Depois de três anos e meio do início do pontificado
do Papa Francisco, são oportunas as perguntas: para onde o Papa caminha? Para
onde ele quer levar a Igreja? A fim de se ter uma resposta adequada, é
necessário conhecer e compreender as ideias que se encontram na base de suas
alocuções, escritos, decisões etc.
Percebe-se que há uma linha-força no pontificado do
Papa Francisco - e essa linha-força se traduz pela palavra
"misericórdia". Desde a primeira vez que se dirigiu ao mundo, ele tem
feito referências a esse tema; volta-se a ele constantemente e sobre ele
escreveu diversas vezes; publicou uma Bula instituindo um Ano Santo, em torno
da misericórdia, e um documento que traduz, concretamente, o olhar da Igreja
voltado para aqueles que enfrentaram problemas no casamento; refere-se à misericórdia
em audiências públicas e nas conversas pessoais etc. Na visita que a
Presidência da CNBB lhe fez, no início de setembro passado, ele destacou a
importância de ensinarmos aos sacerdotes a serem misericordiosos.
Mas o que o Papa Francisco entende por
"misericórdia"? Busco a resposta na Bula "Misericordiae
Vultus" (O rosto da misericórdia - 11.04.15). A misericórdia, lembra ele,
é a fonte da alegria, da serenidade e da paz; é a condição de nossa salvação; é
a palavra que revela o mistério da Santíssima Trindade; a lei fundamental que
mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que
encontra no caminho da vida; o caminho que une Deus e o homem (cf. MV 2).
Na carta apostólica "Mitis Iudex Dominus
Iesus" (O Senhor Jesus, Juiz manso - 15.08.15), o Papa Francisco afirmou:
"Alimenta o impulso reformador o enorme número de fiéis que (...) muitas
vezes se afastam das estruturas jurídicas da Igreja por causa da distância
física ou moral; a caridade e a misericórdia, portanto, exigem que a própria
Igreja como mãe se aproxime dos filhos que se consideram segregados"
(Introdução).
Na exortação apostólica “Evangelii Gaudium” (A
alegria do Evangelho – 24.11.13), ele faz, entre outras, estas colocações:
"Deus nunca Se cansa de perdoar; somos nós que nos cansamos de pedir a sua
misericórdia" (3); "É preciso acompanhar, com misericórdia e
paciência, as possíveis etapas de crescimento das pessoas" (44); "Uma
Igreja em saída é uma Igreja com portas abertas" (46); "A Igreja é
chamada a ser sempre a casa aberta do Pai" (47); "A Igreja deve ser o
lugar da misericórdia gratuita, onde todos possam se sentir acolhidos, amados,
perdoados e animados a viverem segundo a vida boa do Evangelho" (114) etc.
No final do 3º Sínodo Extraordinário sobre a
Família (18.10.14), o Papa Francisco já havia observado: "E esta é a
Igreja, a vinha do Senhor, a Mãe fecunda e a Mestra solícita, que não tem medo
de arregaçar as mangas para derramar o azeite e o vinho sobre as feridas dos
homens (...). Esta é a Igreja Una, Santa, Católica, Apostólica e formada por
pecadores, necessitados da sua misericórdia. Esta é a Igreja, a verdadeira
Esposa de Cristo, que procura ser fiel ao seu Esposo e à sua doutrina. É a
Igreja que não tem medo de comer e beber com as prostitutas e os publicanos. A
Igreja que tem as suas portas escancaradas para receber os necessitados, os
arrependidos, e não apenas os justos ou aqueles que se julgam perfeitos! A
Igreja que não se envergonha do irmão caído nem finge que não o vê; antes pelo
contrário, sente-se comprometida e quase obrigada a levantá-lo e a encorajá-lo
a retomar o caminho, acompanhando-o rumo ao encontro definitivo, com o seu
Esposo, na Jerusalém celeste."
O programa pastoral do Papa Francisco, por ser o
programa de Jesus Cristo, deve ser, necessariamente, o programa da Igreja.
Dom Murilo
S.R. Krieger
Arcebispo da
Bahia e Primaz do Brasil
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