Nota
sobre o Projeto de Reforma Política
Há pelo menos dois anos, a OAB — Ordem dos
Advogados do Brasil, a CNBB — Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a CBJP
— Comissão Brasileira Justiça e Paz, e outros organismos que fazem parte do
MCCE — Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral vêm discutindo uma proposta
de Reforma Política a ser submetida ao Congresso Nacional. Essa iniciativa
tomou corpo sobretudo depois do sucesso obtido com a aprovação da Lei da Ficha
Limpa, que também foi resultado de um trabalho conjunto de várias entidades,
com grande participação de nossas comunidades católicas.
Ao contrário da Lei da Ficha Limpa, que era um
projeto pontual e, portanto, mais fácil de ser explicado ao povo, a proposta de
Reforma Política é bem mais complexa. Não foi fácil chegar a um consenso entre
as várias entidades parceiras. Finalmente, foi lançada a proposta para a qual,
atualmente, estão sendo coletadas assinaturas pelo país a fora.
É claro que essa proposta ainda precisa ser
aperfeiçoada. Como acontece a qualquer Projeto de Lei, ela terá que passar por
várias Comissões no Congresso Nacional, antes de ser aprovada. Nessa
trajetória, ela será amplamente discutida, receberá emendas as mais diversas,
será apensada a outros projetos similares, até chegar à sanção presidencial. No
entanto, ela terá o mérito de trazer a Reforma Política à pauta das discussões
no Congresso, na imprensa, e pelos mais diversos formadores de opinião. Isso
faz parte do processo democrático.
Nesse sentido, tenho tido a oportunidade de
discutir detalhes do projeto com grupos e pessoas respeitosas, que discordam da
proposta. Essas discussões são muito proveitosas, e deveriam se multiplicar.
Seria muito bom que as Paróquias e Comunidades as promovessem em grupos
organizados. Eu mesmo gostaria de organizar um debate a ser transmitido pela TV
Imaculada e pela internet, de modo que outras dúvidas que ainda persistam no
coração de muitos possam ser dirimidas.
No entanto, para grande surpresa de uns e alegria
de outros, têm surgido reações, inclusive no interior da Igreja Católica, que
ultrapassam, em muito, a justa medida. Críticas contundentes e, não raro,
rasteiras e superficiais, acusam a CNBB de querer implantar o comunismo no
Brasil, de ser partidária do Chavismo (de Hugo Chaves, da Venezuela) no país. A
América Latina, que a Conferência de Aparecida, na presença do Papa Bento XVI
chamava de Pátria Grande, passa a ser vista por alguns grupos como a
denominação de um continente bolivariano, em que os diversos países perderiam
sua identidade. Alguns chegam até a dizer que a capital dessa Pátria Grande
seria localizada em Cuba. Alguns pretendem, inclusive, legitimar suas posições
usando a imagem e o nome de um irmão Bispo já falecido, usado em montagem
construída de má fé. Tudo isso corre solto pelas redes sociais.
Muitos se assustam ao ver que algumas Centrais
Sindicais, Movimentos Sociais, ou mesmo entidades que, com frequência, se
posicionam contra a Igreja, estejam juntos apoiando a proposta. A presença
dessas entidades já seria argumento suficiente para descartar o Projeto, que
passa a ser considerado, no mínimo, como suspeito. De fato, já são 110
entidades compondo a chamada Coalizão pela Reforma Política Democrática e
Eleições Limpas. Isso significa que a proposta NÃO É UM PROJETO DA CNBB, NEM DA
OAB, embora ambas estejam entre suas principais articuladoras. Se fosse uma
proposta só da CNBB, ou só da OAB, provavelmente teria outros contornos. No
processo democrático, é dura a luta pelo consenso em bases mínimas. Ao apoiar a
proposta em questão, a CNBB em nenhum momento abriu mão de valores e princípios
que são essenciais à fé católica ou à Doutrina Social da Igreja. Apenas apoia
uma estratégia que possa ser aceita pelo maior número possível de segmentos da
sociedade civil organizada. Isso não significa que a mesma parceria seja
possível quando se tratar de outros temas.
Outros pretendem que a Reforma Política apoiada
pela CNBB seja, na verdade, uma proposta do partido político atualmente no
Governo do País. Seria, portanto, uma proposta viciada por interesses
político-partidários. Ora, nenhum partido enquanto tal participou do processo
de elaboração do Projeto, e dificilmente qualquer partido vai apoiá-lo na sua
inteireza. Aliás, não cabe à Igreja apoiar este ou aquele partido. Ela pode e
deve orientar os fiéis no plano dos princípios e dos valores, à luz do
Evangelho e da grande Tradição. Caso o Projeto chegue a tramitar no Congresso
Nacional, o resultado será fruto da discussão de todos os partidos. Certamente,
maiorias no Congresso podem impor projetos de leis aos demais. Aliás, um
simples acordo de lideranças de diversos partidos pode ser suficiente para
aprovar um Projeto de Lei. Mas uma proposta que mexe com todo o processo eleitoral
só terá um apoio significativo se houver ampla mobilização da sociedade. Foi
assim que a Lei da Ficha Limpa passou por unanimidade no Senado.
Enfim, gostaria de reafirmar que acredito no atual
projeto de Reforma Política, e não consigo ver como seja possível que todas
essas suspeitas levantadas em contrário possam se concretizar. Certamente, cada
um tem todo o direito de discordar, ou de não aderir à coleta de assinaturas.
Só não vale apelar para calúnias, agredir quem pensa diferente ou faltar com a
caridade.
Que nesta Páscoa, todos possamos crescer na fé, na
unidade. E que Nossa Senhora da Abadia, nossa Padroeira, abençoe todas as
nossas famílias.
Dom Dimas
Lara Barbosa
Arcebispo de
Campo Grande – MS
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