O Papa Bento XVI ensinou, certa feita, que “uma
obra de arte pode abrir os olhos da mente e do coração, impelindo-nos rumo ao
alto”. Foi justamente o que aconteceu com Osamu Tanimoto. Filho de um
engenheiro elétrico e de uma dona de casa, esse artista japonês descobriu a Fé
enquanto estudava as obras clássicas do Renascimento, em Florença – e se tornou
parte de um movimento global de artistas que estão redescobrindo a Igreja
Católica.
Confira a seguir trechos de uma entrevista
exclusiva concedida por esse jovem pintor ao site Regina Magazine.
O primeiro
contato com a arte
Osamu, conte-nos sobre a sua vida no Japão e sobre
a relação da sua família com as artes.
Fui criado em Tóquio, o caçula de três irmãos. Meu
pai era professor de engenharia elétrica e minha mãe, dona de casa. Meu irmão
mais velho é consultor e o outro trabalha em um banco. Minha família não tinha
nada a ver com artes. Meu pai, principalmente, não entendia por que eu perdia
meu tempo com isso… Era a impressão que ele tinha, até um dia ele perceber que
as artes valiam a pena. Não posso culpá-lo por nada, porque toda a arte
contemporânea confunde as pessoas e faz com que elas questionem se, afinal, os
artistas não são apenas pessoas “fora da caixa” sem qualquer habilidade ou
virtude. Eles não parecem pessoas à procura da verdade e da beleza.
Ainda que desde jovem eu fosse sempre entusiasmado
com a arte, estudei educação na Universidade de Waseda, em Tóquio, para fazer a
vontade do meu pai, que não queria que eu seguisse a carreira de artista.
Depois, mudei-me para a Temple University, para
tentar estudar fora e seguir seriamente a profissão artística. Lá, encontrei
meu primeiro professor de pintura a longo prazo, Walderedo, que retratou as
florestas amazônicas e os americanos nativos. Comecei a reproduzir
obras-primas, com as mesmas técnicas que eram utilizadas antigamente, como o
afresco, a têmpera de ovo, a ponta de prata etc. No mesmo ano, entrei na nova
Academia Russa de Arte, em Florença, para estudar desenho, pintura e
composição. Fui treinado na tradição acadêmica russa e graduei-me em 2014 com o
meu trabalho de conclusão The Return of the Prodigal Son (“O Retorno do Filho
Pródigo”). Hoje, trabalho como professor na Escola de Arte Sacra, desde 2013.
O primeiro
contato com a Fé
Vim a Florença atraído pela harmonia das obras
renascentistas. Depois de copiar as pinturas de Rafael e de Fra Angelico,
descobri que o que fazia bonitas aquelas obras não era simplesmente a técnica,
mas a espiritualidade por trás delas.
Aqui, tive a graça de conhecer o escultor irlandês
Dony MacManus, que depois se tornou meu padrinho. Foi ele quem me introduziu na
história de Jesus Cristo, o homem que era Deus – não como um pregador, mas como
um amigo. Muitas coisas que Jesus dizia eram surpreendentes e controversas, e o
que a Igreja ensinava me parecia ir contra a corrente. Mas, do fundo do meu
coração, eu via que essas coisas estavam certas.
A que você se refere?
Refiro-me a como a Igreja enxerga a relação entre o
homem e a mulher no contexto do matrimônio, a como a razão e a fé dão as mãos
uma à outra e caminham juntas. O que mais me impressionou e inquietou foi o
mistério da Ressurreição. O fato de que qualquer sofrimento valeria a pena e,
levado com fé, não deveria apagar a minha esperança, virou todo o meu mundo de
ponta cabeça.
No Japão, eu era completamente alheio ao
cristianismo. A religião cristã não é algo grande em meu país e, além disso, a
sociedade é muito secularizada. Em Tóquio, por exemplo, as pessoas simplesmente
nunca ouviram falar de Jesus Cristo. De alguma forma, isso me ajudou, porque,
pelo menos, eu não tinha nada contra a Igreja quando escolhi (ou fui escolhido
para) ser batizado.
Como a sua família reagiu à sua conversão?
Embora meus familiares não sejam religiosos –
provavelmente têm alguma influência cultural do budismo e do xintoísmo –, eles
respeitaram bem a minha escolha de conversão. O fato de minha tia também ser
uma convertida pode tê-los ajudado a entender a minha decisão. Hoje, sou feliz
que eles vejam e se alegrem com minhas pinturas – especialmente “O Retorno do
Filho Pródigo” –, ainda que não sejam cristãos.
A arte sacra
como caminho de conversão
Para você, então, a arte foi um caminho para
entender a doutrina cristã?
Sim. Todos aqueles corpos representados na arte
sacra me ajudaram a entender o conceito de “Encarnação”. Os corpos são templos
do Espírito Santo (cf. 1 Cor 6, 19) e o mais belo e nobre projeto criado por
Deus.
A Capela Sistina, de Michelangelo, só faz sentido
porque celebra a beleza do corpo humano no seu contexto espiritual. É claro
que, depois de minha conversão oficial, cinco anos atrás, minha conversão ainda
continua. Agora, eu crio obras de arte imitando basicamente a Deus, e isso me
faz amadurecer na fé, porque, quando eu pinto um tema religioso, eu rezo mais.
Para mim, a virtuosidade na arte e na vida crescem lado a lado.
A arte sacra foi a minha porta de entrada nos
mistérios da fé. Ela tocou o meu coração e elevou a minha alma com a sua
harmonia. Por exemplo, a “Anunciação”, de Pontormo, o modo como o anjo se
aproxima, e a doçura da expressão, da postura e das cores de Maria… Dentro
dessa linguagem natural das obras de arte, abre-se todo um mundo sobrenatural.
Essas pinturas e esculturas, mais do que científicas, são espirituais.
Posso dizer que eu era como o analfabeto na Idade
Média – geralmente, eu via as imagens do Evangelho primeiro e só depois lia a
passagem e entendia a história. Provavelmente, por entender as coisas
visualmente, a arte cristã desempenhou um papel maior em ajudar-me a conhecer os
Evangelhos.
A arte sacra
como profissão
Você diz que a sua vocação como artista é “traduzir
o Evangelho para a arte de hoje”. Quais cenas da Bíblia você tem interesse em
pintar?
Quero pintar quantas eu conseguir, uma por uma. A
ressurreição da filha de Jairo é um episódio importante para mim porque também
é uma história de conversão. Jesus a ressuscitou dos mortos. Ele fez o milagre.
Essa é exatamente a experiência que eu tive quando me converti e é essa a
beleza que eu quero comunicar. Também há outras realidades envolvidas nessa
cena, como a surpresa dos discípulos e a alegria dos seus pais…
Você parece ter gastado um bom tempo pensando
nisso…
Para mim, também é importante comunicar a
extraordinariedade do evento. É claro, os discípulos tinham confiado no que
Jesus estava dizendo e fazendo, mas a reação deles deve ter sido extremamente
humana, simples e espontânea. A alegria dos pais da menina deve ter sido o
máximo. Vale a pena visualizar especialmente esses aspectos emocionais em torno
de Jesus. Eu espero que eles falem ao homem de hoje, aos que querem “ver para
crer”, como o Apóstolo Tomé quis ver Jesus e tocá-Lo, antes de acreditar que a
Sua ressurreição era verdadeira.
A vida como
católico em Florença
Como você leva a sua vida hoje, sendo um católico
expatriado em Florença?
Estou vivendo em Florença há seis anos e meio. A
melhor parte é que há tantas igrejas na cidade, e tantas delas bonitas, que eu
posso escolher a qual Missa ir e no horário que quiser.
Ainda que alguns florentinos pratiquem a fé e
outros não, a maioria está culturalmente familiarizada com os valores da
doutrina da Igreja no cotidiano, como a caridade, a hospitalidade etc. As
pessoas estão acostumadas a compartilhar as coisas e isso é bonito. Ao mesmo
tempo, a sociedade de Florença é construída em uma ordem hierárquica bem rígida
e há uma mentalidade legalista fortemente presente. Apesar disso, de alguma
forma, aqui eu me sinto em casa, por causa da minha conversão à Fé.
Toda vez que eu vejo o afresco de Vasari na cúpula
da Catedral de Santa Maria del Fiore, eu me lembro do meu batismo. Sei que, na
prática, essa não é a minha casa, sou um estrangeiro e sempre serei. Eu me
pergunto, porém, onde era a casa de Jesus. Nazaré ou a casa do Seu Pai?
Certamente, também lá é o meu lugar.
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Catholicus
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