Discurso
Papa
Francisco fala aos detentos na Filadélfia
Estados
Unidos
Queridos irmãos e irmãs!
Obrigado pela recepção e a possibilidade de estar
aqui convosco compartilhando este período da vossa vida. Um período difícil,
cheio de tensões. Um período que – bem sei – é doloroso não só para vós, mas
também para as vossas famílias e toda a sociedade; porque uma sociedade, uma
família que não sabe sofrer com as dores dos seus filhos, que não as leva a
sério, que as trata como coisas «naturais» considerando-as normais e
previsíveis, é uma sociedade «condenada» a permanecer prisioneira de si mesma,
prisioneira de tudo o que a faz sofrer. Vim como pastor, mas sobretudo como
irmão para compartilhar a vossa situação e fazê-la minha também; vim para
podermos rezar juntos e apresentar ao nosso Deus aquilo que nos dói e também o
que nos encoraja, e receber d’Ele a força da Ressurreição.
Recordo o Evangelho em que Jesus lava os pés aos
seus discípulos durante a Última Ceia. Uma atitude que os discípulos tiveram
dificuldade em compreender, incluindo São Pedro que reage dizendo-Lhe: «Tu
nunca me hás-de lavar os pés!» (Jo 13, 8).
Naquele tempo era costume, quando uma pessoa
chegava a casa, lavar-lhe os pés. As pessoas eram recebidas sempre assim. Não
havia estradas asfaltadas, eram estradas poeirentas, com o cascalho que se
enfiava nas sandálias. Todos percorriam caminhos que os deixavam impregnados de
pó, quando não se feriam em alguma pedra ou faziam qualquer corte. No Cenáculo,
vemos Jesus que lava os pés, os nossos pés, os pés dos seus discípulos de ontem
e de hoje.
Todos sabemos que viver é caminhar, viver é seguir
por várias estradas, diferentes caminhos que deixam a sua marca na nossa vida.
Pela fé, sabemos que Jesus nos procura, quer curar
as nossas feridas, curar os nossos pés das chagas dum caminho cheio de solidão,
limpar-nos do pó que se foi agarrando a nós ao longo das estradas que cada um
percorreu. Não nos pergunta por onde andamos, nem nos interroga sobre o que
andávamos a fazer.
Pelo contrário, diz-nos: «Se Eu não te lavar, nada
terás a ver comigo» (Jo 13, 8). Se não te lavar os pés, não poderei dar-te a
vida que o Pai sempre sonhou, a vida para que te criou. Ele vem ao nosso encontro
para nos calçar de novo com a dignidade dos filhos de Deus. Quer ajudar-nos a
recompor o nosso andar, retomar o nosso caminho, recuperar a nossa esperança,
restituir-nos a fé e a confiança. Quer que regressemos às estradas da vida,
sentindo que temos uma missão; que este tempo de reclusão nunca foi sinônimo de
expulsão.
Viver comporta «sujar os nossos pés» pelas estradas
poeirentas da vida, da história. Todos precisamos de ser purificados, ser
lavados. Todos, eu sou o primeiro. Todos somos procurados por este Mestre que
nos quer ajudar a retomar o caminho. O Senhor procura-nos a todos, para nos dar
a sua mão. É penoso constatar como às vezes se geram sistemas prisionais que
não procuram curar as chagas, curar as feridas, criar novas oportunidades. É doloroso
constatar como às vezes se pensa que só alguns precisam de ser lavados,
purificados, sem considerar que o seu cansaço, o seu sofrimento, as suas
feridas são também o cansaço, o sofrimento e as feridas duma sociedade. O
Senhor no-lo mostra claramente através dum gesto: lavar os pés para se sentar à
mesa; uma mesa, da qual Ele quer que ninguém fique fora. A mesa que foi
preparada para todos e para a qual todos somos convidados.
Este período na vossa vida só pode ter um
objectivo: estender a mão para retomar o caminho, estender a mão para que ajude
à reintegração social. Uma reintegração de que todos fazemos parte, que todos
somos chamados a estimular, acompanhar e realizar. Uma reintegração procurada e
desejada por todos: reclusos, famílias, funcionários, políticas sociais e
educativas. Uma reintegração que beneficia e eleva o nível moral de toda a
comunidade.
Jesus convida-nos a partilhar a sua sorte, o seu
estilo. Ensina-nos a ver o mundo com os seus olhos. Olhos que não se
escandalizam do pó da estrada; antes, procura limpar e curar, procura remediar.
Convida-nos a trabalhar para criar novas oportunidades: para os presos, para os
seus familiares, para os funcionários; uma oportunidade para toda a sociedade.
Desejo encorajar-vos a manter esta atitude entre vós, com todas as pessoas que
de alguma maneira fazem parte deste Instituto. Sede artífices de oportunidades,
artífices de caminho, de novas vias.
Todos temos alguma coisa de que ser limpos,
purificados. Que a consciência disto nos desperte para a solidariedade, para
nos apoiarmos e procurarmos o melhor para os outros.
Fixemos os olhos em Jesus que nos lava os pés: Ele
é «o Caminho, a Verdade e a Vida» (Jo 14, 6), que nos vem fazer sair do engano
de crer que nada pode mudar, que nos ajuda a caminhar por sendas de vida e
plenitude. Que a força do seu amor e da sua Ressurreição seja sempre caminho de
vida nova.
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Canção Nova
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