terça-feira, 2 de agosto de 2016

Homilética: 19º Domingo do Tempo Comum - Ano C: "A Vigilância Escatológica".




A Palavra de Deus deste Domingo convida os cristãos a não colocarem sua esperança em falsas seguranças. Convoca-os a viverem sempre no serviço, à espera do Senhor.

A 2ª leitura (Hb 11, 1 – 2. 8 – 12) fala da fé que tinham as grandes figuras do Antigo Testamento, sobretudo Abraão. A fé que guia os nossos passos é precisamente o fundamento das coisas que se esperam. A fé dá-nos a conhecer com certeza que o nosso destino é o Céu e, por isso, todas as coisas devem ordenar-se para esse fim supremo e subordinar-se a ele.

No evangelho (Lc 12, 32 – 48) Jesus exorta-nos à vigilância: “Estejam cingidos os vossos rins e as lâmpadas acesas. Sede como homens que estão esperando o seu Senhor voltar de uma festa de casamento, para lhe abrirem, imediatamente, a porta, logo que Ele chegar e bater” (Lc 12, 36).

Ter as roupas cingidas é uma imagem expressiva utilizada para indicar que alguém se preparava para realizar um trabalho, para empreender uma viagem, para entrar em luta. Ter lâmpadas acesas indica a atitude própria daquele que está de vigia ou espera a chegada de alguém. Quando o Senhor vier no final da nossa vida, deve encontrar-nos assim: em estado de vigília, como quem vive ao dia; servindo por amor e empenhados em melhorar as realidades terrenas, mas sem perder o sentido sobrenatural da vida, o fim para que tudo se dirige.

Essa vigilância há de ser contínua, perseverante, porque contínuo é o ataque do demônio que, “como um leão que ruge, dá voltas buscando a quem devorar” (1 Pd 5, 8). “Vela com o coração, vela com a fé, com a caridade, com as obras; prepara as lâmpadas, cuida de que não se apaguem, alimenta-as com o azeite interior de uma reta consciência; permanece unido ao Esposo pelo Amor, para que Ele te introduza na sala do banquete, onde a tua lâmpada nunca se extinguirá” (Santo Agostinho).

Estaremos vigilantes no amor e longe da tibieza e do pecado se nos mantivermos fiéis a Deus nas pequenas coisas que preenchem o dia. As pequenas coisas são a ante-sala das grandes, tanto no sentido negativo como positivo.

As pequenas vitórias diárias fortalecem a vida interior e despertam a alma para as coisas divinas. São ocasiões que se apresentam com muita freqüência: trata-se de viver a pontualidade à hora de levantar-se ou de começar o trabalho; de deixar de lado uma leitura inútil que leva à perda de tempo; trata-se de fazer um pequeno sacrifício à hora das refeições; de dominar a língua num encontro de amigos ou numa reunião social, etc;

Se formos fiéis nas pequenas coisas, permaneceremos cingidos, vigilantes, à espera do Senhor que está para chegar.

Disse Jesus: “onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (Lc 12, 34). O Senhor quer nos ensinar que nenhuma coisa criada pode ser o “tesouro”, o fim último do homem. Pelo contrário, o homem, usando retamente das coisas nobres da terra, percorre o caminho para Deus, santifica-se e dá ao Senhor toda a glória: “quer comais ou bebais ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1 Cor 10, 31).

“…vai chegar na hora em que menos esperardes” (Lc 12, 40). Não devemos ficar preocupados com o dia ou a hora da morte. Deus quis ocultar o momento da morte de cada um e do fim do mundo. Imediatamente depois da morte, todo homem comparece para o juízo particular: “Assim, está estabelecido que os homens morram uma só vez; e depois disto, o juízo” (Hb 9, 27). Daí o cristão não poder aceitar a reencarnação! Quem morre não volta mais! Morre-se uma só vez! Estejamos preparados para esse encontro definitivo com o Senhor. Ele pedirá contas a cada um segundo as suas circunstâncias pessoais: todo o homem tem nesta vida uma missão para cumprir; dela teremos de responder diante do tribunal divino e seremos julgados segundo os frutos, abundantes ou escassos, que tenhamos dado.

O Senhor espera de nós uma conversão sincera e uma correspondência cada vez mais generosa: espera que estejamos vigilantes para que não adormeçamos na tibieza, para que andemos sempre despertos.

Comentário dos textos bíblicos

Leituras: Sb 18,6-9; Sl 32; Hb 11,1-2.8-19; Lc 12,32-48

Caros irmãos e irmãs, a Palavra de Deus que a liturgia deste domingo nos propõe, exorta cada um de nós à vigilância.  Jesus começa dirigindo uma admoestação aos seus discípulos, dizendo: “Não temas…”.  Eles sentem medo.  Sabem que são poucos e fracos diante de um mundo hostil.

Na Sagrada Escritura a primeira vez que aparece a palavra “medo” é imediatamente após nossos primeiros pais terem cometido o pecado: “Ouvi teus passos no jardim, por isso tive medo…” (Gn 3,10).  O medo se nos apresenta nas suas mais diferentes facetas. Medo de Deus; medo de comprometer-se; medo da própria afetividade; medo do passado; medo do que é novo; medo de assumir-se cristão em locais públicos.

No Novo Testamento o anjo aparece a José e diz a ele: “Não tenhas medo!”. O Anjo Gabriel diz a Zacarias: “Não tenhas medo!”. E o mesmo anjo diz também a Maria: “Não tenhas medo, Maria, porque encontraste graça diante de Deus!”.  Não ter medo é o primeiro obstáculo que nós precisamos vencer para nos aproximarmos do Cristo.

O medo nos destrói e nos corrói por dentro e não nos permite dar passos firmes na fé, e seguir adiante. O medo nos leva a enterrarmos os próprios talentos que Deus nos deu. O contrário de não ter medo significa confiar, ter a certeza, ter a convicção, a fé única neste Deus que nos ama e quer o nosso bem.

Mesmo quando o “mar” à nossa volta parece querer nos engolir, Jesus vem em socorro de nossas limitações, e nos estende a sua mão. Ele não nos quer acomodados em nossa falsa segurança. Se queremos seguir os seus passos, Ele sempre nos diz como disse a Pedro: “Venha!”. Na nossa falta de fé, duvidamos. Não somente de nós mesmos, mas do Senhor. Ele nos encoraja e nos levanta: “Homem de pouca fé, por que duvidaste” (Mt 14,31), ao mesmo tempo em que nos estende a sua mão.

O Senhor a todo momento continua a nos dizer: “Não tenhas medo!” (Lc 12,31). É necessário que, como Pedro digamos que aceitamos seguir os passos de Cristo, apesar dos riscos. Precisamos reconhecer nossas fraquezas, mas também nossas capacidades.

Esta exortação “Não tenhas medo” precisa ser lida numa dimensão muito ampla. Não devemos ter medo porque o homem foi redimido por Deus, e a redenção perpassa toda a história humana. Ele é a luz que resplandece nas trevas (cf. Jo 1,5).   Jesus já dizia aos apóstolos: “Não tenhas medo!” (Lc 24,36) e após a sua ressurreição, disse também às mulheres “Não tenhas medo!” (Mt 28,10).

Nós somos movidos pelos nossos medos: medo de doenças, medo da morte, medo de algo não dar certo, medo de não conseguir. Medo dos nossos próprios fracassos, medo dos nossos erros, das nossas incertezas, das pessoas, da violência.  O medo é nossa condição existencial; ele nos acompanha da infância até a morte.  Não precisamos ter medo, porque o Senhor está com cada um de nós. Ele mesmo disse: “Eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28,20).  Lembremos também do que diz o salmista:  “O Senhor é minha luz e minha salvação, a quem temerei? O Senhor é o protetor de minha vida, de quem terei medo?” (Sl 26,1).

A mensagem do evangelho é exigente. E Cristo, a este propósito, jamais iludiu os seus discípulos e aqueles que o escutavam. Ao contrário, com muita firmeza os preparava para toda espécie de dificuldades internas e externas, levando sempre em conta o fato de que eles podiam também decidir deixá-lo (cf. Jo 6,67).  Portanto, se Jesus diz com insistência “Não tenham medo!”, certamente não diz isso para anular de algum modo o que exige.  Antes, com estas palavras, confirma toda a verdade do Evangelho e todas as exigências nele contidas.  Se o homem aceita a mensagem de Jesus, em atitude de fé encontra também na graça, a força necessária para enfrentar tudo isso.

A página evangélica deste domingo nos apresenta ainda uma catequese sobre a vigilância. Propõe aos discípulos de todas as épocas uma atitude de espera serena e atenta do Senhor, que vem ao nosso encontro para nos libertar e para nos inserir numa dinâmica de comunhão com Deus. O evangelista São Lucas reúne no evangelho três parábolas ligadas ao tema da vigilância.

A primeira parábola nos mostra que um Senhor viaja para ir a uma festa de casamento e deixa em casa os seus empregados.  Eles sabem que o patrão voltará, mas não sabem quando. Poderia ser durante a noite ou antes do amanhecer e eles devem estar a postos para recebê-lo (v. 35-38).  Com esta parábola, Jesus convida os seus discípulos a se manterem vigilantes como os serviçais que, durante a noite, conservam as lâmpadas acesas, cingidos os rins e a túnica dobrada.  A vida dos discípulos é, portanto, uma espera vigilante, uma permanente disponibilidade para receber o Senhor que vem.

A segunda parábola nos fala de alguém que guarda na sua casa uma grande soma de dinheiro e fica perturbado porque sabe que o ladrão não avisa, chega de repente (v. 39-40).  Esta parábola aponta para a incerteza da hora em que o Senhor virá. A imagem do ladrão que chega a qualquer hora, sem ser esperado é uma imagem sugestiva para mostrar que o discípulo fiel é aquele que está sempre preparado, a qualquer hora e em qualquer circunstância, para acolher o Senhor que vem. A parábola também nos alerta sobretudo a sermos otimistas, a cultivarmos a esperança e, ao mesmo tempo, continuarmos vigilantes.

A terceira parábola constitui uma resposta de Jesus a Pedro, que lhe pergunta quem deve manter-se vigilante.  Jesus lhe responde que todos devem vigiar (v. 41-48).  É uma vigilância permanente para sermos encontramos prontos na espera do Senhor que vem.  Ele pode chegar quando menos esperamos.

Através dessas três parábolas, Jesus explica como a espera do cumprimento da sua vinda deve impelir ainda mais a uma vida intensa, rica de obras boas:  “Vendei os vossos bens e dai-os de esmola. Fazei para vós bolsas que não envelheçam, um tesouro inesgotável nos Céus, do qual o ladrão não se aproxima e a traça não corrói” (Lc 12,33). Trata-se de um convite a utilizar os nossos bens sem egoísmo, nem sede de posse ou de domínio, mas segundo a lógica de Deus, a lógica da atenção ao próximo, a lógica do amor.

A vida dos discípulos de Jesus precisa ser uma espera vigilante e atenta, pois o Senhor está permanentemente vindo ao nosso encontro a desafiar-nos para nos despirmos das cadeias que nos escravizam e para percorrermos, com ele, um novo caminho.

Deus nosso Pai nos confiou a vida, para que a façamos frutificar em aventura de amor. Isso deveria nos preservar do “espírito de possessão” e abrir o nosso coração para aprender sem cessar a receber e praticar a caridade para com o nosso próximo.

A Virgem Maria, a quem veneramos como mãe, do céu interceda sempre por nós e nos ajude a não esquecer que aqui, na terra, estamos apenas de passagem, e nos ensine a viver os ensinamentos do seu filho Jesus que “está à direita do Pai, todo poderoso e de lá virá julgar os vivos e os mortos”, como recitamos na nossa profissão de fé.  Assim seja.

PARA REFLETIR

Quando o Evangelho não nos é exigente? Quando a Palavra de Deus não nos questiona? A Escritura diz que “a Palavra de Deus é viva e eficaz, mais penetrante do qualquer espada de dois gumes; penetra até dividir alma e espírito, junturas e medulas. Ele julga as disposições e intenções do coração” (Hb 4,12). A cada Domingo, fazemos experiência dessa exigência viva e eficaz da Palavra do Senhor em nossa vida. É o caso também deste hoje.

Comecemos com a advertência consoladora e carinhosa do Senhor Jesus: “Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do vosso Pai dar-vos o Reino”. Tão atual e necessária esta palavra! A fé cristã e a Igreja são tão combatidas atualmente, tão incompreendidas! Cada vez mais nossa sociedade se paganiza, cada vez mais rejeita o cristianismo, cada vez mais fortemente apostata da fé na qual foi plasmada e cada vez menos compreende o Evangelho e suas exigências. Com quanta força se contesta a moral cristã; com quanta ênfase se ressalta e propaga a fraqueza desse ou daquele membro da Igreja, sobretudo do clero… O interesse é um só: desmoralizar a Igreja como porta-voz do Evangelho. Desmoraliza-se a Igreja para calar-se e desmoralizar-se a moral cristã e suas exigências. Olhem o Crucificado, pensem nas suas exigências e recordem o que o mundo pensa e diz: “Não queremos que ele reine sobre nós!” Pois a nós, pequeno rebanho – rebanho cada vez menor -, o Senhor exorta: “Não tenhais medo, pequenino rebanho!” Não temais o mundo pagão, não temais os escândalos, não temais vossas próprias infidelidades e fraquezas, não temais os sábios da sabedoria deste mundo, que não podem compreender as coisas de Deus (cf. 1Cor 1,21) e crucificaram e crucificam ainda o Senhor da Glória (cf. 1Cor 2,8). Não temais ante as dificuldades da vida!

Mas, como é possível resistir? É tão grande o combate; é tão dramática a batalha! As leituras da Missa de hoje dão-nos uma resposta emocionante. O Livro da Sabedoria nos recorda a noite da saída do Egito. Israel era um povinho, um bando de escravos, menos que nada, menos que ninguém… Como suportou o sofrimento? Como se conservou fiel a Deus? Como resistiu? Como não se dispersou? Resistiu porque colocou somente em Deu sua esperança: “A noite da libertação fora predita a nossos pais, para que, sabendo a que juramento tinham dado crédito, se conservassem intrépidos”. O povo de Deus, escravo no Egito, não duvidou da promessa que Deus fizera a Abraão; o povo esperou contra toda esperança e esperou no julgamento de Deus:“Os piedosos filhos dos bons fizeram este pacto divino: que os santos participariam solidariamente dos mesmos bens e dos mesmos perigos”. Um povo unido pela esperança e pela fé na Palavra de Deus.

A segunda leitura, da Carta aos Hebreus, também nos responde: a fé, mãe da esperança, foi a forçados amigos de Deus. “A fé é um modo de já possuir o que ainda se espera, a convicção acerca de realidades que não se vêem”. Na fé, já possuímos; na fé, já tocamos com as mãos aquilo que o Senhor nos prometeu e nos preparou. Foi pela fé que nossos antepassados partiram, deixaram tudo; pela fé tiveram a coragem de viver errantes, morando em tendas, daqui para ali… Pela fé, viveram como estrangeiros nesse mundo, colocando toda esperança em Deus, que nos prepara uma Pátria melhor no céu; pela fé, Abraão, nosso pai, foi capaz de sacrificar seu filho único… Pela fé deles “Deus não se envergonha deles, ao ser chamado o seu Deus”.

Vejam, irmãos: o caminho que o Senhor nos propõe nunca foi fácil… Somente aqueles que tiveram a coragem de se deixar, de se abandonar, de se entregar, perseveraram até o fim. É o que o Senhor nosso, Jesus Cristo, nos propõe hoje: “Vendei vossos bens e dai esmola… Fazei bolsas que não se estraguem, um tesouro no céu… Que vossos rins estejam cingidos e as lâmpadas acesas, como homens esperando seu senhor voltar. Ficai preparados!” Todas essas palavras nos convidam ao desapego, à vigilância, à atitude de disponibilidade, de entrega e esperança diante de Deus. E como tudo isso é difícil, num mundo que propõe como ideal de vida o conforto, a fartura de bens, o individualismo, a confiança somente no que se vê, a dispersão interior e exterior! Digam: como as crianças podem ter amor a Deus passando horas e horas diante dos filmes e desenhos animados pagãos? Como os adultos podem prender o coração às coisas de Deus, empanturrando-se de dispersão, de novelas e de futilidades mundanas? Como rezar bem se nos apegamos ao conforto desmesurado? Como manteremos nosso fervor dispersos em mil bobagens? Como seremos realmente fortes na fé sem combater nossos vícios? Como estaremos prontos para levar cruz na doença, nas dificuldades da vida conjugal, no desafio da educação dos filhos, na luta do combate aos vícios, na busca sincera de sermos retos, decentes e honestos por amor de Cristo? Como viver tudo isso sem a vigilância? Como permanecer firmes na fé católica sem a oração e a procura das coisas de Deus? O Senhor virá na noite desse mundo: “E caso chegue à meia-noite ou às três da madrugada, felizes serão” se nos encontrar vigilantes! Vigiemos, portanto!

Caríssimos, esta advertência é para todos, e de modo especial, para nós, pastores do rebanho, a quem o Senhor constituiu “administrador fiel e prudente”. Que não caiamos na ilusão de pensar: “Meu patrão está demorando” e nos entreguemos à infidelidade! Não temamos; vigiemos, sejamos fiéis até o fim! Não reneguemos o Evangelho! – Eis o apelo do Senhor hoje!

Esta palavra vale também para os pais, servos que o Senhor colocou à frente de sua família. Que sejam conscientes da missão que receberam e transmitam aos seus filhos o testemunho de uma fé robusta e dos verdadeiros valores humanos e cristãos. E possam receber a recompensa dos servos bons e fiéis, aqui e por toda a eternidade. Amém.

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