No livro
do Gênesis encontramos a história da criação do mundo e dos seres viventes. Diz
o Gênesis que "O Senhor Deus formou, pois, o homem do barro da terra, e
inspirou-lhe nas narinas um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente"
(Gn 2,7).
Neste
versículo encontramos a primeira prova da natureza dualística do homem: a carne
formada “do barro da terra” e seu espírito que é "um sopro de vida".
Somente depois de dadas as duas coisas, diz o Gênesis que "o homem se
tornou um ser vivente".
Com
efeito, sopro em hebraico é "nashamah". É a mesma palavra usada no
Deuteronômio onde lemos: "Quanto às cidades daqueles povos cuja possessão
te dá o Senhor, teu Deus, não deixarás nelas alma viva [nashamah]" (Dt
20,16). Ver também 1 Reis 15,29.
Muitos
são os exemplos na Escritura onde "nashmah" denota claramente o
espírito que Deus deu ao homem, infiltrado no corpo humano através das suas
narinas (cf. Gn 2,7) no momento da criação.
A
inteligência da alma
Não é por
acaso que a Psicologia estuda as faculdades intelectuais humanas. A palavra que
no português conhecemos por "alma" não existe no hebraico.
"Alma" vem do grego "psychein" que significa
"soprar". Deste verbo grego vem a palavra "psique" que
significa "sopro", que é raiz da palavra "psicologia".
A
etimologia da palavra "psicologia" nos remete à inteligência presente
no espírito humano ("sopro"), pela qual recebemos nossas faculdades
intelectuais.
Com
efeito, a própria Revelação de Deus mostra que é pelo seu espírito que o homem
possui inteligência, conforme vimos em Prov 20,27. A mesma verdade encontramos
em Jó: "mas é o Espírito de Deus no homem, e um sopro [nashmah] do
Todo-poderoso que torna inteligente" (Job 32,8).
Embora as
faculdades do corpo como tato, olfato, audição e visão sejam responsáveis pela
nossa interação com o mundo, é pelo espírito que temos inteligência; é dele que
vem a nossa razão.
Por isso,
sobre o espírito humano escreveu Salomão: "O espírito [nashamah] do homem
é uma lâmpada do Senhor: ela penetra os mais íntimos recantos das
entranhas" (Prov 20,27).
Concordando
com Salomão, São Paulo ao escrever aos Romanos faz a relação entre espírito e
razão: "Assim, pois, de um lado, pelo meu espírito, sou submisso à
lei de Deus; de outro lado, por minha carne, sou escravo da lei do
pecado" (Rm 7,26).
As
referências acima provam que o espírito humano é dotado de faculdades
intelectuais.
A
consciência dos mortos
Os psicopaniquianos
negam a existência da alma. Para eles, homem é como um animal, sem alma,
diferindo deste por possuir um cérebro mais evoluído (responsável pelas
faculdades intelectuais) e também porque irá ressuscitar no dia do Juízo Final.
Como vimos, tal tese é fortemente discordante dos ensinamentos bíblicos sobre o
espírito humano.
Há
aqueles que acreditam na existência da dualidade humana (espírito e corpo
material), mas que ensinam que após a morte, a alma humana está sem
consciência, pelo fato de lhe faltar o corpo que lhe comunicam os sentidos.
Primeiramente,
como já dissemos, os sentidos comunicam o mundo material com o espírito humano.
As faculdades intelectuais da alma independem do corpo. É por esta razão, que a
Igreja Católica se opõe à morte dos anacéfalos (crianças que nascem sem
cérebro), pois o homem não pode ser reduzido ao corpo, embora sem ele não
esteja completo.
Os
defensores do sono da alma apresentam os seguintes textos para defender sua
tese:
"Enquanto
[Jesus] ainda falava, chegou alguém da casa do chefe da sinagoga, anunciando:
Tua filha morreu. Para que ainda incomodas o Mestre? Ouvindo Jesus a notícia
que era transmitida, dirigiu-se ao chefe da sinagoga: Não temas; crê somente. E
não permitiu que ninguém o acompanhasse, senão Pedro, Tiago e João, irmão de
Tiago. Ao chegar à casa do chefe da sinagoga, viu o alvoroço e os que estavam
chorando e fazendo grandes lamentações. Ele entrou e disse-lhes: Por que todo
esse barulho e esses choros? A menina não morreu. Ela está dormindo"
(Mc 5,35-39) (grifos meus).
"Chegando
à casa do chefe, Jesus viu os tocadores de flauta e a multidão agitada, e
disse: “Retirai-vos! A menina não morreu; ela dorme”. Mas eles zombavam dele. Afastada
a multidão, ele entrou, pegou a menina pela mão, e ela se levantou". (Mt 9,23-25).
E
acrescentou ainda: “Nosso amigo Lázaro está dormindo. Mas, eu vou acordá-lo”. Os
discípulos disseram: “Senhor, se está dormindo, vai ficar curado”. Jesus falava
da morte de Lázaro, mas os discípulos pensaram que ele estivesse falando do
sono mesmo. Jesus então falou abertamente: “Lázaro morreu! (Jo 11,11-14).
Ora,
todos hão de concordar que a Sagrada Escritura é coesa em seu ensinamento
doutrinal, embora sua letra muitas vezes se apresente contraditória aos olhos
humanos. Porém essa contradição é aparente, normalmente quando o texto é lido
fora de seu contexto.
É o
próprio Cristo que numa parábola ensina que as almas dos falecidos não estão
dormindo:
"Havia
também um mendigo, por nome Lázaro, todo coberto de chagas, que estava deitado
à porta do rico. Ele avidamente desejava matar a fome com as migalhas que caíam
da mesa do rico... Até os cães iam lamber-lhe as chagas. Ora, aconteceu morrer
o mendigo e ser levado pelos anjos ao seio de Abraão. Morreu também o
rico e foi sepultado. E estando ele [o rico] nos tormentos do inferno,
levantou os olhos e viu, ao longe, Abraão e Lázaro no seu seio. Gritou, então:
- Pai Abraão, compadece-te de mim e manda Lázaro que molhe em água a ponta de
seu dedo, a fim de me refrescar a língua, pois sou cruelmente atormentado
nestas chamas. Abraão, porém, replicou: - Filho, lembra-te de que recebeste
teus bens em vida, mas Lázaro, males; por isso ele agora aqui é consolado, mas
tu estás em tormento. Além de tudo, há entre nós e vós um grande abismo, de
maneira que, os que querem passar daqui para vós, não o podem, nem os de lá
passar para cá. O rico disse: - Rogo-te então, pai, que mandes Lázaro à casa de
meu pai, pois tenho cinco irmãos, para lhes testemunhar, que não aconteça
virem também eles parar neste lugar de tormentos. Abraão respondeu: -
Eles lá têm Moisés e os profetas; ouçam-nos! O rico replicou: - Não, pai
Abraão; mas se for a eles algum dos mortos, arrepender-se-ão. Abraão
respondeu-lhe: - Se não ouvirem a Moisés e aos profetas, tampouco se deixarão
convencer, ainda que ressuscite algum dos mortos " (Lc 16,20-31) (grifos
meus).
Conforme
o ensinamento do Senhor, aqueles que morrem na amizade de Deus são levados
"pelos anjos ao seio de Abraão", isto é, para o lugar dos justos.
Enquanto os que morreram na inimizade de Deus estão "nos tormentos do
inferno".
O diálogo
que há entre Abraão, Lázaro e o rico, mostra a consciência das almas após a
morte, caso contrário não estariam dialogando!
Devemos
nos lembrar que Jesus após a morte foi pregar o Evangelho às pessoas que
morreram no tempo de Noé:
"Pois
também Cristo morreu uma vez pelos nossos pecados - o Justo pelos injustos -
para nos conduzir a Deus. Padeceu a morte em sua carne, mas foi vivificado
quanto ao espírito. É neste mesmo espírito que ele foi pregar aos espíritos que
eram detidos no cárcere, àqueles que outrora, nos dias de Noé, tinham sido
rebeldes, quando Deus aguardava com paciência, enquanto se edificava a arca, na
qual poucas pessoas, isto é, apenas oito se salvaram através da água" (1Pe
3,18-20).
Ora, se a
alma não existe ou está dormindo não faria o menor sentido Jesus ir pregar para
elas, já que segundo nossos contendores, o homem após a morte só pode esperar a
ressurreição. Temos provas da consciência dos mortos também em Ap 6,9-11 e Ap
20,4.
Infortúnio
dos ímpios ou sono da alma?
Os
adeptos do sono da alma ou da inconsciência dos mortos fundamentam sua tese
principalmente nos versículos do Eclesiástico: "Com efeito, os vivos sabem
que hão de morrer, mas os mortos não sabem mais nada; para eles não há mais
recompensa, porque sua lembrança está esquecida" (Ecl 9,5), ou ainda
"Tudo que tua mão encontra para fazer, faze-o com todas as tuas
faculdades, pois que na região dos mortos, para onde vais, não há mais
trabalho, nem ciência, nem inteligência, nem sabedoria" (Ecl 9,10). Para
eles estes versículos são prova da inconsciência dos mortos.
Primeiramente,
o livro do Eclesiastes trata da reflexão sobre a instabilidade da vida humana e
a dúvida sobre o destino tanto dos justos quanto dos ímpios. Com efeito, o
assunto tratado neste livro só encontra seu termo no livro da Sabedoria de
Salomão, e sem este, o Eclesiastes está incompleto. Assim como a Revelação do
Pentateuco encontra seu termo nos livros do tempo dos Juízes (Josué, Juízes, 1
e 2 Samuel), o Livro da Sabedoria vem completar o que o Eclesiastes introduziu,
mas que deixou em aberto.
O Livro
da Sabedoria não se encontra nas Bíblias protestantes, isto limita a exposição
da Verdade, já que escrevemos não só para católicos e ortodoxos (que aceitam
como sagrado este livro), mas para todos os cristãos. Porém, isso não impede
nosso trabalho. Pois, assim como os vegetarianos privam seu corpo de certas
proteínas por causa de sua abstenção voluntária de carne, mas ainda sim podem
ser nutridos por causa das vitaminas presentes nos vegetais; da mesma forma,
ainda é possível expormos a Verdade através dos livros consensualmente aceitos.
Melhor seria se todos aceitassem todas as fontes de alimento dispostas pelo
Senhor, seja espiritual quanto material.
Em
segundo lugar, a região dos mortos tratada no livro do Eclesiastes não é o
lugar para onde se destinam todos os mortos, mas somente os ímpios. Tal é o
testemunho do salmista: “Minha alma está muito perturbada; vós, porém, Senhor,
até quando?... Voltai, Senhor, livrai minha alma; salvai-me, pela vossa
bondade. Porque no seio da morte não há quem de vós se lembre; quem vos
glorificará na habitação dos mortos?" (Sl 6,3-6).
Aqui o
salmista pede a salvação de Deus (“livrai minha alma, salvai-me”), pois não deseja
ter o mesmo destino dos ímpios, que estão longe de Deus e por estarem longe,
não podem se lembrar do Senhor e nem glorificá-lo, pois já estão perdidos.
Este
mesmo ensino é confirmado em outro salmo: "Acaso vossa bondade é exaltada no
sepulcro, ou vossa fidelidade na região dos mortos? Serão nas
trevas manifestadas as vossas maravilhas, e vossa bondade na terra do
esquecimento?" (Sl 87,12-13). Como se vê, a “região dos mortos” na
Escritura trata do destino dos ímpios (cf. Sl 9,18; Sl 30,18; Sl 54,16; Sl
87,4; Pr 5,1-5).
Mas,
outro é o destino dos justos, conforme nos ensina Salomão: "O sábio escala
o caminho da vida, para evitar a descida à morada dos mortos" (Pr
15,24) ou ainda: "Não poupes ao menino a correção: se tu o castigares com
a vara, ele não morrerá, castigando-o com a vara, salvarás sua vida da
morada dos mortos" (Pr 23,13-14).
Ora, se o
justo após a morte não vai para a "região dos mortos" ou "morada
dos mortos" para onde vai? Trataremos disto mais à frente, pois antes é
preciso expor o que significa o "sono" dos mortos do qual se referiu
Jesus (cf. Mc 5,35-39; Mt 9,23-25; Jo 11,11-14).
Bem-aventurança
dos justos
Quando a
Escritura diz que alguém que morreu está dormindo, ou descansando, está se
referindo à bem-aventurança alcançada por ter morrido na amizade de Deus, e não
porque a alma esteja dormindo.
Na
linguagem semítica utilizada pela Bíblia, o prêmio daqueles que permanecem
fiéis a Deus é comparado a um descanso.
Os
israelitas passaram 40 anos no deserto, após o Senhor tê-los libertado do
cativeiro no Egito. Devido à grande murmuração do povo, nem todos chegaram à
Terra Prometida. É o que recorda o Salmista:
"Não
vos torneis endurecidos como em Meribá, como no dia de Massá no deserto, onde
vossos pais me provocaram e me tentaram, apesar de terem visto as minhas obras.
Durante quarenta anos desgostou-me aquela geração, e eu disse: É um povo de
coração desviado, que não conhece os meus desígnios. Por isso, jurei na minha
cólera: Não hão de entrar no lugar do meu repouso" (Sl 94,8-11).
Também
ensinou Isaías: "Aquele que à direita de Moisés atuou com o seu braço
glorioso, e dividiu as águas diante dos seus para assegurar-se um renome
eterno; e os conduziu através dos abismos, sem tropeçarem, como o cavalo em
descampado. Como ao animal que desce ao vale, o espírito do Senhor os levava
ao repouso. Foi assim que conduzistes vosso povo, para afirmar vosso
glorioso renome" (Is 63,12-14).
O início
desta teologia se encontra em Deuteronômio: "Quando tiverdes passado o
Jordão e vos tiverdes estabelecido na terra que o Senhor, vosso Deus, vos dá em
herança, e ele vos tiver dado repouso, livrando-vos dos inimigos que vos
cercam, de sorte que vivais em segurança" (Dt 12,10).
O povo
chegou ao Jordão pelo comando de Josué, sucessor de Moisés. Moisés foi proibido
de entrar na Terra Prometida por ter quebrado as primeiras tábuas dos Dez
Mandamentos (cf. Ex 32,19; Dt 32,50-52; Dt 34,1-4).
Josué,
testemunha em seu livro o cumprimento da promessa do Senhor: "E o Senhor deu-lhes
repouso em todo o derredor de sua terra, como tinha jurado a seus pais;
nenhum dos seus inimigos pôde resistir-lhes, pois o Senhor entregou-os todos
nas suas mãos" (Js 21,44).
A
peregrinação que os Israelitas fizeram no deserto durante 40 anos e a posse da
Terra Prometida dada aos fiéis é figura da nossa peregrinação terrestre, na
qual os que vencerem tomarão posse da Pátria do Povo de Deus, isto é, o Céu.
Este é o
ensinamento que encontramos na Carta aos Hebreus:
"Se,
pois, ele repete: Não entrarão no lugar do meu descanso [cf. Sl 94,11], é sinal
de que outros são chamados a entrar nele. E como aqueles a quem primeiro foi
anunciada a promessa não entraram por não ter tido a fé, Deus, após muitos
anos, por meio de Davi, estabelece um novo dia, um hoje, ao pronunciar as
palavras mencionadas: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos
corações. Se Josué lhes houvesse dado repouso, não teria depois disso falado
dum outro dia. Por isso, resta um repouso sabático para o povo de Deus.
E quem entrar nesse repouso descansará das suas obras, assim como descansou
Deus das suas. Assim, apressemo-nos a entrar neste descanso para não
cairmos por nossa vez na mesma incredulidade. Porque a palavra de Deus é viva,
eficaz, mais penetrante do que uma espada de dois gumes e atinge até a divisão
da alma e do corpo, das juntas e medulas, e discerne os pensamentos e intenções
do coração" (Hb 4,5-12).
O autor
chama o prêmio dos justos de "repouso sabático" pois o compara com o
descanso de Deus após a criação, que se deu num sábado.
A Carta
aos Hebreus, além de confirmar que o sono, repouso ou descanso dos justos é a
posse da bem-aventurança, também dá testemunho da realidade dualística do
homem: alma e corpo.
O
ensinamento desta epístola é confirmado pelo salmista: "Apenas me deito,
logo adormeço em paz, porque a segurança de meu repouso vem de vós só,
Senhor" (Sl 4,9).
Também
ensinou o Profeta Isaías: "Porque aqui está o que disse o Senhor Deus, o
Santo de Israel: É na conversão e na calma que está a vossa salvação; é no
repouso e na confiança que reside a vossa força" (Is 30,15).
Por isso
que Jesus ao ressuscitar a filha do centurião (Mc 5,35-39), a filha do chefe da
sinagoga (Mt 9,23-25) e Lázaro (cf. Jo 11,11-14), diz que estão dormindo,
pois morreram na amizade de Deus. Se fossem ímpios Jesus não os
ressuscitaria, pois já estariam perdidos. Mas, antes mortos e agora
ressuscitados, serviriam como testemunhas da Majestade de Jesus, tanto por
terem visto o Céu quanto por serem ressurretos.
O destino
do espírito após a morte do corpo
Veja o
que ensina o Salmo: "Este é o destino dos que estultamente em si confiam,
tal é o fim dos que só vivem em delícias. Como um rebanho serão postos no
lugar dos mortos; a morte é seu pastor e os justos dominarão sobre eles.
Depressa desaparecerão suas figuras, a região dos mortos será sua morada.
Deus, porém, livrará minha alma da habitação dos mortos, tomando-me
consigo" (Sl 48,14-16).
Como
vimos o Salmo ensina que o justo é tomado por Deus, isto é, seu destino é o Céu.
Interessante
é também notar que aqueles que citam os versículos 5 e 10 do capítulo 9 do
Eclesiástico, parece que não terminaram de ler esse livro. Com efeito, no
último capítulo encontramos a confirmação do ensinamento do salmo 48: "E o
pó volte à terra, como era, e o espírito volte a Deus que o deu"
(Ecl 12,7).
Vimos no
Gênesis que Deus formou Adão do pó da terra e depois lhe deu o espírito.
Segundo o Eclesiastes, o corpo dos mortos (pó) volta à terra e o espírito vai
para Deus.
Jesus na
parábola do Lázaro e do rico (cf. Lc 16,20-31) ensina que o justo é
levado à presença de Deus pelos anjos, enquanto o ímpio é jogado no inferno.
Estamos falando do espírito humano, pois os dois ressuscitarão no Dia do Senhor
(volta de Cristo); o primeiro para a Glória Eterna, o segundo para o Castigo
Eterno.
"Mas,
cheio do Espírito Santo, Estêvão fitou o céu e viu a glória de Deus e Jesus de
pé à direita de Deus: Eis que vejo, disse ele, os céus abertos e o Filho do
Homem, de pé, à direita de Deus. Levantaram então um grande clamor,
taparam os ouvidos e todos juntos se atiraram furiosos contra ele. Lançaram-no
fora da cidade e começaram a apedrejá-lo. As testemunhas depuseram os seus
mantos aos pés de um moço chamado Saulo. E apedrejavam Estêvão, que orava e dizia:
Senhor Jesus, recebe o meu espírito" (At 7,55-59).
Com
efeito, Santo Estêvão sabia que seu espírito não estaria dormindo após sua
morte, mas que seria levado a Deus.
São Paulo
também ensinou que os espíritos dos justos estão na presença de Deus:
"Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos deste corpo
para ir habitar junto do Senhor. É também por isso que, vivos ou
mortos, nos esforçamos por agradar-lhe" (2 Cor 5,8-9).
Como
poderiam os justos esforçarem-se para agradar a Deus após a morte se estivessem
dormindo? Ou ainda, como poderiam ausentar-se do corpo e "ir habitar junto
do Senhor" se o espírito dos justos não voltassem para Deus que os deu
(cf. Ecl 12,7)?
Testemunhos
Primitivos
Agora
traremos à tona a Memória Cristã, transcrevendo alguns testemunhos primitivos
sobre a Fé recebida dos Apóstolos sobre a consciência dos mortos.
“Portanto,
supliquemos também nós pelos que se encontram em alguma falha, a fim de que
lhes sejam concedidas moderação e humildade, e para que cedam, não a nós, e sim
à vontade de Deus. Então, quando nos lembrarmos deles com espírito de
misericórdia diante de Deus e dos santos, nossa oração produzirá frutos e será
perfeita [...]” (Primeira Carta de Clemente aos Coríntios, 56. São
Clemente, Papa. 90 d.C) (grifos meus).
São
Clemente foi discípulo pessoal de São Paulo (cf. Fl 4,3) e o terceiro sucessor
de São Pedro, no Episcopado da Igreja de Roma. Ora, se para os primeiros
cristãos os justos estivessem dormindo, ele não pediria aos fiéis para
apresentarem suas orações diante de Deus e dos santos.
“Meu
espírito se sacrifica por vós, não somente agora, mas também quando eu
chegar a Deus [...]” (Carta ao Tralianos, 13. Santo Inácio, Bispo de
Antioquia. 107 d.C).
Santo
Inácio foi discípulo pessoal de Pedro e Paulo. Era também chamado pelos antigos
cristãos de Teósforo, que significa "Carregado por Deus", por ser a
criança que Cristo pega no colo em Mc 9,36. Com efeito, se os Apóstolos Pedro e
Paulo tivessem ensinado a Inácio que os mortos “dormem”, ele não acreditaria
que os justos estão diante de Deus intercedendo pelos que ainda não completaram
o caminho da vida (cf. Ap 6,9-11; Ap 20,4). Mas, ele não só crê, mas ensina que
quando chegar ao Céu estará ainda a serviço de Deus pelos que estão aqui na
terra.
"Portanto,
eu vos exorto a todos, para que obedeçais à palavra da justiça e sejais
constantes em toda a perseverança, que vistes com os próprios olhos, não só nos
bem-aventurados Inácio, Zózimo e Rufo, mas ainda em outros que são do vosso meio,
no próprio Paulo e nos demais apóstolos. Estejam persuadidos de que nenhum
desses correu em vão, mas na fé e na justiça, e que eles estão no lugar que
lhes é devido junto ao Senhor, com o qual sofreram. Eles não amaram este
mundo, mas aquele que morreu por nós e que Deus ressuscitou para nós"
(Segunda Carta aos Filipenses, 9. São Policarpo, Bispo de Esmirna. 160 d.C)
(grifos meus).
São
Policarpo foi discípulo pessoal de São João apóstolo e, segundo a Tradição,
instituído pelo próprio São João, Bispo de Esmirna (na Turquia). Assim como São
Clemente e Santo Inácio, São Policarpo, outro discípulo pessoal dos apóstolos
não ensinou o "sono da alma". Mas que após a morte os justos se
encontram "no lugar que lhes é devido junto ao Senhor".
“O Senhor
ensinou clarissimamente que as almas não só perduram sem passar de corpo em
corpo, mas conservam imutadas as características dos corpos em que foram
colocadas e se lembram das ações que fizeram aqui na terra e daquelas
que deixaram de fazer. É o que está escrito na história do rico e de Lázaro que
repousava no seio de Abraão. Nela se diz que o rico, depois da morte, conhecia
tanto Lázaro como Abraão e que cada um estava no lugar a ele destinado. O rico
pedia a Lázaro, ao qual tinha recusado até as migalhas que caíam de sua mesa,
que o socorresse; com a sua resposta, Abraão mostrava conhecer não somente
Lázaro, mas também o rico e ordenava que aqueles que não quisessem ir para
aquele lugar de tormentos escutassem Moisés e os profetas antes de esperar o
anúncio de alguém ressuscitado dos mortos. Tudo isso supõe
clarissimamente que: as almas permanecem vivas; não passam de corpo
em corpo; possuem as características do ser humano de sorte que podem ser
reconhecidas e que se recordam das coisas daqui de baixo; também Abraão
possuía o dom da profecia; e cada alma recebe o lugar merecido mesmo antes
do dia do juízo" (Contra as Heresias, II,34,1. Santo Ireneu, Bispo de
Lião. 202 d.C.).
Santo
Ireneu foi discípulo de São Policarpo. Com sua ortodoxia, ele combate de uma só
vez os erros da reencarnação, da inconsciência da alma e da negação do juízo
particular pelo qual todos passam logo após a morte.
Há muitos
outros testemunhos dos discípulos pessoais dos apóstolos, mas transcrevi aqui
as palavras daqueles que os antigos consideravam os mais importantes e fiéis à
Tradição dos Apóstolos.
Conclusão
A
pregação dos Apóstolos é o fundamento da nossa fé, conforme ensinou São Paulo:
"Consequentemente, já não sois hóspedes nem peregrinos, mas sois
concidadãos dos santos e membros da família de Deus, edificados sobre o
fundamento dos apóstolos e profetas, tendo por pedra angular o próprio
Cristo Jesus" (Ef 2,19-20).
As
Sagradas Letras são pedras que foram bem dispostas conforme a Arquitetura que
Cristo confiou a seus Apóstolos, resultando no edifício da Fé. Mas o inimigo
promove outro tipo de construção, convencendo muitas pessoas sinceras, pois
utiliza as mesmas pedras, porém, com planta diversa daquela deixada pelos
Apóstolos.
Ora, os
Apóstolos constituíram bispos no mundo inteiro, deixaram seus discípulos para
darem continuidade à sua obra. Com efeito, São Paulo ensinou: "Segundo a
graça que Deus me deu, como sábio arquiteto lancei o fundamento, mas outro
edifica sobre ele" (1 Cor 3,10).
Vimos que
os discípulos dos Apóstolos deram continuidade à obra de seus mentores,
fundamentando-se na Fé da consciência da alma e não no "sono" desta.
Este é o testemunho da Sagrada Escritura e da Memória Cristã.
Alessandro
Lima
________________________________
Fonte:
Veritatis Splendor (itálico nosso).
Disponível em: Católicos Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário