Depois das festas natalinas, inicia-se o Tempo
Comum, em que continuamos a viver os principais Mistérios da Salvação na
caminhada histórica da Igreja. O Evangelho deste Segundo Domingo do Tempo Comum
(Jo 2, 1-11) nos fala das Bodas de Caná. O motivo da escolha desse texto para
este domingo – o segundo depois da Epifania – é explicado na frase conclusiva:
Jesus, em Caná da Galiléia, deu início aos sinais e manifestou sua glória, e
seus discípulos creram Nele (Cf. Jo 2, 11).
Falar de bodas, casamento nos remete a vários
trechos bíblicos em que a comparação do povo eleito com Deus se faz como um
casamento, às vezes fiel e outros momentos infiel por parte do povo. Mas sempre
demonstrando a fidelidade do Senhor que vai em busca da esposa perdida.
O início dos sinais de Jesus, segundo João, é
justamente vir ao encontro do povo de Deus para restaurar a alegria da festa do
casamento simbolizada no vinho novo, que é melhor que o antigo. Aparece a
figura de Maria como mãe preocupada com a situação dos filhos e recomenda o
caminho do recomeço da aliança: “fazei tudo o que Ele disser”.
Corrobora com esse aspecto a primeira leitura deste
domingo (Is 62, 1-5) em que se conclui a perícope com a clareza dos esponsais
eternos: “assim como o jovem desposa a donzela, assim teus filhos te desposam;
e como a noiva é a alegria do noivo, assim também tu és a alegria do teu Deus”!
Esses dois textos do domingo (primeira leitura e o evangelho) se comentam entre
si e nos fala do amor de Deus por seu povo, e a necessidade de colocar em
prática o que Jesus, o Filho de Deus, nos coloca para que tudo se transforme na
vida do povo de Deus.
Merecem ser destacadas as palavras de Maria: “Eles
não têm mais vinho”; “Fazei o que Ele vos disser” (Jo 2, 3.5). Em ocasião de
festas, era costume que as mulheres amigas da família se encarregassem de
preparar tudo. A Virgem Maria, que presta a sua ajuda, percebe o que se passa.
Mas Jesus, seu Filho e seu Deus, está ali; acaba de iniciar-se o seu ministério
público. E ela sabe melhor que ninguém que o seu Filho é o Messias. E dá-se
então um diálogo cheio de ternura e simplicidade entre a Mãe e o Filho, que o
Evangelho nos relata: “A Mãe de Jesus disse-lhe: Não têm vinho”. Pede sem
pedir, expondo uma necessidade. E desse modo nos ensina a pedir.
“Em Caná, ninguém pede à Santíssima Virgem que
interceda junto de seu Filho pelos consternados esposos. Mas o coração de
Maria, que não pode deixar de se compadecer dos infelizes, impele a assumir,
por iniciativa própria, o ofício de intercessora e a pedir ao Filho o milagre.
Se a Senhora procedeu assim sem que lhe tivessem dito nada, que teria feito se
lhe tivessem pedido que interviesse?” (Santo Afonso Maria de Ligório). Que não
fará quando – tantas vezes ao longo do dia! – lhe dizem “rogai por nós”? Que
não iremos conseguir se recorremos a Ela?
Portanto, o Evangelho deste segundo domingo do
tempo comum, narra uma festa de casamento e não informa nada sobre o nome dos
noivos. O Evangelista tomou um fato histórico e deu-lhe um sentido espiritual e
teológico: o verdadeiro noivo é o Cristo, Deus em pessoa, que vem desposar sua
esposa, o povo de Israel e, mais precisamente, o novo Israel, a Igreja,
representada pela Mulher – a Virgem Maria! Tudo, na perícope do Evangelho, fala
disso: porque o Messias-Esposo chegou, a água da Antiga Aliança (água da
purificação segundo os ritos judaicos da Lei de Moisés) é transformada no vinho
da Nova Aliança (o vinho, símbolo da alegria e da exultação do Espírito Santo,
que é fruto da morte e ressurreição do Senhor). É esta a glória que Jesus
manifestou, é este o sinal! “Sinal” não é um simples milagre; “sinal” é um
gesto do Senhor Jesus carregado de sentido profundo, que revela Sua pessoa, Sua
missão e Sua obra de salvação.
Também nós hoje temos necessidade, neste ano do
jubileu da misericórdia, de escutarmos o Senhor que nos manda a ter atitudes
simples (como encher as vasilhas com água) para fazer grandes maravilhas neste
nosso necessitado tempo (o vinho novo).
Cardeal
Orani João Tempesta
Arcebispo de
São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)
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