incensados ao mesmo tempo que o
povo, salvo se a disposição dos lugares aconselhe outra coisa. Isto igualmente
aos Bispos que, porventura, estejam presentes. 97. O Bispo que preside, mas não celebra a Missa, é
incensado depois do celebrante ou concelebrantes. Depois do Bispo, onde for
costume, é incensado o Chefe do Estado, quando assiste oficialmente à sagrada
celebração. 98. As monições e orações que devam ser ouvidas por
todos, o Bispo não as profira antes de terminada a incensação.
Tendo por base a simplificação dos gestos proposta
pela renovação do Rito Latino com o Concílio Vaticano II, a tradução espanhola
atual do termo ductus por “movimientos dobles” e a hermenêutica da continuidade
defendida pelo Papa Emérito Bento XVI, é pertinente afirmar com segurança que
tratando-se do Rito Ordinário da Liturgia Latina, o termo ductus deve sempre
ser entendido como o anterior ductus duplo, que era o padrão já no Rito
Extraordinário, e que a variação ductus simples não mais tem lugar na liturgia
ordinária. O ductus triplo (de três ictus) nunca esteve previsto na Liturgia, o
que havia era o triplice ductus, ou seja a repetição do ductus (duplo ou
simples) três vezes.
Quanto à quantidade de ductus, se observe o que
está prescrito, mantendo-se a ordem tradicional da incensação, ou seja, a) no
triplo ductus, primeiro se incensa no meio (à frente), depois à esquerda (do
turiferário) e à direita; e b) no duplo ductus, primeiro à esquerda (do
turiferário) e depois à direita.
Sobre a bênção do incenso, é comum ao rito latino,
desde o rito extraordinário, abençoar o incenso já posto sobre as brasas acesas
do turíbulo, exceto quando se vai incensar apenas o Santíssimo Sacramento, pois
não há sentido em santificar o Santificador. O que se modificou no rito
ordinário foi a instrução de abençoar sem nada dizer, enquanto no rito
extraordinário se mantém o uso de abençoar com fórmulas próprias de cada
momento da incensação. Nos ritos orientais, contudo, é comum a bênção dos grãos
de incenso antes de depositá-los sobre as brasas, o que permite o uso difundido
de se distribuir incenso abençoado aos fiéis para que queimem ao Senhor na
oração familiar, mesmo fora da Liturgia.
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Bibliografia
básica consultada:
Cerimonial
dos Bispos (edições em português de 1987, em espanhol de 1987, em italiano de
1987, em latim de 1886 e de 1987).
Curso de
Liturgia. Pe. João Batista Reus, sj. 1944.
Fonte: Grupo
de Cerimoniários São Domingos Sávio
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