O sucesso, em 2015, da campanha na Irlanda pelo reconhecimento legal das uniões homossexuais
como equivalentes ao casamento natural gerou grande excitação entre os
defensores deste conceito no resto do mundo (ocidental, pelo menos).
A união homossexual, porém, não é a única forma de relacionamento que pretende ser equiparada ao matrimônio natural. Há uma longa fila de “amores” aguardando reconhecimento social e, nessa lista de espera, encontramos o assim chamado “poliamor”.
Na própria Irlanda, uma ex-participante do reality show Big Brother, chamada Jade-Martina Lynch, assumiu e explicou assim a sua vivência do “poliamor”: “A minha alma é tão livre que eu não poderia manter um relacionamento monogâmico”.
Uma definição divulgada pelo grupo californiano Saturnia Regna define o “poliamor” como “muitos amores ou um amor compartilhado entre muitas pessoas. A palavra tem sido usada pelo menos desde o início do século XX para descrever a escolha de amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Esta forma responsável de não-monogamia não implica clandestinidade nem traição. O poliamor consiste em acordos mútuos com pessoas que você ama, mantendo tudo aberto e tratando as pessoas amadas de uma forma ética, consensual e comprometida”.
A palavra-chave nesta descrição é “não-monogamia”, ou seja, a manutenção estável de envolvimento sexual com mais de uma pessoa. O resto da definição parece até compatível com o mandamento de amar a todos: afinal, quem não concorda que devemos “tratar as pessoas amadas de forma ética, consensual e comprometida”?
O que não é muito claro é o que significa, exatamente, essa “responsável
não-monogamia” que o “poliamor” propõe. A mídia ocasionalmente retrata o caso
de pessoas “descoladas” que vivem suas “relações abertas” compartilhando
a supervisão dos deveres escolares dos filhos, e situações do tipo. Soa
“discreto e inofensivo” para a nossa modernidade. Mas há outros lados no
“poliamor”.
O grupo Saturnia Regna, por exemplo, está anunciando nos Estados Unidos um programa de férias de verão “em um lindo resort do norte da Califórnia com uso opcional de roupa”. Em tal ambiente, a “comunidade poliamor” pode aprimorar habilidades como “a clarificação e a expressão de desejos, a gestão dos ciúmes, a expansão e o aprofundamento da intimidade e do relacionamento multi-parceiros”.
Esta proposta apresenta uma perspectiva de “exercícios interativos” em um contexto “propício para a expressão sensual em um grau não possível na maioria dos ambientes comuns”. A interpretação de que os participantes desses encontros não apenas correm nus ao ar livre, mas também “se engajam em interações afetivas com múltiplos parceiros, podendo, até, fazer amor à vista dos outros” é pouco exagerada (fica a dica de cuidado para os adeptos puritanos do poliamor...).
A propaganda chega inclusive a pincelar certo caráter de "virtude" nessa postura:
“A interação social no ambiente de uso opcional de roupas exige que as pessoas sejam mais respeitosas do que nos contextos comuns – e não menos. O poliamor e os relacionamentos abertos demandam que as pessoas sejam mais sensíveis aos sentimentos e desejos das pessoas com quem interagem – e não menos. Explorar o poliamor exige um nível mais alto de confiança, honestidade, vulnerabilidade emocional e disposição para enfrentar sentimentos desconfortáveis do que é exigido em relacionamentos mais convencionais. Se você não é uma pessoa disposta e capaz de se comportar desta maneira, este evento provavelmente não é para você”.
O esforço para revestir uma orgia com matizes de “escola de sensibilidade” pode ser hilário por um lado, mas, por outro, é uma mostra perturbadora do futuro possível das relações sexuais reguladas só pela aparência de “amor”. O “poliamor” afirma que os seus “relacionamentos não-monogâmicos” são apenas “outra maneira de amar”. Mas não esclarece qual é a definição de “amor” em que tenta se basear.
Há algo que impeça o “poliamor” de conseguir, em breve, a equiparação legal ao
casamento? Se nem a definição de casamento está clara hoje em dia,
provavelmente não. E isso importa? Bom, importa para quem acha preocupante a institucionalização
da instabilidade familiar. O divórcio já permite há décadas que os pais se
separem e formem novos relacionamentos – e as estatísticas indicam que os
filhos geralmente sofrem de modo bem considerável os efeitos dessa ruptura em
termos de autoestima, segurança pessoal, rendimento escolar, amadurecimento
afetivo. Se o “poliamor” chegar a ser reconhecido legalmente como equiparável
ao matrimônio, o que as crianças acharão de si mesmas no meio disso tudo? E
isso, importa?
_______________________________
Aleteia
Nenhum comentário:
Postar um comentário