Nem cheirar, nem matar, nem traficar,
nem roubar doce de criancinha; o pecado mais atiça a sanha dos nossos irmãos
evangélicos é a idolatria. E, nesse ponto,
quase todos os católicos vivem sendo “crenticados”.
A estratégia dos nossos
acusadores é a da tijolada: pegam uma
passagem da Bíblia, tiram ela do seu contexto e a lançam na nossa
cabeça, sem dó. Neste caso, o tijolo, isto é, o texto que usam como arma para
atacar a nossa fé é o seguinte:
“Não terás outros deuses diante de minha
face. Não farás para ti escultura, nem figura alguma do que está em cima, nos
céus, ou embaixo, sobre a terra, ou nas águas, debaixo da terra. Não te
prostrarás diante delas e não lhes prestarás culto.” (Ex 20,3-5)
De fato, o texto não deixa margem para
dúvidas: prestar culto a imagens de santos, como nós católicos fazemos, seria
realmente um pecado gravíssimo… na época do Antigo Testamento. A proibição era,
então, absolutamente necessária, mas perdeu o seu
sentido quando o Velho deu lugar ao Novo Testamento.
Explico: o povo que vivenciou o Êxodo
era, em grande parte, idólatra. A crença no Deus de Abraão, Isaac e Jacó
não os imunizou da influência religiosa dos demais povos. Assim, o culto aos
ídolos – primeiramente o bezerro de ouro, e depois os baals – era uma fonte de
frequentes aborrecimentos e decepções para o Senhor.
Por isso, havia o grande risco de os
hebreus perceberem o Deus da Aliança como mais um deus, o que deus estava “em
alta” no momento, e não como O Deus, Único e Verdadeiro. Javé precisava deixar claro o abismo que havia entre os ídolos
e Ele: Ele não é produto da mente humana, nem tampouco a Sua doutrina. Ele é
o Deus que se revelou, Ele é Aquele que É (“Eu Sou Aquele que Sou” – Ex,3-14).
Os ídolos, por sua vez, eram patéticos e impotentes objetos de pau, metal ou
pedra, que representavam esquemas religiosos e doutrinas criadas pela
imaginação humana.
Assim, foi preciso tomar uma medida educativa: proibir que o povo fizesse qualquer
imagem do Senhor, para deixar claro que Ele não era mais um deus
inventado, moldado por mãos humanas. Ademais, ninguém
conhecia o Seu rosto, e nenhuma imagem poderia ficar à altura da Sua imensa glória:
“No dia em que o SENHOR vos falou do
meio do fogo no Horeb, não vistes figura alguma. Guardai-vos bem de
corromper-vos, fazendo figuras de ídolos de qualquer tipo.” (Dt 4, 15-16)
Entendida a razão que originou da
proibição do culto às imagens? Então, passemos à segunda parte da história…
“Jingle Bells, jingle
Bells!…”. Deus finalmente nos mostrou a
Sua face. Todo o poder, o amor, a beleza, a misericórdia e a força Deus sem
rosto e sem nome cabiam agora no corpo de um Menino. Os olhos dos homens
finalmente podiam contemplar a FIGURA do Criador: “Quem Me vê, vê também Aquele
que Me enviou” (Jo 12,45).
Talvez o nariz ou os olhos fossem
parecidos com os de Sua Mãe. Talvez. Mas o certo que os traços do rosto de
Jesus não seriam jamais esquecidos ou ignorados pelos cristãos da comunidade
primitiva. As paredes das catacumbas estão lá, para quem
quiser e puder ver: pinturas de santos – inclusive de Maria, ó que pecado! – e
personagens bíblicos para todo o lado.
Assim, não podemos
compreender a Bíblia sem considerar a Tradição da Igreja, que, desde os
primeiros séculos, entendeu que os ícones que representavam o Senhor, Maria e
os santos exprimiam de forma legítima a fé e a esperança do nosso povo. Não
custa lembrar o óbvio: a proibição do culto às imagens está diretamente
relacionada ao combate à adoração de outros deuses. Por isso, o mandamento que
condena a idolatria não se aplica no caso das imagens católicas, já que estas
nos remetem à glória do próprio Cristo. Os ícones católicos nos testemunham
sobre a vida de personagens reais e históricos (e não imaginários, como os ídolos), que dedicaram sua vida ao Senhor.
A relação dos
católicos com as imagens de Jesus e dos santos é comparável à que qualquer
pessoa tem com a fotografia das pessoas amadas. Quando olhamos a
imagem de alguém importante para nós, a afeição se projeta; trazemos as fotos
com carinho na carteira, colocamos em um canto de destaque na sala, beijamos o
papel inerte quando a saudade aperta… E ninguém, por mais imbecil que seja,
faria algum comentário infeliz aludindo a “idolatria”.
Pra encerrar, digo que este post não
tem o objetivo de fornecer munição para que você, católico, possa se justificar
quando te “crenticarem”. Não vale a pena gastar a saliva (a não ser nos raros
casos em que há a possibilidade de um diálogo honesto e objetivo). O papo aqui
é mesmo para nos ajudar a compreender as raízes da nossa própria
identidade. Assim, sabendo quem nós somos e porque nós somos, nos tornamos mais capazes de
viver a nossa fé de forma alegre, livre e consciente.
Por isso, se alguém vier lhe chamar de
idólatra, não discuta. Manda o cara falar
com a sua mão.
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Fonte: O Catequista
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