"Não foi para batizar que
Cristo me enviou, mas para anunciar o evangelho, sem recorrer à sabedoria da
linguagem, a fim de que não se torne inútil a cruz de Cristo. Com efeito, a
linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem, mas para aqueles que se
salvam, para nós, é poder de Deus" (1Cor 1,17-18).
Muitos
católicos tiveram o primeiro impacto da sua conversão num desses encontros de
fim de semana tão comuns em nossas Paróquias. Ali a Palavra veio forte, a
experiência sensitiva acompanhada de emoção abria a mente para encontrar Deus
de maneira mais próxima do que nas missas, por exemplo. Muitos desses neoconvertidos
nos movimentos e nos encontros não tinham o hábito de frequentar a santa Missa
ou de ter vida de oração diária. A partir deste momento primeiro - que
poderíamos comparar com o encontro de Moisés com a sarça ardente no deserto -
muitos começam uma vida católica mais amiúdo: muitos pedem os sacramentos da
fé, participam mais ativamente da vida da Igreja, se integram em pastorais e
serviços, passam a comungar com frequência, etc.
Depois
que passa-se este primeiro momento de euforia e certa consciência do ser
cristão, do pecado, das obrigações cristãs, etc, a pessoa que teve um grande
choque de conversão dá-se conta de sua humana fragilidade e é aí que a vida
católica se choca com suas opções e sua mentalidade ainda mundana, pagã e,
então, perde força aquela primeira conversão. Imaginemos hipoteticamente uma
pessoa que teve uma vida devassa na bebedeira, na pornografia, na jogatina e na
sexualidade desregrada - o que não é muito incomum. Logo esta pessoa se
deparará com o mandamento "não pecar contra a castidade", por
exemplo, se deparará com uma moça que quererá viver o namoro casto, terá amigos
que não bebem, entre outras coisas, pois estará fazendo parte de outro círculo
de relações. O que fazer diante deste quadro? Em geral, a pessoa pensa poder viver
uma vida agradando a Deus, mas, vivendo os hábitos pagãos e mundanos antigos:
quer continuar tendo vida sexual ativa e degenerando-se em vícios de todo tipo.
A experiência a seguir é começar a mitigar a exigência de mudança de vida e
conversão legitimando os próprios erros com as seguintes frases: "não é
bem assim que devem ser feitas as coisas"; "não se pode ser duro
demais na exigência"; "tem que dar um tempo para cada um se converter
de verdade sem forçar a barra"; "Deus é bom e conhece os nossos limites,
por isso não nos condenaria". Em geral este discurso carregado de
ambiguidades sobre Deus e sobre o homem, quer mitigar as exigências de um
caminho de conversão verdadeiro e sincero.
Não é
possível tomar por concluída a conversão dada naquele encontrinho de fim de
semana que fez todos chorarem. A conversão verdadeiramente católica é aquela
que toma a sério aquela advertência de São Paulo que encima este texto: a cruz
é verdadeiramente loucura para o mundo. Noutras palavras, a conversão é inimizade
com o mundo como diz Jesus no seu discurso antitético de João 15, 18: "se
o mundo vos odeia, sabei que primeiro me odiou a mim" e continua:
"minha escolha vos separou do mundo" (v.19). Entre o cristão e o
mundo não há amizade, mas, inimizade. Não há colaboração, mas, dominação e
separação por meio da razão e da fé. Este é o escândalo da cruz: dar
prosseguimento à vida de conversão para que a cruz de Cristo - o seu sacrifício
redentor por muitos - não se torne vão.
Viver
deste modo é amar o Senhor Jesus com todo o amor que se possa ter. Tal amor é:
conhecimento de Deus, abnegação voluntária, auto sacrifício, negação de si
mesmo, domínio dos impulsos, conversão da mentalidade (cf. Rm 12,2). Por isso o
cristão é sempre visto como "louco" aos olhos do mundo. Uma loucura,
talvez, equivalente àquilo que Jesus disse: "Desde João Batista até agora
o reino dos céus sofre violência e violentos se apoderam dele" (Mt 11,12)
e isto pode ser legitimamente interpretado assim: os violentos são os que
conseguem entrar no reino dos céus à custa das mais duras renúncias. Quem, no
entanto, é capaz de renunciar assim a si mesmo senão os que amam Deus
loucamente? Os que querem dar sua vida por Deus? Os que não pensam em guardar
nada de sua vida mundana e pagã para si, mas, que desejam desapegar-se dela
para viver em Deus porque só Deus vale a pena, só Ele é o verdadeiro tesouro, a
verdadeira alegria? Somente este gau de "loucura" ou de amor é capaz
de gerar uma energia vital forte o suficiente para convencer o coração a
prosseguir o difícil caminho da virtude e da conversão até à vida eterna que às
vezes se torna monótono caminho de luta árdua contra as próprias más
inclinações.
A Igreja
está cheia de neoconvertidos com mentalidade pagã que pensam que já está tudo
bem, estão convertidos, estão prontos, porque já fizeram "o
encontro", "o retiro", "a jornada", etc. Nada mais
falso! "Não resistiria aos embates
do tempo uma fé católica reduzida a uma bagagem, a um elenco de algumas normas
e de proibições, a práticas de devoção fragmentadas, a adesões seletivas e
parciais das verdades da fé, a uma participação ocasional em alguns
sacramentos, à repetição de princípios doutrinais, a moralismos brandos ou
crispados que não convertem a vida dos batizados. Nossa maior ameaça “é o
medíocre pragmatismo da vida cotidiana da Igreja, no qual, aparentemente, tudo
procede com normalidade, mas na verdade a fé vai se desgastando e degenerando
em mesquinhez”. A todos nos toca recomeçar a partir de Cristo, reconhecendo que
“não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas
pelo encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá um novo horizonte à
vida e, com isso, uma orientação decisiva”. (Documento de Aparecida, nº 12)
Aconselho ler meu outro artigo:
"O católico médio perdido entre o relativismo moral e a má fé" para
aprofundar o tema.
Padre Luis Fernando Alves Ferreira
Diocese de Itumbiara
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Blog do Padre Luís Fernando
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