sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Papa aos bispos de Myanmar: cura, acompanhamento e profecia


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO A MYANMAR E BANGLADESH
(26 DE NOVEMBRO - 2 DE DEZEMBRO DE 2017)

ENCONTRO COM OS BISPOS DE MYANMAR

DISCURSO DO SANTO PADRE

Complexo da Catedral de St. Mary (Yangon)
Quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Eminência, 
queridos Irmãos Bispos!

Hoje foi, para todos nós, um dia sobrecarregado mas de grande alegria! De manhã, celebramos a Eucaristia juntamente com os fiéis vindos de todo o país e, de tarde, encontramos os líderes da comunidade maioritária budista. Gostaria que o nosso encontro, nesta noite, fosse um momento de serena gratidão por estas bênçãos e de tranquila reflexão sobre as alegrias e os desafios do vosso ministério de pastores do rebanho de Cristo neste país. Agradeço a D. Félix [Lian Khen Thang] as palavras de saudação que me dirigiu em vosso nome; a todos vos abraço com grande afeto no Senhor.

Desejo agrupar os meus pensamentos à volta de três palavras: cura, acompanhamento e profecia.

A primeira, cura. O Evangelho, que pregamos, é sobretudo uma mensagem de cura, reconciliação e paz. Por meio do sangue de Cristo na cruz, Deus reconciliou consigo o mundo e enviou-nos para ser mensageiros daquela graça sanadora, graça de cura. Aqui no Myanmar, esta mensagem tem uma ressonância especial, pois o país está empenhado em superar divisões profundamente radicadas e construir a unidade nacional. O vosso rebanho traz os sinais deste conflito e gerou valorosas testemunhas da fé e das tradições antigas; assim, para vós, a pregação do Evangelho não deve ser apenas uma fonte de consolação e fortaleza, mas também um apelo a favorecer a unidade, a caridade e a cura na vida do povo. A unidade, que partilhamos e celebramos, nasce da diversidade (não esqueçamos isto: nasce da diversidade); valoriza as diferenças entre as pessoas como fonte de mútuo enriquecimento e de crescimento; convida-as a reencontrarem-se umas com as outras, numa cultura do encontro e da solidariedade.

Que o Senhor vos conceda, no vosso ministério episcopal, experimentar constantemente a sua guia e ajuda no compromisso de favorecer a cura e a comunhão em todos os níveis da vida da Igreja, de modo que o santo Povo de Deus, o vosso rebanho, possa, através do seu exemplo de perdão e amor reconciliador, ser sal e luz para os corações que anelam por aquela paz que o mundo não lhes pode dar. A comunidade católica no Myanmar pode-se orgulhar do seu testemunho profético de amor a Deus e ao próximo, que se traduz no compromisso a favor dos pobres, daqueles que estão privados de direitos e sobretudo, nestes tempos, a favor dos inúmeros desalojados que, por assim dizer, jazem feridos na beira da estrada. Peço-vos que transmitais a minha gratidão a todos aqueles que, como o Bom Samaritano, trabalham com generosidade para levar o bálsamo da cura a eles e ao próximo que passa necessidade, sem olhar a religião nem etnia.

O vosso ministério de cura encontra uma expressão particular no empenho pelo diálogo ecuménico e a colaboração inter-religiosa. Rezo para que produzam abundantes frutos, na reconciliação da vida do país, os vossos incessantes esforços por construir pontes de diálogo e vos unir aos seguidores doutras religiões tecendo relações de paz. A conferência inter-religiosa de paz, realizada em Rangum na primavera passada, foi um testemunho importante, aos olhos do mundo, da determinação das religiões a viver em paz e rejeitar qualquer ato de violência e de ódio perpetrado em nome da religião.

E, neste ministério de cura, lembrai-vos que a Igreja é um «hospital de campo». Curar, curar feridas, curar as almas, curar. A vossa primeira missão é esta: curar, curar os feridos.

A segunda palavra, que vos deixo nesta noite, é acompanhamento. Um bom pastor está constantemente presente no seu rebanho, guiando-o enquanto caminha a seu lado. Gosto de lembrar que o pastor deveria possuir o odor das ovelhas; mas também o odor de Deus. Não vos esqueçais: também o odor de Deus. Nos nossos dias, somos chamados a ser uma «Igreja em saída» a fim de levar a luz de Cristo a todas as periferias (cf. Evangelii gaudium, 20). Como bispos, as vossas vidas e o vosso ministério são chamados a conformar-se a este espírito de envolvimento missionário, sobretudo através das visitas pastorais regulares às paróquias e comunidades que formam as vossas Igrejas locais. Este é um meio privilegiado para acompanhar, como pais amorosos, os vossos sacerdotes no compromisso diário de fazer crescer o rebanho em santidade, fidelidade e espírito de serviço. Falei de acompanhar os sacerdotes: mantende-vos próximo dos sacerdotes; não esqueçais que o próximo mais próximo que um bispo tem, é o sacerdote. Que cada sacerdote não só conheça, mas sinta que ele tem um pai no bispo.

Pela graça de Deus, a Igreja no Myanmar herdou, daqueles que trouxeram o Evangelho a essa terra, uma fé sólida e uma ardente ânsia missionária do trabalho. Sobre estes fundamentos estáveis e em comunhão com os presbíteros e os religiosos, continuai a permear o laicado com o espírito dum autêntico discipulado missionário e a procurar uma sábia inculturação da mensagem evangélica na vida diária e nas tradições das vossas comunidades locais. A este respeito, é essencial a contribuição dos catequistas; o seu enriquecimento formativo deve permanecer para vós uma prioridade. E não esqueçais que os catequistas são os pilares da evangelização em cada paróquia.

Sobretudo quero pedir-vos um empenhamento especial no acompanhamento dos jovens. Velai pela sua formação nos sãos princípios morais que os guiarão ao enfrentar os desafios dum mundo ameaçado pelas colonizações ideológicas e culturais. O próximo Sínodo dos Bispos não tratará apenas destes aspetos, mas interpelará diretamente os jovens, escutando as suas histórias e envolvendo-os no discernimento comum sobre o modo como proclamar melhor o Evangelho nos anos futuros. Uma das grandes bênçãos da Igreja no Myanmar é a sua juventude e, em particular, o número de seminaristas e noviços. E por isso agradecemos a Deus. No espírito do Sínodo, por favor, envolvei-os e sustentai-os no seu percurso de fé, pois, através do seu idealismo e entusiasmo, são chamados a ser evangelizadores felizes e convincentes dos seus coetâneos.

A minha terceira palavra, para vós, é profecia. A Igreja no Myanmar dá testemunho diariamente do Evangelho, através das suas obras educativas e caritativas, da sua defesa dos direitos humanos, do seu apoio aos princípios democráticos. Oxalá possais colocar a comunidade católica em condições de continuar a ter um papel construtivo na vida da sociedade, fazendo ouvir a sua voz nas questões de interesse nacional, nomeadamente insistindo no respeito pela dignidade e os direitos de todos, particularmente dos mais pobres e vulneráveis. Tenho confiança que o quinquénio de estratégia pastoral, que a Igreja desenvolveu no contexto mais amplo da construção do Estado, produzirá fruto abundante não só para o futuro das comunidades locais mas também do país inteiro. Aludo especialmente à necessidade de proteger o meio ambiente e assegurar uma correta utilização dos ricos recursos naturais do país a bem das gerações futuras. A custódia do dom divino da criação não pode ser separada duma sã ecologia humana e social. De facto, «o cuidado autêntico da nossa própria vida e das nossas relações com a natureza é inseparável da fraternidade, da justiça e da fidelidade aos outros» (Laudato si’, 70).

Queridos Irmãos Bispos, agradeço a Deus este momento de comunhão e rezo para que este nosso encontro nos fortaleça no compromisso de sermos pastores fiéis e servidores do rebanho que Cristo nos confiou. Sei que o vosso ministério é exigente e que muitas vezes sentis, tal como os vossos sacerdotes, «o cansaço do dia e o seu calor» (Mt 20,12). Exorto-vos a manter o equilíbrio tanto na saúde física como na espiritual, e a preocupar-vos paternalmente com a saúde dos vossos sacerdotes.

E, falando de saúde espiritual, lembrai-vos do primeiro dever do bispo. Quando chegaram aos primeiros cristãos as queixas dos helenistas porque eram descuradas as suas viúvas e os filhos, os apóstolos reuniram-se e «inventaram» os diáconos. E Pedro, ao proclamar esta notícia, anuncia também o dever do bispo, nestes termos: «A nós, compete-nos a oração e o anúncio da Palavra» (cf. At 6, 1-6). A oração é o primeiro dever do bispo. À noite, no exame de consciência, cada um de nós, bispos, deverá interrogar-se: «Quantas horas rezei hoje?»

Queridos irmãos, exorto-vos a manter o equilíbrio na saúde física e na espiritual. Sobretudo encorajo-vos a crescer todos os dias na oração e na experiência do amor reconciliador de Deus, porque é a base da vossa identidade sacerdotal, a garantia da solidez da vossa pregação e a fonte da caridade pastoral com que conduzis o povo de Deus pelas sendas da santidade e da verdade. Com grande afeto, invoco a graça do Senhor sobre vós, sobre os sacerdotes, os religiosos e sobre todos os leigos das vossas Igrejas locais. Peço, por favor, que não vos esqueçais de rezar por mim.

E agora convido-vos a rezarmos todos juntos – vós em birmanês, eu em espanhol – a Ave Maria a Nossa Senhora.

[Ave Maria]

Abençoe-vos Deus Todo-Poderoso Pai, Filho e Espírito Santo.
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Santa Sé

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