A reflexão em
torno da “polêmica” acesa, no jornal O Globo, depois que a
Arquidiocese do Rio de Janeiro não deu licença para que fossem exibidas
filmagens com a imagem do Cristo Redentor no filme “Rio, eu te amo”, de José
Padilha, há de levar em consideração que a negação de direitos foi coerente por
duas razões: a) as cenas eram atentatórias à fé e b) a estátua é propriedade da
Arquidiocese, portanto, cabe a ela a tutela daquele ícone religioso que é também
uma das grandes maravilhas do mundo.
Neste contexto,
importa entrarmos no campo da legislação lembrando que há o Acordo bilateral
entre a Santa Sé e a República Federativa do Brasil. Esta é “uma norma
internacional recepcionada pelo ordenamento jurídico brasileiro por Decreto
Legislativo – no caso o de n. 7.107, de 11 de fevereiro de 2010 – possuindo,
portanto, status de Lei Ordinária.
Desse Acordo
interessa-nos, especialmente, os artigos 6º e 7º. O 6º assim reza: “As Altas
Partes reconhecem que o patrimônio histórico, artístico e cultural da Igreja
Católica, assim como os documentos custodiados nos seus arquivos e bibliotecas,
constituem parte relevante do patrimônio cultural brasileiro, e continuarão a
cooperar para salvaguardar, valorizar e promover a fruição dos bens, móveis e
imóveis, de propriedade da Igreja Católica ou de outras pessoas jurídicas
eclesiásticas, que sejam considerados pelo Brasil como parte de seu patrimônio
cultural e artístico”.
“§ 1º. A
República Federativa do Brasil, em atenção ao princípio da cooperação,
reconhece que a finalidade própria dos bens eclesiásticos mencionados no caput deste
artigo deve ser salvaguardada pelo ordenamento jurídico brasileiro, sem
prejuízo de outras finalidades que possam surgir da sua natureza cultural.”
“§ 2º. A Igreja
Católica, ciente do valor do seu patrimônio cultural, compromete-se a facilitar
o acesso a ele para todos os que o queiram conhecer e estudar, salvaguardadas
as suas finalidades religiosas e
as exigências de sua proteção e da tutela dos arquivos. (destaque nosso)”
No artigo
7º se lê que “A República Federativa do Brasil assegura, nos termos do
seu ordenamento jurídico, as medidas necessárias para garantir a proteção dos
lugares de culto da Igreja Católica e de suas liturgias, símbolos, imagens e
objetos cultuais, contra toda forma de violação, desrespeito e uso ilegítimo”.
“§ 1º. Nenhum
edifício, dependência ou objeto afeto ao culto católico, observada a função
social da propriedade e a legislação, pode ser demolido, ocupado, transportado,
sujeito a obras ou destinado pelo Estado e entidades públicas a outro fim,
salvo por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, nos termos
da Constituição brasileira.”
Isso posto,
passemos ao Código Penal que diz, em seu artigo 208: “Escarnecer de alguém
publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar
cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto
de culto religioso: Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. Parágrafo único
- Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da
correspondente à violência”.
Daí o Vade-Mécum elaborado, em 2014, pela CNBB sobre o
Acordo Brasil-Santa Sé comentar que “o tipo penal acima transcrito vem ao
socorro de qualquer pessoa que se sinta desrespeitada em sua crença, sendo
lícita a deflagação do inquérito policial, para posterior denúncia ao
Ministério Público” (p. 27).
Aqui, cabe a
questão que o jornal O Globo parece apontar: o que está dito acima
não seria cerceamento da “liberdade de expressão”? – Respondemos que a
“liberdade de expressão” é muito confundida com o direito de se expressar como
quiser e contra quem quer que seja até mesmo de modo pejorativo sem sofrer
consequências. Ora, essa forma de pensar é errônea, segundo ensina o promotor
de Justiça e Mestre em Direito pela UNESP, Ronaldo Batista Pinto, ao assegurar,
de modo sintético e magistral, que “nenhum direito, ainda que assegurado
constitucionalmente, é absoluto e mesmo a expressão do pensamento,
embora livre nos termos do inc. IV do art. 5º da Carta, pode se sujeitar a
restrições, desde que seu exercício implique na violação do direito alheio”
(Estatuto do Torcedor
comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 39 – destaque
nosso).
Eis um pouco do
que cabe, em termos legais, observar sobre a polêmica em torno da imagem do
Cristo Redentor, ícone religioso pertencente à Arquidiocese do Rio de Janeiro
que o construiu com o apoio de seus fiéis para servir à edificação da fé nesta
Terra de Santa Cruz.
Cumprimente a
D.Orani e a Arquidiocese do Rio de Janeiro, RJ, pela atitude.
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