A viagem
à Geórgia e ao Azerbaijão confirma a atitude
de Bergoglio: a busca da unidade dos cristãos através de gestos de
fraternidade, e a valorização do diálogo com as demais religiões como antídoto
contra o ódio e a violência.
A recente
viagem do Papa à Geórgia e ao Azerbaijão ofereceu, uma vez
mais, um exemplo do caminho que Francisco pretende percorrer no
âmbito ecumênico e no diálogo entre as religiões. No encontro com os
presbíteros, religiosos e seminaristas em Tbilisi, no sábado, 01 de
outubro, Bergoglio respondeu desta maneira ao testemunho de um
seminarista que lhe contava as dificuldades nas relações entre os cristãos das
diferentes confissões:
“Nunca brigar! Deixemos que os teólogos estudem
as coisas abstratas da teologia. O que eu devo fazer a um amigo, um vizinho,
uma pessoa ortodoxa? Ser aberto, ser amigo. Mas devo fazer um esforço para
convertê-lo? Existe um grande pecado contra o ecumenismo:
o proselitismo. Nunca devemos fazer proselitismo com os ortodoxos.
São nossos irmãos e irmãs discípulos de Jesus Cristo que, pelas situações
históricas tão complexas, nos tornamos assim. Mas, eles e nós, cremos no Pai,
no Filho e no Espírito Santo. Cremos na Santa Mãe de Deus. E o que eu tenho que
fazer? Não condenar; isso não se pode. Amizade, caminhar juntos, rezar uns
pelos outros e fazer obras de caridade juntos, quando isso é possível. É este o
ecumenismo. Mas nunca condenar um irmão ou uma irmã, nunca deixar de saudá-lo
porque é ortodoxo”.
Há muito
tempo, a Igreja considera fechada a vida do uniatismo. Os últimos papas,
além de promover o diálogo teológico com a ortodoxia (a única, verdadeira e
profunda diferença tem a ver com o exercício do primado do Bispo de Roma),
multiplicaram os gestos de amizade. Vários encontros históricos (a começar pelo
abraço em Jerusalémentre Paulo VI e Atenágoras, até as
visitas de João Paulo II a Atenas e à Geórgia, ou as
de Bento XVI a Istambul) ajudaram a consolidar um caminho comum.
Também o
diálogo teológico deu passos significativos para frente: a partir
do Concílio Vaticano II, a Igreja católica está recuperando a consciência
da importância da colegialidade e da sinodalidade. Enquanto isso, as Igrejas
ortodoxas começam a ver com um olhar diferente o primado e seu exercício em um
mundo cada vez mais globalizado. O Papa Francisco fala de um
“ecumenismo de povo”. Enquanto se dá a paciente espera dos passos concretos
para chegar a compartilhar o cálice no altar, é importante multiplicar as
oportunidades para trabalhar juntos.
A Igreja
georgiana é uma das menos ecumênicas. No entanto, os quatro encontros do Papa
com o Patriarca Elias II caracterizaram-se pela amizade, pela
acolhida e pela fraternidade verdadeiras, não de fachada. Bastava vê-los antes
que ouvi-los. Para onde tudo isso levará? Não sabemos. Haverá efeitos positivos?
É difícil afirmar. O que é certo é que foi dado um novo passo em relação à
última visita de um papa, a de João Paulo II em 1999, que aconteceu em um
meio a um clima muito mais frio, e não apenas devido às condições
meteorológicas.
A viagem
ao Azerbaijão foi muito significativa também pelo diálogo com as
outras religiões. Neste sentido, foi muito importante o último discurso do
papa, pronunciado em uma mesquita na presença do xeque dos
muçulmanos do Cáucaso.
O diálogo,
explicou Francisco, não é “sincretismo conciliador”: não consiste,
portanto, em anular as diferenças, uma amálgama. Não é a ONU das
religiões, ideia contra a qual troaram os críticos de João Paulo II,
de Bento XVI e de Francisco, “culpados” de terem se encontrado
várias vezes com uma grande quantidade de líderes de outras religiões.
Também não
é, explicou o Papa Bergoglio, “uma abertura diplomática que diga sim a
tudo para evitar problemas”. Ou seja, refugiar-se em manobras táticas e acabar
ignorando ou censurando a realidade. Pelo contrário, devemos “dialogar com os
outros e rezar por todos: estes são os nossos meios para fazer surgir amor onde
há ódio, perdão onde há ofensa”.
As
religiões, todas elas, “na noite dos conflitos que estamos atravessando”, estão
chamadas a ser “auroras de paz, sementes de renascimento entre devastações de
morte, ecos de diálogo que ressoam incansavelmente, caminhos de encontro e
reconciliação para se chegar mesmo lá onde as tentativas das mediações oficiais
parecem não surtir efeito”. Nunca deixar-se instrumentalizar nem instrumentalizar
o santo nome de Deus, para convertê-lo em uma bandeira com a qual se justifica
o ódio, a violência, o terrorismo, a guerra. As religiões, pelo contrário,
explicou o Papa na grande mesquita de Baku, “são chamadas a edificar a
cultura do encontro e da paz, feita de paciência, compreensão, passos humildes
e concretos. É assim que se serve a sociedade humana”.
Aqueles que
promulgam o choque de civilizações, aqueles que desejariam que a Igreja tivesse
uma atitude mais guerreira diante do islã em nome dos valores do Ocidente e de
uma nostalgia da Cristandade em declínio, para contrapor o Papa Bergoglio
aos seus predecessores, veem-se obrigados a esquecer tudo o que João Paulo
II fez, o primeiroBispo de Roma que entrou em uma mesquita (Damasco,
2001). O Papa que, depois dos atentados de 11 de setembro, quis reunir
em Assis justamente as religiões para desmascarar qualquer
“cobertura” religiosa do abuso do nome de Deus perpetrado pelos terroristas
fundamentalistas.
Bento XVI,
sorridente e pacífico, rezou em silêncio diante do “mihrab”
da Mesquita Azul de Istambul, ao lado do imã. Gesto repetido por
seu sucessor. Qualquer gesto de amizade, por pequeno que seja; qualquer esforço
para compartilhar; qualquer exemplo de convivência possível, é um pequeno “capítulo”
dessa paz que representa a única resposta à “Terceira Guerra Mundial em
capítulos”.
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Vatican
Insider / Aleteia
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