Assim como a aurora precede o meio-dia, analogamente, no ciclo
litúrgico da Igreja Católica, o mês de maio é o mês de Maria, que é a aurora. E
junho é o mês de Jesus, do Sagrado Coração de Jesus, que é o meio-dia.
Que é o Coração de Jesus? É, naturalmente, um coração vivo que palpita
no peito Sagrado do Divino Salvador; um coração formado pela operação
onipotente e sapientíssima do Divino Espírito Santo, no claustro virginal da
Santíssima Virgem e, em consequência, tendo toda a perfeição física que ele
pode comportar; um coração vivificado pela maior alma, a mais pura, a mais
santa, a mais divina que jamais tenha existido; um coração que da chaga nele
aberta pela lança de Longino deixou correr água e sangue, fonte fecunda de
nossa vida espiritual e de nossa salvação.
Ter-se-ão realçado aqui todas as belezas desse Sagrado Coração? Não!
O Coração de Jesus não é, como os nossos, um coração de simples
criatura. É o Coração de Deus, digno, por isso mesmo, de todas as homenagens e
de toda a adoração que não devemos e não prestamos senão a Deus.
Eis aí privilégios do Sagrado Coração que o elevam acima de todos os
outros corações e também de todos os objetos que, como a Cruz, a manjedoura, os
cravos e a coroa de espinhos, foram santificados pelo contato direto que
tiveram com o Homem-Deus. Com efeito, por mais caros e veneráveis que todos
eles sejam para a piedade dos fiéis, sua existência não se confunde com a
própria pessoa do Redentor, como é o caso do Sagrado Coração.
Esse Coração vivo de Nosso Senhor é o emblema, o símbolo, não de um
amor indeterminado, mas do próprio amor de Jesus, inteiramente conforme à sua
natureza humana como à sua natureza divina. Jamais se verá em alguém um coração
tão sensível à influência de todos os afetos da alma. Nosso Senhor é o homem
perfeito e, portanto, n'Ele há uma perfeita harmonia entre os seus afetos e os
sentimentos de seu Coração.
Em cada um de nós, os movimentos da vontade podem não ter senão uma
repercussão imperceptível no coração, porque nossa parte sensível o submete,
não raro, a impressões contrárias e mais vivas. Em Nosso Senhor, não. NEle tudo
é ordem, e essas oposições deploráveis, entre o sentir e o querer não existem.
E um coração reto, puro, imaculado, divino, e todos os sentimentos que aí têm
lugar são santos e santificadores:
"Eu te farei ler no livro do amor de meu Coração", disse um
dia o Divino Mestre à confidente de seu Sagrado Coração, Santa Margarida Maria
Alacoque. E nunca –– talvez no Céu –– conseguiremos ler tudo quanto está
escrito nesse divino livro.
O Sagrado Coração é normalmente representado com a cruz, as chamas, a
coroa de espinhos, acrescentada a chaga nele aberta por Longino.
Esse Sagrado Coração representa, portanto, todo o amor de Nosso Senhor
Jesus Cristo por cada um de nós, todo o imenso sacrifício que Ele fez para nos
resgatar e nos salvar. Ele nos criou e nos resgatou do pecado pela sua morte
infinitamente preciosa. Como Homem-Deus, Ele conhecia todos os homens que
haveriamde nascer, amando-os intensamente. De maneira que, considerando o
pecado gravíssimo de algum deles, Ele diria: "Meu filho, 'você mediu o mal
que fez? Para você eu quero o Céu e não o inferno. Farei um milagre na ordem da
graça para que você se reabilite".
Quis Ele, assim, que na consideração da intensidade desse amor, nós
fôssemos tocados pela graça divina e mudássemos de vida. O que se compreende,
porque um grande ato de bondade pode tocar os corações mais empedernidos e,
dessa forma, obter conversões as mais brilhantes.
Se tivermos a suprema desventura de pecar, portanto de ofender a Deus,
devemos imaginar esse Sagrado Coração, de "majestade infinita",
voltando-se para nós, cheio de bondade, e nos inquirindo: "Por que me
fizeste isso? Que mal te fiz? Em que te contristei?" E deixarmo-nos, por
assim dizer, precipitar nesse oceano de grandeza, de realeza, de superioridade
infinita, que é o Sagrado Coração, do qual brota para cada um de nós uma fonte
inexaurível de misericórdia, de afeto, de ternura, de perdão, que nos inunda e
quebra nossa maldade.
E, comovidos dessa forma até nossas entranhas, não queiramos outra
coisa senão nos arrepender e expiar nossos pecados, para amá-Lo cada vez mais e
nos consumirmos em holocausto a Ele.
Sirvam estas considerações de motivação para revermos nossas almas e
nossas vidas. Para implorarmos ao Sagrado Coração de Jesus o perdão pelos
pecados de que não nos tenhamos arrependido suficientemente, pedindo ainda que,
a rogos de Maria Santíssima, Ele nos proteja para evitarmos outros pecados.
Tendo sempre presente a sublime lamentação de Nosso Senhor feita a Santa
Margarida Maria: "Eis este Coração que tanto amou os homens e por eles foi
tão pouco amado".
Não, absolutamente não! Não sejamos destes que amam pouco, mais sim
dos que amam muito, a ponto de renunciarmos a tudo e sofrermos tudo para
segui-Lo.
"Sagrado Coração de Jesus, Rei e centro de todos os corações ––
tende piedade de nós!"