Virou modinha entre os anticatólicos e
entre os cristãos relativistas citar certos preceitos do Levítico -
que são vistos por eles como leis estúpidas - para zombar da Bíblia e daqueles
que nela apoiam a sua fé. Os defensores da causa gay, em especial,
questionam, com ironia: "O Levítico, que condena os atos homossexuais,
também proíbe comer camarão e aparar a barba dos lados. Os cristãos não pecam
contra essa lei?". Monas militantes, vão interpretar a letra do último hit da Lady
Gaga, porque de Bíblia vocês não sacam nada!
O Levítico - livro dos levitas (sacerdotes)
- tinha o objetivo de expor para o povo de Israel quais as normas religiosas e
sociais deveriam seguir. Como todos os demais livros da Bíblia, foi
totalmente inspirado por Deus. Podemos dizer, a grosso modo, que era para
os israelitas o equivalente do que são para nós o Catecismo, o Código de
Direito Canônico e a Instrução Geral do Missal Romano, adicionando ainda
instruções de higiene, agricultura e bons costumes.
Algumas regras levíticas são perfeitamente
compreensíveis para nós, tais como: as condenações à vingança, ao incesto,
ao sexo com animais e aos sacrifícios humanos. Porém, vários preceitos
do Levítico soam estranhos à maioria das pessoas, entre eles:
· a proibição de usar um tecido
feito com dois tipos de fios;
· a proibição de cortar o cabelo
em redondo e aparar a barba dos lados;
· a proibição de comer carne de
porco, camarão, mariscos, coelho etc.;
· a proibição de tocar em uma
mulher menstruada;
· a proibição de comer os frutos
dos três primeiros anos de colheita.
Apesar de parecerem incompreensíveis à primeira
vista, essas normas possuem uma lógica bastante acessível. Elas não são
seguidas pelos cristãos, o povo da Nova Aliança, mas tiveram um papel muito
importante na Antiga Aliança.
POVO DE ISRAEL, UM POVO SEPARADO
Ao redor do povo de Israel, viviam povos das
mais diversas crenças, que poderiam exercer sobre ele uma forte
influência. Deus, então, levou os hebreus a cultivarem
costumes que evidenciavam a sua diferença dos demais povos, reduzindo assim
o perigo de contaminação espiritual.
O Senhor disse a Moisés: “Dize aos israelitas
o seguinte: eu sou o Senhor, vosso Deus. Não procedereis conforme os
costumes do Egito onde habitastes, ou de Canaã aonde vos conduzi: não
seguireis seus costumes. (Lev 18,1-3)
Portanto, se entre os pagãos a moda era a
barba aparada dos lados e o cabelo cortado em redondo, os israelitas
jamais adotariam um visual parecido. Quem o fizesse, cometia crime de
idolatria: é como se, com sua aparência, estivesse indicando que adorava o mesmo
falso deus dos idólatras.
Não juntarás animais de espécies diferentes. Não
semearás no teu campo grãos de espécies diferentes. Não usarás roupas tecidas
de duas espécies de fios. (Lev 19,19)
Quanto à proibição de misturar dois fios
diferentes (como linho e lã), a intenção é clara: Deus
simboliza aqui o seu desejo de separação entre o povo escolhido e os
pagãos. Não se deve misturar duas coisas diferentes, pois haverá
confusão e contaminação. Tomando o cuidado constante de não
misturar os tipos diferentes de animais, grãos e fios de tecido, os
israelitas reforçavam em sua consciência a importância de se manterem puros,
distintos e separados.
As restrições alimentares (que
foram abolidas depois, no Novo Testamento) seguem a mesma lógica. O
capítulo 11 do Levítico estabelece a distinção entre os animais
"puros" e os "impuros"; não podem ser comidos coelho,
porco, camarão, avestruz, cisne e morcego (viu, Ozzy?), entre outros. Isso fez
com que o povo fosse mais saudável, e funcionou como uma
conveniente barreira para a interação entre os israelitas
e os demais povos. Imaginem como era complicado para um israelita
comparecer a uma festa ou a um jantar na casa de um pagão: na mesa, muitas
vezes, quase tudo lhe era proibitivo.
A IMPUREZA DA MENSTRUAÇÃO
A lei mosaica listava uma série de atos e ocasiões
de tornavam uma pessoa "impura": comer sem lavar as mãos, tocar
no cadáver de um animal, tocar em um leproso ou tocar em uma mulher
menstruada. Colocamos "impura" entre aspas, porque não se
tratava de uma impureza interior, mas meramente uma impureza ritual, exterior.
Dom Estêvão Bettencourt explica que essas normas de
higiene, seguidas também por vários povos pagãos da Mesopotâmia, foram
devidamente revertidas de um significado superior. Elevadas à categoria de lei
religiosa, elas eram aceitas e observadas de modo muito mais eficaz pelo povo,
e assim se garantia a saúde pública (BETTENCOURT, "Para Entender o Antigo
Testamento"). Os israelitas, portanto, deveriam zelar por sua pureza
interior e exterior, de igual maneira.
Na tradição dos cananeus, observada antes mesmo da
instituição da lei mosaica, era impura mulher por certo número de dias toda
mulher que estivesse vertendo sangue, seja por causa da menstruação, do parto
ou de uma hemorragia. De certa forma, esse costume contribuiu para o
cumprimento da divina promessa: a descendência de Abraão seria mais numerosa do
que os grãos de areia e do que as estrelas no Céu. Ora, se um homem fica
impedido de tocar em sua mulher enquanto ela está menstruada, certamente isso
aumenta as chances de que ele faça isso quando ela estiver fértil.
Alem disso, e acima de tudo, os ritos de
purificação exterior na Antiga Aliança eram uma imagem da
purificação interior (arrependimento e Confissão) que, na Nova
Aliança, os cristãos devem fazer para poderem comungar. O Antigo Testamento,
afinal, educa e prepara o povo de Deus para a Revelação da Boa Nova.
OS FRUTOS DA COLHEITA E
A PROVIDÊNCIA DIVINA
Tudo é dom de Deus. Se comemos e se temos bens
necessários à nossa sobrevivência e bem-estar, é acima de tudo graças à
Providência Divina. Sim, os homens trabalham e colhem os frutos de seu empenho
e criatividade. Mas, acima de tudo é o Senhor quem os provê. Tudo depende d'Ele.
Para ensinar essa verdade aos hebreus,
Deus ordenou que, nos primeiros anos após se estabelecerem na Terra Prometida,
eles renunciassem a se beneficiarem dos frutos da terra nascidos de
seus esforços; colheriam somente os frutos das árvores já existentes no local.
Assim, poderiam atestar que Deus os sustentava, sendo então vacinados da
tentação de confiar em si mesmos mais do que no Pai.
Quando entrardes na terra e tiverdes plantado toda
sorte de árvores frutíferas considerareis os seus primeiros frutos como
incircuncisos; eles o serão durante três anos, e não se comerá deles. No quarto
ano todos os seus frutos serão consagrados ao Senhor com ações de graças. No
quinto ano comereis de seus frutos para que a árvore continue a produzi-los. Eu
sou o Senhor, vosso Deus. (Lev 19, 23-25)
Como vemos, o Levítico
apresenta orientações de caráter local e provisório - que faziam
sentido somente no tempo da Antiga Aliança - e também preceitos religiosos
e morais imutáveis (como a condenação ao roubo, por exemplo). Como distinguir,
então, o que deve vigorar eternamente e o que foi abolido com o advento da Nova
Aliança? Simples: é só buscar a devida instrução na Tradição da Igreja.
Especificamente em relação aos
atos homossexuais, estes não são condenados somente no Levítico, mas
também no Novo Testamento (saiba mais aqui) e em toda a Tradição. E é sempre
importante lembrar que aqueles que sentem atração por pessoas do mesmo
sexo não devem ser estigmatizados nem condenados por essa condição. Eles devem
ser acolhidos na Igreja com todo o respeito, sendo encorajados a prosseguir com
alegria no caminho da santidade.
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O Catequista
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