A
proximidade da celebração da paixão, morte e ressurreição nos faz ver a
grandeza da misericórdia que Deus revelou a nós no seu Filho, o Crucificado-Ressuscitado.
São sempre atuais as palavras do profeta Zacarias, retomadas por São João:
“olharão para aquele que traspassaram” (Jo 19,37). Será sempre um olhar humano,
portanto limitado, que contempla a manifestação do ser mais profundo de Deus,
seu amor misericordioso. Por isso, precisamos do “olhar da fé”, para, sem
ignorarmos os fatos, vermos neles a redenção da humanidade, pura obra da
graça.
Na cruz,
aquele que “passou fazendo o bem e curando a todos” (At 10,38), mostra-se agora
Ele próprio, digno da maior misericórdia. “Ele não tinha beleza e nem esplendor
que pudesse atrair o nosso olhar, nem formosura capaz de nos deleitar. Era
desprezado e abandonado pelos homens, homem sujeito à dor, familiarizado com o
sofrimento, como pessoa de quem todos escondem o rosto; desprezado, nem
fazíamos caso dele.” (Is 53,2-3).Como que suplicando misericórdia, convida os
discípulos a vigiarem com ele (Mt 26,28) e, ao Pai, pede para, “se possível,
que passe de mim este cálice.” (Mt 26, 39). O Pai mantém-se fiel em seu amor
misericordioso, “pois Deus amou tanto o mundo, que entregou o seu Filho único,
para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” (Jo 3,16).
Não lhe é, porém, poupado o sofrimento.E não encontrou quem dele tivesse
misericórdia! Por isso, a cruz fala do pecado, da falta de justiça e
misericórdia da humanidade, da indiferença diante do sofrimento inocente, da
violência que tira a vida de pobres, crianças e jovens. Infelizmente, também
hoje, como com Jesus, “nem fazíamos caso dele.” (Is 53,2).
A vida,
as palavras e atitudes de Jesus sempre foram misericordiosas. Mas, nenhum outro
momento da vida de Jesus tocou mais profundo a miséria humana do que na sua
cruz. Ele “foi maltratado, mas livremente humilhou-se e não abriu a boca” (Is
53, 7). Sua fidelidade e seu amor foram até o fim (cf. Jo13,1). Oferece a si
mesmo, a sua vida, como sacrifício expiatório (cf. Is 53, 10), e “levou sobre
si o pecado de muitos” (Is 53,12). Sua misericórdia perdoa sempre. “Pai,
perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem.” (Lc 23,34). Por isso, disse S. João
Paulo II: “A cruz é como que um toque do amor eterno nas feridas mais dolorosas
da existência terrena do homem” (Dives in misericórdia, 8). No simbolismo do
“sangue e água”, que brotam do coração traspassado do crucificado, a
misericórdia de Cristo continua na sua Igreja através dos sacramentos,
principalmente do Batismo e da Eucaristia.
Enfim, a
cruz de Cristo não é somente manifestação da misericórdia divina, mas também,
apelo aos cristãos a viverem a misericórdia e a doação de si.O estilo de vida
do Nazareno, impregnado de misericórdia, torna-se o modo de ser e viver dos
seus discípulos. Terão sempre diante de si, à luz da Ressurreição, a cruz e o
Crucificado, pois nela a revelação do amor misericordioso atinge o ponto
culminante. “Quem ama deseja dar-se a si próprio.” (S. João Paulo II, Dives in
misericórdia, 8). Os cristãos são convidados a tocar as chagas do Crucificado,
não ter medo de tocá-las.
Vivamos
todos cada dia da Semana Santa com intensidade. Participemos integralmente, em
nossa comunidade, das celebrações do Tríduo Pascal.
Dom Adelar Baruffi
Bispo de Cruz Alta
Bispo de Cruz Alta
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