Esta palavra da segunda
leitura da Noite santíssima do Natal exprime de modo admirável o sentido da Festa de
hoje.
Vinde, caríssimos,
seguindo a indicação do Anjo aos pastores, aproximemo-nos do Presépio! Para
nossa surpresa, encontraremos, envolto em faixas, reclinado na manjedoura,
Aquele que é a Graça de Deus feita carne, feita gente, feita um de nós; a graça
de Deus com rosto humano! Que Mistério tão grande e tão doce!
Andávamos
perdidos, como tantos ainda hoje – cada vez mais, ainda hoje! Não tínhamos um
sentido para a vida; éramos presos por nossas paixões, escravos de nossos
desejos desencontrados, entregues aos nossos próprios pensamentos, que levam ao
nada. Orgulhosos, seguíamos, cada um de nós, suas próprias idéias. Como os
pagãos de hoje, pensávamos que éramos livres por fazermos o que queríamos, por
seguir nossa tênue e obscura luz... E, no entanto, éramos escravos de nós
mesmos e de um mundo cego e perverso... Não sabíamos o que fazer com a vida,
com a dor, com nossos instintos e tendências, com as feridas da existência; não
compreendíamos o sentido do nosso caminho, não conseguíamos vislumbrar a
estrada para a verdadeira felicidade e a verdadeira paz. O homem sozinho não
consegue se vencer, não consegue se superar, não consegue se libertar... Nossa
vida parecia, como a dos pagãos de hoje, uma fiada de futilidades vazias de
verdadeira alegria e nosso destino seria a morte, vazia e sem sentido. Ainda
hoje, tantos pagãos, nossos amigos e familiares, nossos distantes e nossos
próximos, vivem assim! Ainda hoje, há tantas lâmpadas na nossa cidade e tão
pouca luz!
Mas, para nós,
nesta Noite mil vezes abençoada, “a Graça de Deus Se manifestou”! Nós vimos a
Luz, Aquela que é capaz de iluminar a nossa existência! Jesus – eis o mais doce
dos nomes; eis o nome dessa Graça bendita, Graça com jeito, choro, e sorriso de
recém-nascido! Vinde, vinde contemplá-Lo! Ele veio para nossa salvação! Veio
para nos arrancar de nós mesmos, de nosso horizonte fechado e estreito; veio
para abrir nosso pensamento, nosso sentimento, nossa vida, abri-los à dimensão
do coração de Deus, fazendo-nos felizes e verdadeiramente humanos! Não seremos
nós mesmos, não seremos realizados, não seremos livres, a não ser abrindo-nos
para Ele! Acolhamos a Graça e vivamos uma Vida nova: “Ela nos ensina a
abandonar a impiedade e as paixões mundanas e a viver neste mundo, com
equilíbrio, justiça e piedade!” Ele veio, irmãos, porque, sozinhos, não
conseguimos encontrar a verdade de nossa vida... Ele é a nossa Verdade, Ele é a
nossa Vida!
Caríssimos, cada
vez mais o mundo cai na treva, no paganismo, na cegueira. Tocamos, mais que
nunca, a descristianização, a dissolução da família, a propagação do mal, a
desmoralização de toda moral, de toda dignidade, de todo valor verdadeiro, a
difusão de um pensamento anticristão e contrário aos santos ensinamentos da
Igreja de Cristo. Nesta Noite sacratíssima, quantos estão se embriagando, quantos
adulterando, quantos, pelas emissoras de rádio e televisão, pela internet,
estão se esbaldando em uma programação mundana; quantos, nesta Noite
esplendorosa e doce, nem sabem que existe uma esperança, um sentido, uma mão de
Deus estendida para toda a humanidade. Quantos, amados irmãos, dizendo-se ainda
cristãos, vivem no pecado, aplaudem o que condenável pela santa Palavra de
Deus, o que é vil aos olhos do Senhor; quantos há que se dizem cristãos e
pensam e sentem e vivem como o mundo que não viu nem conheceu a Graça de Deus
que hoje nos apareceu! Eis que a Graça de Deus, hoje nascida do ventre da
Sempre Virgem, convida-nos à conversão, convida-nos a uma séria mudança de modo
de viver. Não seremos cegos, se vivermos na Sua luz; não seremos perdidos, se
seguirmos Seus passos; não viveremos na morte, se nos abrirmos para a Sua Vida!
Precisamente no
solene Natal do Senhor, num de seus sermões, Santo Agostinho exclamava:
“Expergiscere, homo: quia pro te Deus factus est homo” - “Desperta, ó homem,
porque por ti Deus Se fez homem!”! E o santo Bispo de Hipona continuava:
"Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e sobre ti Cristo
resplandecerá! Por tua causa, repito, Deus Se fez homem! Estarias morto para
sempre, se Ele não tivesse nascido no tempo. Jamais te libertarias da carne do
pecado, se Ele não tivesse assumido uma carne semelhante à do pecado. Estarias
condenado a uma eterna miséria, se não fosse a Sua misericórdia. Não voltarias
à vida, se Ele não tivesse vindo ao encontro da tua morte. Terias perecido, se
Ele não te socorresse. Estarias perdido, se Ele não viesse salvar-te".
Caríssimos,
tomemos consciência de tão grande graça! Nesse Menino que repousa no presépio
foi-nos dada a força para sair do sono miserável de uma vida medíocre e vazia,
de uma existência morna e sem elã. Desperta, ó cristão, porque hoje brilhou
para ti a luz! Por ti, o Filho eterno fez-Se um de ti! Até onde Deus está
disposto a te mostrar o Seu amor, a tirar-te de tua vida vazia! Como exclamava
a Liturgia medieval na Noite de hoje: “Aquele que deu forma a todas as coisas
recebe a forma de escravo; Aquele que era Deus é gerado na carne; eis que Ele é
envolvido em panos, Aquele que era adorado no firmamento; e eis que repousa
numa manjedoura Aquele que reinava no Céu”. Despertemos, caríssimos! Que nossa
alegria desta Noite, que a paz que inunda o nosso coração, transborde numa vida
mais comprometida com o Cristo Jesus! Que nossa existência seja realmente
conforme a santidade e a liberdade Daquele que hoje nasceu da Virgem Santíssima!
“Porque nasceu para nós um Menino, foi-nos dado um Filho; Ele traz nos ombros a
marca da realeza; o nome que Lhe foi dado é: Conselheiro admirável, Deus forte,
Pai dos tempos futuros, Príncipe da paz”. A Ele a glória, pelos séculos dos
séculos. Amém.
Feliz Natal, caro
Amigo deste espaço digital!
Tudo passa...
Somente o Senhor é o mesmo, ontem, hoje e por toda a Eternidade!
Que o Deus nascido da Virgem tenha piedade de nós!
Que o Deus nascido da Virgem tenha piedade de nós!
Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares, PE
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