Na Palavra de Deus, nos deparamos algumas vezes com
Jesus Cristo se dirigindo a Virgem Maria chamando-a de “mulher”. Ficamos
curiosos, intrigados e por vezes sem saber o que dizer sobre o tratamento de
Filho de Deus para com a Santíssima Virgem. Pelo conhecimento e pela
experiência que temos a respeito de nosso Mestre e Senhor Jesus Cristo, sabemos
que existem razões para a aparente dureza com que Ele trata a sua Mãe. Dessas
razões, destacaremos duas que nos ensinam os santos, que nos ajudarão a
compreender o tratamento de Jesus para com Maria.
A geração de
Jesus no ventre de Maria tem algo de muito particular. “Por um privilégio
único, ele nascera somente do Pai, sem ter uma mãe. E nascera de uma mãe
humana, sem ter pai. Deus sem Mãe, e homem sem pai. Sem mãe, desde todos os
tempos. Sem pai, no fim dos tempos” (AGOSTINHO DE HIPONA, A Virgem Maria:
cem textos marianos com comentários, p. 142).
O que Santo
Agostinho quer dizer é que Maria vive duas realidades em relação a Jesus Cristo
porque Ele é Deus e homem. Jesus é Deus e enquanto tal Ele é Senhor de Maria.
Enquanto Deus ele tem somente o Pai do Céu, pois ela não gerou o Verbo Eterno de
Deus. Porém, enquanto homem, Ele é filho de Maria, mas não tem um pai
biológico, pois Ele foi gerado pelo Espírito Santo. Por isso o Jesus homem, tem
somente uma Mãe, que é a Virgem Maria. Nossa Senhora vive a realidade de ser
serva do Senhor, pois Jesus é Deus, mas ao mesmo tempo ela é Mãe de Deus. Tudo
isso Santo Agostinho nos diz para que entendamos que ao chamar Maria de
“mulher” Ele não está desprezando sua Mãe, mas Ele nos chama a atenção para o
fato de que Ele é Deus e enquanto tal Maria não é sua Mãe, mas apenas uma
mulher, criatura de Deus. Porém, com isso Jesus não está negando a sua
humanidade, tampouco está dizendo que Maria não é sua Mãe. Jesus está dizendo
que é Deus e por isso Ele pode mudar água em vinho, pode realizar curas,
milagres e prodígios, para aquelas pessoas da Galileia, que não acreditavam
Nele pois o conheciam e sabiam que Ele era filho de Maria. Eles não acreditavam
na divindade de Jesus, como Pelágio. É interessante que no seu Evangelho Jesus
nos deixou um fundamento seguro contra todas as heresias.
Maria é a Mãe da
carne de Jesus, de sua humanidade, Mãe da fraqueza humana que Ele assumiu por
nossa causa. Todavia, o milagre que o Filho realizaria seria graças à Sua
divindade (cf. Jo 2, 1-12).
Na cena das
bodas de Caná, “sua mãe reclamava um milagre, mas ele parece desconhecer as
entranhas humanas, no momento em que vai operar a obra divina. […] Deu, pois,
essa resposta a fim de ser distinguido na fé dos crentes: aquele que veio e
aquela por meio da qual ele veio” (Idem, p. 143). Jesus Cristo, Deus e
Senhor do Céu e da Terra, veio ao mundo por meio de uma mulher. Como Deus e
Senhor, Jesus é “Senhor de Maria, o criador de Maria” (Idem, p. 143).
Mas, enquanto homem, nascido sob a Lei (cf. Gl 4, 4), Ele é Filho de Maria.
Jesus é Filho de Maria segundo a humanidade e Senhor de Maria segundo a
divindade. Por ocasião das bodas de Caná, “Jesus queria chamar a atenção sobre
a sua divindade, em força da qual estava a operar o milagre”(Idem, p.
144).
A dura pedagogia
de Jesus com sua Mãe na Sua infância, na Sua vida pública, e na Paixão do
Senhor, provém da sabedoria divina, que não é compreendida por todos os homens
(cf. Mt 11, 25). “Maria é a obra-prima por excelência do Altíssimo, cujo
conhecimento e domínio ele reservou para si. Maria é a Mãe admirável do Filho,
a quem aprouve humilhá-la e ocultá-la durante a vida para lhe favorecer a
humildade, tratando-a de “Mulher” (Jo 2, 4; 19, 26), como a uma estrangeira,
conquanto em seu Coração a estimasse e amasse mais que todos os anjos e homens”
( TVD 5).
A Santíssima
Virgem Maria é o paraíso terrestre do Novo Adão, no qual este Se encarnou por
obra do Espírito Santo, para aí operar maravilhas incompreensíveis. Nossa
Senhora é o grande, o divino mundo de Deus, onde há belezas e tesouros
inefáveis. Maria é a magnificência de Deus, em quem ele escondeu o seu Filho
único, e nele tudo que há de mais excelente e mais precioso. “Oh! que grandes
coisas e escondidas Deus todo-poderoso realizou nesta criatura admirável, di-lo
ela mesma, como obrigada, apesar de sua humildade profunda: Fecit mihi
magna qui potens est (Lc 1, 49). O mundo desconhece essas coisas porque é
inapto e indigno” (TVD 6).
Assim, Santo
Agostinho e São
Luís Maria Grignion de Montfort nos ajudam a compreender porque Jesus por
vezes parece ser duro e desprezar sua Mãe. Agostinho nos ajuda a entender que
longe de ser mal educado com a Virgem Maria, o Mestre queria chamar a nossa
atenção para o fato de que Ele é Deus e pode realizar o impossível, ainda que
não seja o tempo. Por sua vez, São Luís Maria nos ensina que tratando sua Mãe
por “mulher”, Jesus favorecia a humildade de Nossa Senhora. Como verdadeiro pai
espiritual, Jesus Cristo ensinou e continua a nos ensinar que Ele é Deus e que
favoreceu a humildade da Virgem Maria em vista da sua maternidade espiritual
sobre os filhos de Deus.
Natalino
Ueda,
Filófofo e teólogo.
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Todo de Maria
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