Jesus, depois de ter deixado Nazaré e de ter sido batizado no Jordão,
vai a Cafarnaum para iniciar o seu ministério público.
Ele é apresentado como grande luz (cf. Mt 4, 12-23) de que fala o
Profeta Isaías (Is 9, 1-4).
No caminho do mar, junto ao lago, que Jesus começa a pregar e a dizer:
“Convertei-vos, porque está próximo o Reino dos Céus” ( Mt 4, 17). Da pregação
em geral, Jesus passa ao convite pessoal: “Segui-Me e Eu vos farei pescadores
de homens. Eles deixaram imediatamente as redes e O seguiram”.
O Evangelho nos apresenta o chamamento dos primeiros Apóstolos: “Ele
chamou enquanto caminhava junto ao mar da Galiléia. Estes homens experimentaram
o fascínio da luz secreta que emanava dEle e seguiram-na sem demora para que
iluminasse com o seu fulgor o caminho das suas vidas. Mas essa luz de Jesus
resplandece para todos.
Jesus Cristo, luz do mundo, chamou primeiro uns homens simples da
Galiléia, iluminou as suas vidas, ganhou-os para a sua causa e pediu-lhes uma
entrega sem condições. Aqueles pescadores da Galiléia saíram da penumbra de uma
vida sem relevo nem horizonte para seguirem o Mestre, tal como outros o fariam
logo após, e depois já não cessariam de fazê-lo inúmeros homens e mulheres ao
longo dos séculos. Seguiram-no até darem a vida por Ele. Nós também O seguimos!
O Senhor chama-nos agora para que O sigamos e para que iluminemos a vida
dos homens e as suas atividades nobres com a luz da fé; sabemos bem que o
remédio para tantos males que afetam a humanidade é a fé em Jesus Cristo, nosso
Mestre e Senhor, razão de ser de nossa existência; sem Ele, os homens caminham
às escuras e por isso tropeçam e caem. E a fé que devemos comunicar é luz na
inteligência, uma luz incomparável: fora da fé estão as trevas, a escuridão
natural diante da verdade sobrenatural…”
Jesus inicia o seu ministério e prega a conversão: “Convertei-vos,
porque o reino dos céus está próximo” (Mt 4, 17).
A mensagem de Cristo sempre entrará em choque com uma sociedade
contagiada pelo materialismo e por uma atitude conformista e aburguesada
perante a vida.
Todo cristão tem a vocação que lhe foi concedida por graça no momento do
batismo: todos nós fomos chamados à santidade e ao apostolado. Com o passar do
tempo, na escola de Jesus, essa vocação poderia receber uma nova especificação,
por exemplo, no caso daqueles que são chamados ao sacerdócio ministerial. No
entanto, a vocação à santidade e ao apostolado é igual para padres, para leigos
e para religiosos. Todos devem ser santos, todos devem evangelizar. Por quê?
Porque foram batizados. Além do mais, não existe uma santidade maior para os
padres e uma santidade menor para os leigos, mas todos estão chamados à plenitude
da vida cristã, à santidade. Com outras palavras: o padre não é mais santo
porque é padre, nem o leigo é menos santo pelo fato de ser leigo. Não! A
santidade é medida pela caridade e todos podem chegar ao auge do amor.
Pedro e André, os futuros São Pedro e Santo André, compreenderam isso.
Eles seguiram ao Senhor Jesus, andaram com ele, permaneceram sempre perto de
Jesus, atenderam os seus apelos de evangelização, fizeram a vontade do seu
Mestre e… são santos. Aprenderam a estar com Jesus e a pescar homens.
Aprenderam a ser apóstolos.
Deus chama-nos a todos para que sejamos luz do mundo, e essa luz não
pode ficar escondida: “Somos lâmpadas que foram acesas com a luz da verdade”
(Santo Agostinho).
Comentário dos textos bíblicos
Leituras: Is 8,23b – 9,3; Sl 26; 1Cor 1,10-13.17; Mt 4,12-23
Na Liturgia da Palavra deste domingo o
evangelista São Mateus nos apresenta o início da missão pública de Cristo, que
tem início nas cidades e aldeias da Galileia. Neste ambiente simples, tido como
uma região pagã e excluída da salvação, que Jesus começa ensinando que ninguém
está excluído da salvação de Deus. O profeta Isaías já havia prenunciado que
nesta terra, destinada às tribos de Zabulão e de Neftali, teria conhecido um
futuro glorioso: o povo imerso nas trevas teria visto uma grande luz (cf. Is
8,23-9,1), a luz de Cristo e do seu Evangelho (cf. Mt 4, 12-16).
A pregação de Jesus vai consistir
essencialmente no anúncio do Reino de Deus e na cura dos doentes. Literalmente,
“evangelho” significa “boa mensagem”, “boa notícia” ou “boa nova”, derivando da
palavra grega ευαγγέλιον. A “boa nova” que
Jesus proclama resume-se nestas palavras: “O reino de Deus está próximo” (Mt 4,17). Esta expressão não
indica um reino terreno delimitado no espaço e no tempo, mas anuncia que é Deus
quem reina, que é Deus o Senhor e o seu senhorio está presente, é atual, está a
realizar-se.
A novidade da mensagem de Cristo é, portanto,
que Deus em sua pessoa se fez próximo, já reina entre nós, como demonstram os
milagres e as curas que Ele realiza. Deus reina no mundo mediante o seu Filho
feito homem e com a força do Espírito Santo. Aonde chega Jesus, o Espírito
criador leva vida e os homens são curados das doenças do corpo e do espírito. O
senhorio de Deus manifesta-se então na cura integral do homem. Com isto Jesus
quer revelar o rosto do verdadeiro Deus, o Deus próximo, cheio de misericórdia
por todos os seres humanos. O reino de Deus é, portanto, a vida que se afirma
sobre a morte, a luz da verdade que dissipa as trevas da ignorância e da
mentira.
Falamos que o Evangelho é a “boa nova” porque
a sua exortação é sempre atual. Todos os dias somos chamados à conversão a
Cristo e este é o caminho que nos conduz a Deus. E a Liturgia da Palavra deste
domingo ressalta o projeto de salvação que Deus tem para oferecer à humanidade.
Já na primeira leitura (cf. Is 8,23-9,3), o profeta Isaías anuncia uma luz que
Deus irá fazer brilhar e que colocará fim às trevas que submergem todos aqueles
que estão prisioneiros da morte, da injustiça e do sofrimento.
A imagem da luz torna-se sinal da esperança
messiânica: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz,uma luz raiou para
os que habitavam uma terra sombria como a morte” (Is 9,1). No contexto do
sofrimento e da dor, a imagem da luz vislumbra em sinal de alegria e paz. O
profeta Isaías “uma luz” que começará a brilhar em cima dos montes da Galiléia
e que irá iluminar toda a terra. Essa luz eliminará “as trevas” que mantinham o
Povo sem esperança e inaugurará um novo dia, onde passa a ser uma realidade.
Jesus tem consciência de que a chegada desse
novo tempo está ligada à sua pessoa. Mas o seu primeiro anúncio resume-se, para
o Evangelista Mateus, no convite à conversão, porque o Reino de Deus está para
chegar (v. 17). O convite à conversão é um apelo a uma mudança radical na
maneira de pensar, nos valores e nas atitudes. Corresponde, fundamentalmente, a
um reorientar a vida para Deus, a um reequacionar a vida, de modo a que Deus e
os seus valores passam a estar no centro da existência da nossa existência.
E o Evangelho descreve o chamamento dos
primeiros discípulos (vv. 18-22). Através da resposta de Pedro e André, Tiago e
João, Jesus propõe esta atitude destes primeiros discípulos como um exemplo da
conversão e da adesão às suas exigências. O relato sublinha uma diferença
fundamental entre os chamados por Jesus e os discípulos que se juntavam à volta
dos mestres do judaísmo: não são os discípulos que escolhem o mestre e pedem
para entrar no seu grupo, como acontecia com os discípulos dos rabinos; mas a
iniciativa é de Jesus, que chama os discípulos que Ele próprio escolheu e os
convida a segui-lo para uma missão.
A resposta dos quatro primeiros discípulos ao
chamado de Jesus é imediata: renunciam à família, ao trabalho, às seguranças
instituídas e seguem Jesus sem questionar. Esta ruptura indicia uma opção
radical pelo Cristo e pelo seu Evangelho. Eles deixam um atividade para assumir
uma outra: eles serão pescadores de homens. O mar, na cultura judaica, é o
lugar dos demônios, das forças da morte que se opõem à vida e à felicidade dos
homens. No mar havia os monstros e nele até os mais hábeis marinheiros não se sentiam
em segurança. O mar, na cultura de então, era tido como a morada do demônio,
das doenças e de todas as forças inimigas da vida.
A tarefa dos discípulos de Jesus será,
portanto, arrancar os homens dos tentáculos do mal que, nestas águas
impetuosas, os dominam, os arrastam, os submerge. Cabe a eles libertar os
homens dessa realidade de morte e de escravidão em que eles estão mergulhados,
e os conduzir à liberdade e à plena realização. Nisto consiste a missão de
pescadores de homens. Nestes quatro discípulos: Pedro, André, Tiago e João,
estão representados o grupo dos discípulos, de todos os tempos e lugares. Eles
não podem ter medo das ondas do mar, mesmo quando elas estão violentas. Não
podem desistir de salvar aqueles que necessitam de uma vida nova.
Para que o Reino de Deus possa ser instaurado,
Jesus pede a “conversão”. Esta conversão é, antes de mais, um refazer a
existência, de forma a que só Deus ocupe o primeiro lugar na vida do homem.
Implica, portanto, despir-se do egoísmo que o impede de estar atento às
necessidades do próximo, dos que necessitam do nosso auxilio e da nossa
atenção.
O tema da luz, relacionado à pregação do
Evangelho, indica que a salvação há de ser difundida largamente ao alcance de
todos. À imagem da luz, pelo seu fenômeno de irradiação, torna-se, a grande
força expressiva do Evangelho a ser dilatado entre as nações e para todos os
homens. Entretanto, a riqueza da imagem nos remete também ao fato da luz
possibilitar a visão (cf. Mt 6,22-23) e aquecer os ambientes.
É frequente na Sagrada Escritura a imagem da
luz como expressão da ação de Deus Salvador. O Velho Simeão, por exemplo, no
Templo, se referiu ao Menino Jesus como “luz que veio para iluminar as nações”
(Lc 2,32). Em São João essa idéia aparece inúmeras vezes. Assim no prólogo do
seu Evangelho, Jesus é apresentado como a “luz verdadeira que vindo ao mundo e
ilumina a todo homem” (Jo 1,9). O juízo de condenação do mundo acontece porque
“a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz” (Jo
3,19). E sobre todas essas reflexões paira a solene palavra de Jesus: “Eu sou a
luz do mundo; quem me segue, não caminha nas trevas, mas tem a luz da vida” (Jo
8,12). Não sem misterioso significado, na hora da morte de Jesus no Calvário
“estenderam-se as trevas sobre toda a terra” (Mt 27,45). Com Cristo, a luz. Sem
Cristo, a escuridão.
Mas nós também somos chamados a irradiar a
luz. Os textos bíblicos apresentados para este domingo indicam que Deus veio ao
mundo como luz, para iluminar o nosso caminho de trevas. Quantos homens e
mulheres andam à procura de sentido e procuram o seu caminho na noite. Hoje
também o Senhor nos chama para que o sigamos e para que iluminemos a vida dos
homens e as suas atividades com a luz da fé. Sem a fé em Jesus Cristo os homens
caminham às escuras e, por isso, podem tropeçar e cair. O Senhor nos chama a
ser luz do mundo. Cabe a cada um de nós ser portador e reflexo desta luz. Que o
nosso coração possa estar aberto para acolher esta luz “que te ilumina e salva”
(Sl 26).
Peçamos uma vez mais a Maria, a Virgem de
Nazaré, a quem também invocamos com o título de Nossa Senhora da Luz, que ela
possa interceder por nós, para que possamos cumprir com fidelidade os
ensinamentos de seu filho Jesus e que possamos ser uma luz a iluminar os
caminhos daqueles que estão nas trevas. Assim seja.
PARA REFLETIR
A primeira leitura da Missa de hoje
é, em parte, a mesma da Noite do Natal: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que
habitavam nas sombras da morte, uma luz resplandeceu! Fizeste crescer a alegria
e aumentaste a felicidade! Todos se regozijam em tua presença”. Irmãos,
esta luz que ilumina as trevas, que dissipa as sombras da morte, que traz a
felicidade, é Jesus. O texto do Evangelho que escutamos no-lo confirma: Jesus é
a bendita luz de Deus que brilhou neste mundo! Ele mesmo afirmou: “Eu sou a luz do mundo! Quem me
segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida!” (Jo 8,12). Já
escutamos tanto tais afirmações, que corremos o risco de não perceber o quanto
são revolucionárias, o quanto nos comprometem, o quanto são capazes de
transformar a nossa vida!
A Palavra de Deus nos ensina que o mundo é marcado pelas
trevas: trevas na natureza (tais como a tragédia do tsunami), trevas na
história, trevas no coração da humanidade e de cada um de nós. Olhemos em
volta! O mundo não é bonzinho: há forças destrutivas, caóticas, desagregadoras,
forças diabólicas, que destroem a alegria de viver e ameaçam devorar o sentido
da nossa existência… Hoje, tantos e tantos julgam que podem passar sem Deus,
que a religião é uma bobagem e uma humilhação para o homem… Há tantos que
zombam de Deus, do Cristo Jesus, da Igreja… O que vale no mundo atual? O que é
importante? O que conta realmente? O sucesso, os bens materiais, o prazer e a
curtição da vida ao máximo, sem limites, sem peias… Será que não nos damos
conta ainda que vivemos num mundo novamente pagão, novamente bárbaro, novamente
entregue ao seu próprio pensar tenebroso? Será que não percebemos que o que
vemos e lemos e ouvimos dos meios de comunicação é a defesa de uma humanidade
sem Deus e sem fé, de uma humanidade que tenha somente a si própria como deus?
Num mundo assim, Jesus nos diz: “Eu sou a Luz!” A luz não está nas universidades,
a luz não está nos famosos deste mundo, a luz não está nos que têm o poder
político, econômico ou social! A Luz é Cristo! Só ele nos ilumina, só ele nos
revela o sentido da existência, só ele nos mostra o caminho por onde caminhar!
Ser cristão é crer nisso, é viver disso!
Pois, esse Jesus, hoje, no Evangelho, nos convida a
convertermo-nos a ele, a segui-lo de verdade, a colocar os passos de nossa vida
no seu caminho: “Convertei-vos! O Reino dos céus
está próximo!” Eis o apelo que Jesus nos faz – far-nos-á
sempre! Converter-se significa mudar totalmente o rumo de nossa existência,
alicerçando-a nele e não em nós, abraçando o seu modo de pensar e deixando o
nosso, seguindo sua Palavra e não nossa razão, nossas idéias, nossa cabeça
dura, nosso entendimento curto! Quem vai arriscar? Quem vai caminhar com ele?
Quem vai abraçar sua Palavra, tão diferente do que o mundo quer, do que o mundo
prega, do que o mundo valoriza? “Convertei-vos!” Jesus nos exorta porque sabe que
também nós andamos em trevas, também nós, simplesmente entregues à nossa
vontade e aos nossos pensamentos, jamais poderemos acolher o Reino dos céus!
Não nos iludamos! Não pensemos que somos sábios, centrados e imunes! Somos, nós
também, cegos, curtos de entendimento, pecadores duros e teimosos! Nosso
coração é embotado por tantas paixões e por tantas cegueiras! “Convertei-vos!” O
Governo Lula, neste carnaval, vai convidar tantos e tantos brasileiros a
vestir-se de camisinha; o Senhor pede a todos que se vistam dele: “Revesti-vos de Cristo e não
satisfareis os desejos da carne!” (Rm 13,14) Compreendem,
irmãos e irmãs? O mundo vai para um lado; Jesus nos convida a ir para o outro!
Converter-se é pensar diferente de nós mesmos e do mundo; é andar na contramão
para caminhar com Cristo! Converter-se é deixar-se, como Pedro e André, Tiago e
João que, “imediatamente deixaram as
redes… deixaram a barca e o pai” e seguiram o Senhor!
Caríssimos, como não recordar a exortação do Apóstolo? “Não andeis como andam os
pagãos, na futilidade de seus pensamentos, com entendimento entenebrecido,
alienados da vida de Deus!” (Ef 4,17). Quando aceitamos esse
desafio, esse convite, o sentido de nossa existência muda, porque começamos a
enxergar e avaliar as coisas de um modo novo, um modo diferente: o modo de
Cristo Jesus! Aí se realiza em nós a palavra da Escritura: “Outrora éreis trevas, mas
agora sois luz no Senhor! Andai como filhos da luz!” (Ef 5,8).
Caríssimos, deixar-se iluminar pelo Senhor, permitir que
ele dissipe nossas trevas, é um trabalho, um processo que dura todo o nosso
caminho neste mundo. Jamais estaremos totalmente convertidos, totalmente
iluminados. Na segunda leitura da Missa, São Paulo convidava os cristãos de
Corinto à conversão para uma vida de união e de amor. É assim: a Igreja toda
inteira e cada um de nós pessoalmente, seremos sempre chamados a essa mudança,
a esse deixar que a luz de Cristo invada a nossa existência tenebrosa! Nunca
esqueçais, caríssimos, porque é verdade: “Outrora, sem Cristo, éreis trevas, mas, agora, sois luz no Senhor! Andai, pois, como
filhos da luz!” Seja esse o nosso trabalho, seja essa a nossa
identidade, seja essa a nossa herança, seja essa a nossa recompensa! E que o
Senhor nos socorra com a força da sua graça, ele que é fiel e bendito para
sempre! Amém.
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