CARTA
APOSTÓLICA EM FORMA DE «MOTU PROPRIO»
DO
SUMO PONTÍFICE
FRANCISCO
MITIS
IUDEX DOMINUS IESUS
SOBRE
A REFORMA DO PROCESSO CANÔNICO PARA AS CAUSAS
DE
DECLARAÇÃO DE NULIDADE MATRIMONIAL
NO
CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO
O Senhor Jesus, juiz clemente, pastor das nossas
almas, confiou ao apóstolo Pedro e aos seus sucessores o poder das chaves para
realizar na Igreja a obra da justiça e da verdade; este poder supremo e
universal de ligar e desligar na terra afirma, reforça e justifica para os
pastores das Igrejas particulares o sagrado direito e o dever diante do Senhor
de julgar seus próprios súditos[1]
No decorrer dos séculos, a Igreja, em matéria
matrimonial, adquirindo uma consciência mais clara das palavras de Cristo, compreendeu
e expôs com pormenores a doutrina da indissolubilidade do sagrado vínculo
conjugal, elaborou um sistema de nulidade do consentimento e disciplinou
de forma mais adequada o processo judicial nesta matéria, de modo que a
disciplina eclesiástica fosse mais consistente com a verdade da fé professada.
Tudo foi sempre feito tendo como guia a lei suprema da salvação das almas[2],
uma vez que a Igreja, como sabiamente ensinou o papa beato Paulo VI, é um
projeto divino da Trindade, pelo qual todas as suas instituições, ainda
perfectíveis, devem se esforçar para comunicar a graça divina e favorecer
continuamente, segundo os dons e a missão de cada um, o bem dos fiéis, enquanto
escopo essencial da Igreja[3].
Consciente disto, eu decidi pôr mãos à obra na
reforma do processo de nulidade do matrimônio, e para esse fim, designei um
grupo de pessoas versadas em doutrina jurídica, de prudência pastoral e com
experiência forense que, sob a direção do excelentíssimo decano da Rota Romana,
elaborasse um projeto de reforma, respeitando, todavia, o princípio da
indissolubilidade do vínculo matrimonial.
Trabalhando diligentemente, este grupo apresentou
um esquema de reforma, que, submetido à criteriosa consideração, com o auxílio
de outros peritos, é agora transcrito neste moto proprio.
É, portanto, a preocupação da salvação das almas,
que - hoje como ontem - continua a ser o objetivo supremo das instituições, das
leis e do direito, que estimulou o bispo de Roma a oferecer aos outros bispos
este documento de reforma, uma vez que em comunhão com o papa, todos os bispos
juntos partilham o governo da Igreja, tutelando a unidade na fé e na disciplina
votada ao matrimônio, eixo e origem da família cristã. Alimenta o elã
reformador o enorme número de fiéis que, desejando amainar sua própria
consciência, são, muitas vezes, alijados das estruturas jurídicas da Igreja, em
virtude da distância física ou moral; a caridade, portanto, e a misericórdia
exigem que a Igreja, como mãe, fique perto dos filhos que se consideram separados.
Neste sentido, também se levou em consideração o
desejo da maioria dos meus irmãos no episcopado, reunidos no recente Sínodo
extraordinário, que solicitaram processos mais rápidos e mais acessíveis[4]. Em
total sintonia com o referido desiderato, decidi emanar, através deste motu
proprio, disposições que favoreçam não a nulidade dos matrimônios, mas a
celeridade dos processos, numa adequada simplificação, a fim de que, por causa
de um veredicto retardado, os corações dos fiéis, que aguardam um esclarecimento
do seu estado, não tenham de passar muito tempo oprimidos pelas trevas da
dúvida.
Agi, no entanto, seguindo os passos de meus
predecessores, os quais anelavam que as causas de nulidade do matrimônio fossem
apreciadas por via judicial e não administrativa, não porque exigido pela
natureza da coisa, mas pela necessidade de proteger ao máximo a verdade do
vínculo sagrado: e isso é exatamente assegurado pelas garantias da ordem
judicial.
Assinalaram-se alguns critérios fundamentais que
nortearam o trabalho de reforma.
I. – Uma só sentença em favor da nulidade
executiva. - Pareceu apropriado, em primeiro lugar, que não seja mais
necessária uma “dupla sentença conforme” a favor da nulidade do matrimônio, a
fim de que as partes tenham direito a um novo casamento canônico, mas que seja
suficiente a certeza moral alcançada pelo primeiro tribunal em conformidade com
o direito.
II. – O juiz único sob a responsabilidade do bispo.
- A nomeação do juiz monocrático, clérigo, em primeira instância, sob a
responsabilidade do bispo que, no exercício pastoral do próprio poder
judiciário, deverá garantir que não ocorra laxismo.
III. – O próprio bispo é juiz. - Para se traduzir
na prática o ensinamento do Concílio Vaticano II em um âmbito de grande
importância, decidiu-se deixar claro que o próprio bispo na sua Igreja
particular, da qual ele é constituído pastor e dirigente, é, por isso mesmo,
juiz entre os fiéis confiados a ele. Espera-se que, tanto nas grandes quanto
nas pequenas dioceses, o próprio bispo ofereça um sinal da conversão das
estruturas eclesiásticas[5] e não delegue completamente as funções
jurisdicionais em matéria matrimonial. Isso se aplica especialmente ao processo
mais breve, estabelecido para resolver os casos mais evidentes de
nulidade.
IV. – O processo mais breve. – De fato, além de
tornar o processo mais ágil, estatui-se uma forma de processo mais breve - além
do documental atualmente em vigor - a ser aplicada nos casos em que a nulidade
se apoia em argumentos particularmente evidentes. Não me escapou, contudo, como
um procedimento abreviado possa colocar em perigo o princípio da
indissolubilidade do matrimônio; exatamente por isso eu quis que em tal
processo o próprio bispo fosse constituído como juiz, pois, por força de seu
ofício pastoral, é, com Pedro, o maior fiador da unidade católica na fé e na
disciplina.
V. – O recurso para a sé metropolitana. - Convém
que se restaure a apelação ao metropolita, uma vez que o cargo de moderador da
província eclesiástica, estável ao longo dos séculos, é um sinal distintivo da
colegialidade na Igreja.
VI. – A competência específica das conferências
episcopais. - As conferências episcopais, que devem se pautar
especialmente pelo ardor apostólico em reunir os fiéis dispersos, observem
fortemente o dever de compartilhar a mencionada conversão, prestigiando o
direito dos bispos de organizarem o poder judiciário na própria Igreja
particular. A restauração da proximidade entre os juízes e os fiéis, de fato,
não será bem-sucedida, se as conferências não oferecerem aos bispos o estímulo
e a ajuda para pôr em prática a reforma do processo matrimonial. Juntamente com
a proximidade dos juízes, tanto quanto possível, cuidem as conferências
episcopais, salvo as justas e dignas remunerações dos membros dos tribunais,
que se assegure a gratuidade dos processos, porque a Igreja, mostrando-se aos
fiéis mãe generosa em um tema estritamente ligado à salvação das almas,
manifesta o amor gratuito de Cristo, pelo qual todos somos salvos.
VII. – O apelo à sé apostólica. – Convém, no
entanto, que se conserve a apelação ao tribunal ordinário da sé apostólica, que
é a Rota Romana, em razão de um princípio legal antigo, o qual reforça o
vínculo entre a sé de Pedro e as Igrejas particulares, tomando-se cuidado,
todavia, na disciplina de tais apelos, a fim de conter quaisquer abusos ao
direito, para que não haja dano à salvação das almas.
O regimento da Rota Romana será, o mais breve
possível, adaptado às regras do processo reformado, nos limites do que for
necessário.
VIII. – Previsão para as Igrejas orientais.
Considerando, por fim, a peculiaridade do ordenamento e da disciplina eclesial
das Igrejas orientais, decidi promulgar, separadamente, nesta mesma data, as
regras do processo de nulidade do Código dos Cânones das Igrejas Orientais.
Tudo isto devidamente considerado, decreto e estabeleço que o livro VII
do Código de Direito Canônico, Parte III, Título I, Capítulo I, das
causas para a declaração de nulidade do matrimônio (cânones 1671-1691), a
partir de 8 de dezembro de 2015, passe a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1.º – Do foro competente e dos tribunais.
Can. 1671 § 1.º As causas matrimoniais dos
batizados, por direito próprio, competem ao juiz eclesiástico.
§ 2.º As causas relativas aos efeitos meramente
civis do matrimônio competem ao magistrado civil, exceto se o direito
particular não estabelecer que estas mesmas causas, por vezes discutidas
incidentalmente e acessoriamente, possam ser examinadas e decididas por um juiz
eclesiástico.
Can. 1672. Nas causas de nulidade do matrimônio não
reservadas à sé apostólica, são competentes: 1.°- o tribunal do lugar onde o
matrimônio foi celebrado; 2.°- o tribunal do lugar em que uma ou ambas as
partes têm domicílio ou quase-domicílio; 3.°- o tribunal do lugar onde, de
fato, se deve produzir a maior parte das provas.
Can. 1673 §1.º Em cada diocese, o juiz de primeira
instância para as causas de nulidade do matrimônio, se não houver exceção do
direito, é o bispo diocesano, que poderá exercer o poder judiciário
pessoalmente ou através de terceiros, em conformidade com o direito.
§ 2.º O bispo constitua para sua diocese o tribunal
diocesano para as causas de nulidade do matrimônio, salvo a faculdade do mesmo
bispo de anuir com a atuação de outro tribunal vizinho, diocesano ou
interdiocesano.
§ 3.º As causas de nulidade do matrimônio são
reservadas a um colegiado de três juízes, presidido por um clérigo; os
juízes remanescentes podem ser leigos.
§ 4.º O bispo moderador, se não for possível
constituir o tribunal colegial na diocese ou no tribunal vizinho estabelecido
em conformidade com o § 2.º, confie as causas a um único juiz-clérigo, o qual,
onde for possível, seja assistido por dois assessores de vida ilibada, peritos
nas ciências jurídicas ou humanas, aprovados pelo bispo para esta incumbência;
ao mesmo juiz único competem, salvo se se concluir diversamente, as funções
atribuídas ao colégio, ao presidente ou ao relator.
§ 5.º O tribunal de segunda instância, para ser
legítimo, deve ser sempre colegial, em conformidade com o precedente § 3.º
§ 6.º Do tribunal de primeira instância apela-se ao
tribunal metropolitano de segunda instância, salvo o disposto nos cânones
1438-1439 e 1444.
Art. 2.º - Do direito de impugnar o matrimônio
Can. 1674 § 1.º São hábeis para impugnar o
matrimônio: 1° os cônjuges; 2° o promotor de justiça, quando a nulidade já
tiver sido divulgada, se não for possível convalidar o matrimônio ou não for
oportuno.
§ 2.º O matrimônio que, enquanto vivos ambos os
cônjuges, não foi acusado de nulidade, não pode sê-lo após a morte de ambos ou
de um deles, a menos que a questão da validade seja prejudicial à solução de
outra controvérsia, seja no foro canônico seja no foro civil.
§ 3.º Se um dos cônjuges morrer durante o
processo, observe-se o cânon 1518.
Art. 3.º Da introdução e instrução da causa
Can. 1675. O juiz, antes de aceitar a causa,
precisa ter certeza de que o matrimônio está irremediavelmente fracassado, de
modo que seja impossível restabelecer a convivência conjugal.
Can. 1676, § 1.º Aceito o libelo, o vigário
judicial, se considerar que a referida petição tem fundamento, admita-a e, por
decreto anexado ao mesmo libelo, ordene que uma cópia vá notificada ao defensor
do vínculo e, se a petição não foi assinada por ambas as partes, dê-se à parte
demandada o prazo de 15 dias para apresentar sua versão sobre a demanda.
§ 2.º Transcorrido o prazo supramencionado, depois
de advertir novamente, se e enquanto oportuno, a outra parte a manifestar sua
posição, o vigário judicial, por decreto, determine a fórmula da dúvida e
estabeleça se a causa deve ser julgada em um processo ordinário ou em um
processo mais breve, a teor dos cânones 1683-1687. Este decreto seja imediatamente
notificado às partes e ao defensor do vínculo.
§ 3.º Se a causa tiver de ser julgada através de um
processo ordinário, o vigário judicial, com o mesmo decreto, constitua o
colegiado de três juízes ou o juiz monocrático, auxiliado por dois
assessores, segundo o cânon 1673, § 4.º
§ 4.º Se, pelo contrário, vier disposto o processo
mais breve, o vigário judicial proceda de acordo com o cânon 1685.
§ 5.º A fórmula da dúvida deve determinar por qual
capítulo ou por quais capítulos é contestada a validade do matrimônio.
Can. 1677 § 1.º O defensor do vínculo, os patronos
das partes e, se intervier no juízo, também o promotor de justiça, têm o
direito: 1.°- de estar presente no interrogatório das partes, das testemunhas e
dos peritos, sem prejuízo do cânon 1559; 2.°- de compulsar os autos
processuais, ainda que não publicados, e de examinar as provas produzidas pelas
partes.
§ 2.º As partes não podem assistir ao exame de que
trata o § 1.º, n.1.
Can. 1678 § 1.º Nas causas de nulidade do
matrimônio, a confissão judicial e os depoimentos das partes, amparados por
quaisquer textos que lhes deem credibilidade, podem ter valor de prova plena, a
ser avaliado pelo juiz, considerados todos os indícios e minúcias, se não
houver outros elementos que os confutam.
§ 2.º Nas mesmas causas, o depoimento de uma só
testemunha pode fazer fé plenamente, se se tratar de uma testemunha qualificada
que deponha acerca de fatos de ofício, ou se as circunstâncias dos fatos e das
pessoas sugiram tal qualidade.
§ 3.º Nas causas relativas à impotência ou ao vício
de consentimento por doença mental ou anormalidade de natureza psíquica, o juiz
se sirva do trabalho de um ou de mais peritos se, pelas circunstâncias, isto
não for evidentemente inútil; nas outras causas observe-se o disposto no cânon
1574.
§ 4.º Toda vez que na instrução da causa se puser
em dúvida a consumação do matrimônio, o tribunal, ouvidas as partes, pode
suspender a causa de nulidade, completar a instrutória em vista da dispensa
super rato e, por fim, remeter os autos à sé apostólica, junto com o pedido de
dispensa apresentado por um ou ambos os cônjuges, com o voto do tribunal e do
bispo.
Art. 4.º – Da sentença, das suas impugnações e da
sua execução
Can. 1679. A sentença que pela primeira vez
declarou a nulidade matrimonial, expirados os prazos estabelecidos nos cânones
1630-1633, torna-se executiva.
Can. 1680 § 1º. A parte que se considerar
prejudicada, bem como o promotor de justiça e o defensor do vínculo têm o
direito de interpor a querela de nulidade da sentença, ou a apelação, nos
termos do cânones 1619-1640.
§ 2.º Decorridos os prazos estabelecidos para a
apelação e seu processamento, depois de o tribunal de instância superior ter
recebido os autos processuais, constitua-se o colegiado de juízes, designe-se o
defensor do vínculo e as partes sejam exortadas a apresentar suas alegações em
prazo preestabelecido; transcorridos tais prazos, se o apelo for manifestamente
dilatório, seja confirmada com um decreto a sentença de primeira instância.
§ 3.º Se o apelo for admitido, deve-se proceder da
mesma maneira que na primeira instância, com as devidas adaptações.
§ 4.º Se no grau de apelação, vier introduzido um
novo capítulo de nulidade do casamento, o tribunal pode admiti-lo e julgá-lo
como se fosse em primeira instância.
Can. 1681. Se prolatada uma sentença executiva,
pode-se recorrer, a qualquer momento, ao tribunal de terceiro grau para a
nova proposição da causa, em conformidade com o cânon 1644, aduzindo
provas ou argumentos novos e relevantes dentro do prazo peremptório de trinta
dias, a partir da proposição da impugnação.
Can. 1682 § 1.º Após a sentença que declarou a
nulidade do matrimônio tornar-se executiva, as partes cujo matrimônio foi
declarado nulo podem contrair novas núpcias, a menos que proíba um veto anexado
à sentença ou estabelecido pelo ordinário local.
§ 2.º Assim que a sentença adquira força executiva,
o vigário judicial deve notificar o ordinário do lugar onde o casamento foi
celebrado. As respectivas autoridades eclesiásticas, portanto, devem
providenciar que se registre nos livros de matrimônio e do batismo a nulidade
do matrimônio e quaisquer proibições estabelecidas.
Art. 5.º – Do processo matrimonial mais breve
diante do bispo
Can. 1683. Ao mesmo bispo diocesano compete
julgar as causas de nulidade do matrimônio através do processo mais breve, toda
vez que: 1°- a demanda seja proposta por ambos os cônjuges ou por um deles, com
o consentimento do outro; 2°- ocorram circunstâncias de fatos e de pessoas,
fundamentadas por testemunhas ou documentos, que não exijam uma investigação
mais aprofundada ou acurada, restando manifesta a nulidade.
Can. 1684. O libelo com o qual se introduz o
processo mais breve, além do elencado no cânon 1504, deve: 1°- expor
brevemente, integralmente e claramente os fatos nos quais se fundamenta a
demanda; 2°- indicar as provas que possam ser imediatamente acolhidas pelo
juiz; 3º- exibir em anexo os documentos sobre os quais se fundamenta a demanda.
Can. 1685. O vigário judicial, no mesmo decreto com
o qual determina a fórmula da dúvida, nomeie o instrutor e o assessor e cite
para a sessão, a celebrar-se a teor do cânon 1686 não após trinta dias, todos
os que devem participar.
Can. 1686. O instrutor, à medida do possível,
colete as provas em uma única sessão e fixe um prazo de quinze dias para a
apresentação das alegações em favor do vínculo e as defesas, se houver.
Can. 1687 § 1.º Recebidos os autos, o bispo
diocesano, consultando o instrutor e o assessor, examine as alegações do
defensor do vínculo e, se houver, as defesas das partes, e, se atingida a
certeza moral a respeito da nulidade do matrimônio, profira a sentença. Caso
contrário, remeta a causa ao processo ordinário.
§ 2.º O texto integral da sentença com a motivação
seja notificado às partes.
§ 3.º Contra a sentença do bispo, pode-se apelar ao
metropolita ou à Rota Romana; se a sentença foi prolatada pelo metropolita,
apela-se ao bispo sufragâneo mais antigo; e contra a sentença de outro bispo
que não tenha autoridade superior abaixo do pontífice romano, apela-se ao bispo
por ele [o papa] estavelmente designado.
§ 4. Se o apelo evidentemente for meramente
dilatório, o metropolita ou o bispo, conforme reza o § 3.º, ou o decano da Rota
Romana, rejeite-o liminarmente com um decreto; se, por outro lado, o apelo for
admitido, remeta-se a causa ao exame do ordinário de segundo grau.
Art. 6.º – Do processo documental
Can. 1688. Recebida a demandada, apresentada em
conformidade com o cânon 1676, o bispo diocesano ou o vigário judicial ou o
juiz designado, dispensando as formalidades do processo ordinário, citadas,
porém, as partes, com a intervenção do defensor do vínculo, pode declarar por
sentença a nulidade do matrimônio, se por um documento não sujeito a
contradições ou exceções, conste, com certeza, a existência de um impedimento
dirimente ou o defeito de forma legítima, ficando claro, com igual segurança,
que não foi concedida a dispensa ou faltou um mandato válido ao procurador.
Can. 1689 § 1.º Contra esta declaração, o defensor
do vínculo, se prudentemente julgar que não há certeza dos defeitos mencionados
no cânon 1688 ou da falta de dispensa, deve apelar ao tribunal de segunda instância,
para o qual se devem remeter os autos processuais, advertindo-se, por escrito,
que se trata de um processo documental.
§ 2.º A parte que se sentir lesada tem o direito de
apelar.
Can. 1690. O juiz de segunda instância, com a
intervenção do defensor do vínculo e ouvidas as partes, irá decidir consoante o
estipulado pelo cânon 1688 se a sentença deve ser confirmada ou se deve
proceder na causa pelo trâmite ordinário do direito; nesta última hipótese,
retorne a causa ao tribunal de primeira instância.
Art. 7.º – Das normas gerais
Can. 1691 § 1.º A sentença deve recordar às partes
sobre as obrigações morais ou mesmo civis que podem existir de um para o outro
ou com relação à prole, em apoio ao sustento e à educação.
§ 2.º As causas para a declaração de nulidade do
matrimônio não podem ser tratadas com o processo contencioso oral mencionado
nos cânones 1656-1670.
§ 3.º Em tudo que disser respeito ao procedimento,
devem ser aplicados, a menos que a natureza da coisa se oponha, os cânones
sobre os juízos em geral e sobre o juízo contencioso ordinário, observando-se
as normas especiais para as causas sobre o estado de pessoas e para as que
resguardam o bem público.
* * *
A disposição do cânon 1679 aplicar-se-á às sentenças
declaratórias de nulidade do matrimônio publicadas a partir do dia em que este
motu proprio entrar em vigor.
Ao presente documento vêm unidas as regras
procedimentais que eu considero necessárias para a correta e acurada aplicação
da lei reformada, a ser observada diligentemente para a tutela dos bens dos
fiéis.
O que eu estabeleço através deste moto proprio
ordeno que seja válido e eficaz, não obstante qualquer disposição
em contrário, ainda que digna de menção especial.
Confio com segurança à intercessão da gloriosa e
bendita sempre virgem Maria, mãe da misericórdia, e dos santos apóstolos Pedro
e Paulo, a operosa execução do novo processo matrimonial.
Dado em Roma, junto de são Pedro, em 15 de agosto,
assunção da bem-aventurada virgem Maria, do ano de 2015, o terceiro de meu
pontificado.
Francisco
Regras
procedimentais para o julgamento das causas de nulidade de matrimônio
A III Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos
Bispos, celebrada em outubro de 2014, constatou a dificuldade dos fiéis para
chegar aos tribunais da Igreja. Porque o bispo, qual bom pastor, deve ir ao
encontro dos fiéis que necessitam de cuidado pastoral especial, levando consigo
as normas pormenorizadas de execução do processo matrimonial, faz-se oportuno
lembrar, tendo por certa a colaboração dos sucessores de Pedro e dos bispos em
difundir o conhecimento da lei, têm de oferecer alguns instrumentos, a fim de
que o trabalho dos tribunais possa responder às exigências dos fiéis, que pedem
a declaração da verdade sobre a existência ou não do vínculo dos seus
casamentos falidos.
Art. 1.º O bispo, por força do cânon 383, § 1.º, é
chamado a se interessar, com ânimo apostólico, pelos cônjuges separados ou
divorciados que, por sua condição de vida, tenham eventualmente abandonando a
prática religiosa. Ele, portanto, compartilha com os párocos (cf. cânon 529 §
1.º) a solicitude pastoral sobre estes fiéis em dificuldade.
Art. 2.º A investigação anterior ao processo ou
pastoral, que acolhe nas estruturas paroquiais ou diocesanas os fiéis separados
ou divorciados que duvidam da validade do próprio matrimônio ou estão convictos
da nulidade do mesmo, é orientada a conhecer as condições desses fiéis e a
obter elementos úteis para a eventual propositura do processo judicial,
ordinário ou mais breve. Tal investigação se desenvolverá no âmbito da pastoral
matrimonial diocesana unitária.
Art. 3.º A mesma investigação ficará a cargo de
pessoas consideradas idôneas pelo ordinário do lugar, dotadas de competência
não exclusivamente jurídico-canônica. Entre essas pessoas, esteja em primeiro
lugar o pároco próprio ou quem preparou os cônjuges para a celebração das
núpcias. Esta tarefa de aconselhamento pode ser atribuída também a outros
clérigos, a consagrados ou a leigos aprovados pelo ordinário do lugar.
A diocese, ou mais dioceses juntas, segundo os
reagrupamentos atuais, podem constituir uma estrutura estável, através da qual
se forneça este serviço e, se for o caso, se redija
um vademecum, que contenha os
elementos essenciais ao mais adequado desenvolvimento da investigação.
Art. 4.º A investigação pastoral obtém os elementos
úteis para a eventual introdução da causa pelos próprios cônjuges ou pelo
patrono deles em face do tribunal competente. Indague-se se as partes estão de
acordo com o pedido de nulidade.
Art. 5.º Recolhidos todos os elementos, a
investigação termina com o libelo a ser apresentado, se for o caso, ao tribunal
competente.
Art. 6.º Tendo em vista que o Código de Direito
Canônico deve ser aplicado em todos os aspectos, salvo as normas especiais,
também aos processos matrimoniais, no espírito do cânon 1691 § 3.º, as
presentes regras não tencionam expor minuciosamente a integralidade de todos os
processos, mas sobretudo esclarecer as principais inovações legislativas e,
onde for necessário, integrá-las.
Titulo I – Do foro competente e dos tribunais
Art. 7.º, § 1.º Os títulos de competência elencados
no cânon 1672 são equivalentes, salvaguardado, tanto quanto possível, o
princípio da proximidade entre o juiz e as partes.
§ 2.º Mediante a cooperação entre os tribunais, a
teor do cânon 1418, assegure-se que qualquer um, parte ou testemunha, possa
participar do processo com o mínimo dispêndio.
Art. 8.º, § 1.º Nas dioceses que não têm seu
próprio tribunal, o bispo cuide de formar um rapidamente, também mediante
cursos de formação permanente e contínua, promovidos pelas dioceses ou pelos
seus reagrupamentos e pela Santa Sé, em comunhão de intenções e de pessoas que
possam prestar seu trabalho ao tribunal em prol das causas matrimoniais.
§ 2.º O bispo pode renunciar ao tribunal
interdiocesano, constituído em conformidade com o cânon 1423, §1.º
Titulo II – Do direito de impugnar o matrimônio
Art. 9.º Se o cônjuge morrer durante o processo,
antes que a causa esteja concluída, a instância é suspensa, até que o
cônjuge supérstite peça o prosseguimento; neste caso, deve-se provar o
interesse legítimo.
Titulo III – Da introdução e a da instrução da
causa
Art. 10º. O juiz pode admitir a demanda oral sempre
que a parte esteja impedida de apresentar o libelo, todavia, ordene ao notário
que redija um ato que deve ser lido para a parte e aprovado por ela e que tenha
efeito legal, como se fosse redigido pela própria parte.
Art. 11 § 1.º O libelo seja interposto ao tribunal
diocesano ou ao tribunal interdiocesano escolhido a teor do cânon 1673 § 2.º
§ 2.º Considera-se que não se opõe à demanda a
parte demandada que se reporta à justiça do tribunal ou, devidamente citada uma
segunda vez, não dá nenhuma resposta.
Titulo IV – Da sentença, das suas impugnações e da
sua execução
Art. 12. Para atingir a certeza moral exigida por
lei, não é suficiente a prevalente importância das provas e dos indícios, mas é
necessário que fique excluída qualquer dúvida de erro positivo, de direito e de
fato, mesmo que não seja excluída a mera possibilidade do contrário.
Art. 13. Se uma parte declarou que recusa o
recebimento de qualquer informação relativa à causa, deduz-se que renunciou à
obtenção da cópia da sentença. Neste caso, pode ser notificada só do
dispositivo da sentença.
Titulo V – Do processo matrimonial mais breve
diante do bispo
Art. 14 § 1.º Entre as circunstâncias que podem
admitir o processamento da causa de nulidade do matrimônio por meio de processo
mais breve, segundo os cânones 1683-1687, incluem-se, por exemplo: a falta de
fé, que pode gerar a simulação de consentimento, o erro que determina a
vontade; a brevidade da vida de casado; o aborto provocado para evitar a
procriação; a obstinada permanência em uma relação extraconjugal ao tempo das
núpcias ou em um tempo imediatamente sucessivo; o ocultamento doloso da
esterilidade ou de uma doença grave contagiosa ou de filhos nascidos de uma
relação precedente ou do encarceramento; o motivo do matrimônio totalmente
estranho à vida conjugal ou consistente na gravidez imprevista da mulher; a
violência física com o objetivo de extorquir o consentimento; a falta de uso da
razão, comprovada por documentos médicos etc.
§ 2.º Entre os documentos que fundamentam a
demanda, existem os documentos médicos que podem demonstrar a inutilidade de se
determinar uma perícia de ofício.
Art. 15. Se o libelo for apresentado para
introduzir um processo ordinário, mas o vigário judicial concluir que a causa
pode ser tratada por um processo mais breve, ao notificar o libelo pela norma
do cânon 1676 § 1.º, intime a parte que não havia subscrito a informar ao
tribunal se pretende aderir à demanda apresentada e participar do processo. O
vigário judicial, sempre que necessário, convide a parte ou as partes que
subscreveram o libelo a integrá-lo o mais rapidamente possível, segundo a norma
do cânon 1684.
Art. 16. O vigário judicial pode designar a si
próprio como instrutor; no entanto, à medida do possível, nomeie um
instrutor da diocese de origem da causa.
Art. 17. Ao expedir a citação conforme o cânon
1685, as partes sejam informadas de que, se não alegaram no libelo, podem, ao
menos três dias antes da primeira audiência instrutória, apresentar os
argumentos provenientes do interrogatório das partes ou das testemunhas.
Art. 18. § 1.º As partes e seus advogados podem
assistir à oitiva das outras partes e das testemunhas, a menos que o instrutor
o proíba, em virtude de circunstâncias de coisas ou pessoas, devendo-se
proceder diversamente.
§ 2.º As respostas das partes e das testemunhas
devem ser reduzidas a termo pelo notário, mas sumariamente e apenas no que se
refere à substância do matrimônio controverso.
Art. 19. Se a causa vier instruída próximo a um
tribunal interdiocesano, o bispo que deve pronunciar a sentença é aquele do
local onde se estabelece a competência, conforme o cânon 1672. Se, por acaso,
for mais de um tribunal, observar-se-á o quanto possível o princípio da
proximidade entre as partes e o juiz.
Art. 20 § 1.º O bispo diocesano estabeleça,
conforme sua prudência, o modo de proferir a sentença.
§ 2.º A sentença, no entanto, assinada pelo bispo
juntamente com o notário, exponha de modo breve e ordenado os motivos da
decisão e ordinariamente seja notificada às partes, no prazo de um mês, contado
da decisão.
Titulo VI – Do processo documental
Art. 21. O bispo diocesano e o vigário judicial
competentes são constituídos pela norma do cânon 1672.
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[1] Cf. Concilio Ecumênico Vaticano II, const.
dogm. Lumen Gentium, n. 27.
[2]Cf. CIC, can. 1752.
[3]Cf. Paulo VI, Alocução aos participantes do II Congresso
Internacional de Direito Canônico (17 de setembro de 1973).
[4]Cf. “Relatio Synodi”, n. 48.
[5]Cf. Francisco, exortação apostólica Evangelii
gaudium, n. 27, in AAS 105 (2013), p. 1031.
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Os canonistas
Edson Sampel e José de Ávila Cruz enviaram a ZENIT a tradução em português
da carta apostólica do papa Francisco, "Mitis Iudex Dominus Iesus",
que dá nova redação a dispositivos do código canônico (C.I.C.), reformando o
processo de nulidade de matrimônio. Os referidos especialistas "franqueiam
a versão abaixo ao povo de Deus, principalmente aos operadores do direito
canônico, lembrando, contudo, que somente o texto em latim tem valor
oficial".
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ZENIT
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