quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Crescimento do islamismo: será que você está bem informado?


Em abril deste ano, o instituto de pesquisas Pew Research Center, sediado nos EUA, divulgou a informação de que em 2050 “o número de muçulmanos igualará quase ao de cristãos”, desde que as tendências de crescimento de ambas – cristianismo e islamismo – permanecerem inalteradas.

Para chegar a essa conclusão, o documento se baseou em projeções que levaram em conta, principalmente, a taxa de fertilidade, a idade da população, as migrações e as tendências de conversão. O islã “crescerá mais rápido que qualquer outra religião”, afirmava o documento.

Liberdade Religiosa

Contudo, como toda pesquisa meramente quantitativa, esta necessita de uma análise mais profunda da situação. Fatores que influenciam – e muito – no crescimento ou declínio de uma determinada religião ficaram de fora, um deles é o grau de liberdade religiosa de um país em detrimento de outro.

Um muçulmano, por exemplo, pode expor a fé de forma bastante livre em países ocidentais, como a França, o Brasil e até mesmo nos EUA. Por outro lado, em países como a Arábia Saudita um cristão só pode utilizar a bíblia para uso pessoal[1], jamais para pregar nas ruas ou em locais públicos. Em locais como o Afeganistão a situação pode ser ainda mais complexa, chegando a ter parlamentares que defendam a execução de afegãos convertidos ao cristianismo[2]. Nesta lógica, se apenas muçulmanos podem pregar aos cristãos, e não o contrário, disparidades naturalmente começarão a ser observadas.

Repare que nos Emirados Árabes Unidos, país onde a resistência para com os cristãos é menor[3], a pesquisa do Pew Research aponta para um cenário diferente entre 2010 e 2050: crescimento do cristianismo (de 12,6% para 12.9%) e diminuição do islamismo (de 76.9% para 73%).

E o que dizer do número de muçulmanos que se converte em países para os quais emigraram, mas que preferem manter o anonimato a fim de evitar represálias?! É o que acontece, por exemplo, em Berlim, na Alemanha, onde dioceses e paróquias relatam um aumento crescente de muçulmanos em busca de uma nova fé, mas que não fazem disso algo a ser divulgado aos quatro cantos por simples medo dos próprios pares[4]. 

Natalidade

Outro ponto a ser aprofundado é questão da natalidade. A pesquisa utilizou isto como um ponto de análise. Mas a natalidade dos muçulmanos nunca esteve tão em queda quanto hoje. Se há alguns anos os índices de natalidade entre muçulmanos eram significativamente elevados, hoje já é possível perceber uma mudança. Em artigo publicado[5] no portal EcoDebate, intitulado Transição demográfica nos países islâmicos, de autoria do professor José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, é afirmado o seguinte:

Considerando 46 países com população majoritariamente muçulmana, a Taxa de Fecundidade Total (TFT) estava, em 1950, acima de 7 filhos por mulher em 25 deles, entre 6 e 7 filhos em 17 países e entre 5 e 6 filhos em 4 países. [...] a partir de 1985, a fecundidade começou a cair em praticamente todos os países muçulmanos (as exceções são apenas Somália, Afeganistão e Yemen). Em 2008, 21 países tinham taxas de fecundidade igual ou abaixo do nível de reposição (2,1 filhos por mulher) que é o número necessário de filhos para manter a população estável no longo prazo. Fecundidade abaixo de 2,1 filhos por mulher significa que a população vai decrescer no longo prazo.

O caso da Indonésia é ilustrativo. O maior país muçulmano – e o quarto maior do mundo – tinha uma população de 77 milhões de habitantes em 1950, chegou a 230 milhões em 2009 e deve atingir 288 milhões em 2050. Mas a TFT já se encontra em torno de 2,1 filhos por mulher atualmente e deve ficar abaixo do nível de reposição na próxima década. [...] Os dados mostram que a população da Indonésia crescia a 2,3% ao ano no quinquênio 1970-75, caiu para 1,2% entre 2005-10 e deve ter crescimento zero no quinquênio 2045-50. Na segunda metade do século XX deve haver decréscimo populacional no país.

Mas cabe ao Irã o recorde na rapidez da transição demográfica. A TFT encontrava-se em torno de 7 filhos por mulher até o quinquênio 1960-65. Caiu para 6,4 filhos em 1970-75 e voltou a subir para 6,6 filhos em 1980-85, logo após a revolução islâmica, liderada pelo aiatolá Khomeini. Porém, entre 1985-90 e 2000-05 a fecundidade caiu para 2,1 filhos por mulher, transformando a transição da fecundidade do Irã na mais rápida ocorrida no mundo.

Assim, prezado leitor/a, repare que se pegarmos apenas a tendência total (sem fazer qualquer detalhamento comparativo dos períodos mais recentes) do crescimento da população mundial nos últimos 100 anos, então veremos um grandioso aumento dos muçulmanos para os próximos 100, 200 anos. Mas se analisarmos pormenorizadamente as taxas de fecundidade das nações islâmicas, tomando como base a comparação dos quinquênios apontados pelo professor José Eustáquio no artigo acima, a conclusão será de que este crescimento não será tão certo.

Conclusão

Embora pesquisas sejam sempre bem-vindas, é preciso de um pouco mais de crítica para analisá-las, sobretudo quando se quer chegar a conclusões tão importantes. Comparar os números obtidos numa análise ‘X’ com os obtidos em outra análise ‘Y’ permite que tenhamos uma noção mais acurada do cenário que está querendo ser projetado. Se, por um lado, o Pew Research Center aponta que o número de cristãos e muçulmanos será igual em 2050, percebe-se que há tendências na natalidade da população islâmica que provavelmente não foram levadas em consideração.

Também é preciso esclarecer que é pouco provável que uma pesquisa consiga prever mudanças geopolíticas profundas. Por exemplo: se os países muçulmanos se abrirem à entrada de missionários ou simplesmente se tornarem mais tolerantes quanto à prática de outras religiões, será que não teríamos um cenário diferente? Talvez sim, vide o exemplo dos Emirados Árabes Unidos tratado nesse mesmo artigo.

Dito isto, cabe-nos observar que, embora as projeções estatísticas sejam relevantes, é importante, no momento de analisá-las, levar em conta múltiplos fatores e variáveis que os números não conseguem decifrar tão bem, tendo sempre em mente que muito mais relevante do que saber qual será a religião que estará em ascensão ou não, é refletir sobre a contribuição da mesma para que as sociedades sejam menos desiguais.

Aliás, no fim das contas, o grande desejo de todos nós é que líderes cristãos e muçulmanos tenham, mais do que nunca, a noção exata de suas responsabilidades perante a grandeza do mundo e a singeleza da vida para que, juntos, construam um mundo melhor. Nessa ótica, pouco importará o crescimento desta ou daquela corrente religiosa.



Geanderson Reis

é jornalista, publicitário e assessor de comunicação do CONIC - Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil.
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CONIC

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