Há poucos dias, acompanhamos Jesus ao Monte da
Quarentena. Escolhemos permanecer com Ele, fizemos a opção por viver este tempo
privilegiado do encontro com Deus, chamado Quaresma. Conduzidos pelo Espírito
Santo, procuramos superar todas as provas e caminhar com fidelidade na resposta
à verdade do amor infinito e eterno de Deus, iluminados pela Palavra de
Deus.
Ao convite da Igreja, subimos agora a outro Monte,
o Tabor, pois o Espírito quer conduzir-nos às alturas e queremos aprender a
ouvir Jesus: "Uns oito dias depois destas palavras, Jesus levou
consigo Pedro, João e Tiago, e subiu à montanha para orar. Enquanto orava, seu
rosto mudou de aparência e sua roupa ficou branca e brilhante. Dois homens
conversavam com ele: eram Moisés e Elias. Apareceram revestidos de glória e
conversavam sobre a saída deste mundo que Jesus iria consumar em Jerusalém.
Pedro e os companheiros estavam com muito sono. Quando acordaram, viram a
glória de Jesus e os dois homens que estavam com ele. E enquanto esses homens
iam se afastando, Pedro disse a Jesus: 'Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos
fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias'. Nem
sabia o que estava dizendo. Estava ainda falando, quando desceu uma nuvem que
os cobriu com sua sombra. Ao entrarem na nuvem, os discípulos ficaram cheios de
temor. E da nuvem saiu uma voz que dizia: 'Este é o meu Filho, o Eleito.
Escutai-o!' Enquanto a voz ressoava, Jesus ficou sozinho. Os discípulos ficaram
calados e, naqueles dias, a ninguém contaram nada do que tinham visto" (Lc
9, 28-36).
Entretanto, sabemos que o caminho feito com Jesus
nos conduzirá a outro Monte, o do Calvário, o Monte da Redenção, da Morte e
Ressurreição de Cristo, pelo que queremos refazer a nossa escolha de seguimento
do Senhor Jesus. "Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome
sua cruz, cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar sua vida a perderá, e
quem perder sua vida por causa de mim a salvará. Com efeito, de que adianta a
alguém ganhar o mundo inteiro, se vier a perder-se e a arruinar a si mesmo?”
(Cf. Lc 9, 23-27; Cf. Lc 9, 44-45; Cf. Lc 18, 31-34).
Outros montes foram galgados por Jesus, como aquele
do “Sermão da Montanha”, ou os lugares procurados por ele para a oração. Havia
muito tempo, em que montes cujos nomes a Escritura indica como lugares do
encontro com Deus, tinham se tornado referência para o povo da aliança: Horeb,
Sinai, Carmelo e daí por diante. De monte em monte, percorremos também nós os
caminhos da fé, para chegar juntos à manhã da Ressurreição e fazer-nos
anunciadores do mistério de Cristo, pela palavra e pelo testemunho.
Entretanto, acolhamos o convite de Jesus,
fazendo-nos companheiros de Pedro, Tiago e João, para testemunhar, quase que
furtivamente, o episódio da Transfiguração. Quem se sentir discípulo, venha
conosco!
Subiram ao Tabor para rezar! Não se pode pretender
um contato com Deus quando não se compromete a própria liberdade, aceitando um
relacionamento pessoal com ele. A passividade não conduz a Deus! Discípulos se
fizeram aqueles três, malgrado sua história e seus defeitos pessoais, mas se
decidiram a subir à montanha. A planície do acomodamento não lhes sustentava a
vida!
A montanha tem o tamanho que tem! Quem conhece o
lugar, que a tradição identificou no Tabor, sabe que não se trata de píncaros
imensos, como outras partes do mundo podem oferecer. O tamanho do monte depende
da liberdade com que o coração humano se abre para Deus, e ele oferece os
desafios correspondentes à capacidade de cada um! Não eram os melhores, mas
certamente os escolhidos pelo amor do Senhor, que os tocou na profundidade da
aventura pessoal em que se lançaram.
Foram os três, unidos a Jesus! Fraternidade,
amizade, companheirismo, solidariedade, chamemos como quisermos. Trata-se de
caminhar juntos. Até hoje a visão das coisas de Deus deixa de ser turva quando
nos lançamos a viver como irmãos e irmãs, pois onde dois ou mais estão reunidos
em nome de Jesus, ele está presente (Cf. Mt 18,20).
Ao testemunhar o fato, vemos que os três foram
profundamente respeitados, ainda que sonolentos, carregados de humanidade,
pareciam juízes de acontecimentos inusitados, tanto que foram chamadas em causa
testemunhas qualificadas, Moisés e Elias, a Lei e os Profetas. O assunto do
diálogo sublime era a paixão do Senhor e sua glória futura. Deus se submete a
estruturas humanas, abaixando-se para elevá-los além da própria montanha! E os
três humildes pescadores viram a glória de Deus! Entraram na nuvem, sinal da
ação do Espírito Santo de Deus. Puderam entrever a vitória sobre o pecado e a
morte, cujo desenrolar lhes caberia, junto com outros discípulos, testemunhar e
anunciar até os confins da terra.
Tudo preparado! Ouviram então a voz do Pai: “Este é
o meu Filho, o Eleito. Escutai-o!”. Também nós desejaríamos ficar ali,
construir tendas, pois a experiência que fizeram se estende, como barracas
estendidas pelos montes da história, para acolher Jesus, Moisés, Elias, nós todos!
É bom estar com Deus, desfrutar a revelação da Trindade augusta, o Pai que
fala, o Espírito que nos envolve e o Filho amado, a ser ouvido e seguido, pelos
séculos afora, até a sua vinda gloriosa, no fim dos tempos.
Entretanto, não dá para permanecer no alto da
montanha. É preciso descer para a planície, para transformá-la de tal modo que
sejam superadas todas as depressões físicas, emocionais ou espirituais que se
apresentarem, para que tudo se transforme nas alturas da comunhão com Deus! É a
riqueza de nossa vida cristã, desfrutada na graça da Quaresma!
Dom Alberto
Taveira Corrêa
Arcebispo de
Belém do Pará
Nenhum comentário:
Postar um comentário