Terceira pregação da Quaresma
Anunciar
a Palavra
O
Espírito Santo, principal agente de evangelização
Hoje vamos continuar e concluir as nossas reflexões
sobre a constituição Dei Verbum, ou seja, sobre a Palavra de Deus. Na última
vez falei da “lectio divina”, ou seja, da leitura pessoal e edificante da
Escritura. Seguindo o esquema delineado por São Tiago distinguimos três
operações sucessivas: acolher a Palavra, meditar a Palavra, colocar em prática
a Palavra.
Falta uma quarta operação a ser feita, sobre a qual
queremos refletir hoje: anunciar a Palavra. A Dei Verbum fala brevemente do
lugar privilegiado que a Palavra de Deus deve ter na pregação da Igreja (DV,
nr. 24), mas não trata diretamente do anúncio, também porque sobre este
argumento o Concílio dedica um documento a parte, a Ad gentes divinitus, sobre
a atividade missinária da Igreja.
Depois deste texto conciliar, o discurso foi
retomado e atualizado pelo Beato Paulo VI com a Evangelii nuntiandi, por São
João Paulo II com a Redemptoris missio, e pelo Papa Francisco com a Evangelii
gaudium. Do ponto de vista doutrinário e operacional, portanto, tudo foi dito,
e ao mais alto nível do magistério. Seria insensato da minha parte achar que eu
poderia acrescentar algo. O que é possível fazer, de acordo com a linha destas
meditações, é destacar algum aspecto mais diretamente espiritual do problema.
Para fazê-lo, começo com a frase, muitas vezes repetida, do Beato Paulo VI: “o
Espírito Santo é o principal agente da evangelização[1]”.
O meio e a
mensagem
Se eu quero espalhar uma notícia, o primeiro
problema que se coloca é: com qual meio transmiti-la: através do jornal?
através do rádio? através da televisão? O meio é tão importante que a ciência
moderna das comunicações sociais cunhou o slogan: “O meio é a mensagem” ( “The
medium is the message[2]”). Ora, qual é o meio primordial e natural com o qual
se transmite uma palavra? É o sopro, a respiração, a voz que toma, por assim
dizer, a palavra que se formou no segredo da minha mente e a leva ao ouvido do
interlocutor. Todos os outros meios apenas potenciam e amplificam este meio
primordial do sopro ou da voz. Também a escritura vem depois e supõe a
viva-voz, uma vez que as letras do alfabeto só são sinais que indicam sons.
Também a Palavra de Deus segue esta lei. Ela é
transmitida por meio de um sopro. E qual é, ou quem é, o sopro, ou ruah, de
Deus, segundo a Bíblia? Nós sabemos: é o Espírito Santo! O meu sopro pode
animar a palavra de um outro, ou o sopro de outro animar a minha palavra? Não.
A minha palavra só pode ser pronunciada com o meu sopro e a palavra de outro
com o seu sopro. Assim, de forma análoga, claro, a Palavra de Deus só pode ser
animada pelo sopro de Deus que é o Espírito Santo.
Esta é uma verdade muito simples e quase óbvia, mas
de imenso alcance. É a lei fundamental de todo anúncio e de toda evangelização.
As notícias humanas se transmitem ou com viva-voz ou via rádio, jornal,
internet, e assim por diante; a notícia divina, em quanto divina, é transmitida
através do Espírito Santo. O Espírito Santo é o verdadeiro, essencial, meio de
comunicação, sem o qual nada se percebe da mensagem, a não ser o revestimento
humano. As palavras de Deus são “Espírito e vida” (cf. Jo 6, 63), e, portanto,
só podem ser transmitidas ou acolhidas “no Espírito”.
Esta lei fundamental é a que vemos em ato,
concretamente, na história da salvação. Jesus começou a pregar “com o poder do
Espírito Santo (Lucas 4,14 ss) Ele próprio declarou: “O Espírito do Senhor está
sobre mim… ele me consagrou com a unção, para levar aos pobres uma feliz
mensagem”. (Lc 4, 18) Aparecendo aos apóstolos no Cenáculo na tarde de Páscoa,
ele disse:” Como o Pai me enviou, também Eu vos envio. Dito isto, soprou sobre
eles e disse: Recebei o Espírito Santo “(Jo 20, 21-22). Ao dar aos apóstolos o
mandato de ir a todo o mundo, Jesus lhes deu também o meio para realiza-lo – o
Espírito Santo – e deu-o, de forma significativa, no sinal do sopro, da
respiração.
De acordo com Marcos e Mateus, a última palavra que
Jesus disse aos apóstolos antes de subir ao céu foi “Ide!”: “Ide por todo o
mundo e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc 16,15; Mt 28, 19) . De acordo
com Lucas, o comando final de Jesus parece ser o oposto: Fiquem! Permaneçam!:
“Permaneçam na cidade até serdes revestidos com o poder do alto” (Lc 24, 49).
Claro, não há contradição; o sentido é: ide por todo o mundo, mas não antes de
ter recebido o Espírito Santo.
Toda a história de Pentecostes serve para destacar
essa verdade. Vem o Espírito Santo e eis que Pedro e os outros apóstolos, em
voz alta, começam a falar de Cristo crucificado e ressuscitdo e a sua palavra
tem uma tal unção e potência que três mil pessoas sentem o coração
transpassado. O Espírito Santo, descido sobre os apóstolos, se transformar
neles em um irresistível impulso a evangelizar.
São Paulo vem afirmar que sem o Espírito Santo é
impossível proclamar que “Jesus é o Senhor!” (1 Cor 12, 3), que é o começo e a
síntese de todo anúncio cristão. São Pedro, por sua vez, define os apóstolos
“aqueles que anunciaram o Evangelho no Espírito Santo” (1 Pd 1, 12). Indica com
a palavra “Evangelho” o conteúdo e com a expressão “no Espírito Santo” o meio,
ou o método, do anúncio.
Palavras e
obras
A primeira coisa a evitar quando se trata de
evangelização é a de pensar que seja sinônimo de pregação e, portanto,
reservada a uma categoria particular de cristãos. Falando da natureza da
revelação a Dei Verbum diz:
“Esta «economia» da revelação realiza-se por meio
de acções e palavras intimamente relacionadas entre si, de tal maneira que as
obras, realizadas por Deus na história da salvação, manifestam e confirmam a
doutrina e as realidades significadas pelas palavras; e as palavras, por sua
vez, declaram as obras e esclarecem o mistério nelas contido[3]”
Trata-se de uma afirmação que remonta a São Gregório
Magno. “O Nosso Senhor e Salvador – escrevia o santo doutor – às vezes nos
adverte com o que diz, às vezes, pelo contrário, com o que faz”: “aliquando nos
sermonibus, aliquando vero operibus admonet”[4]. Esta lei que vale para a
Revelação na sua origem, vale também para a sua difusão. Em outras palavras,
não se evangeliza só com as palavras, mas, em primeiro lugar, com as obras e a
vida; não com o que se diz, mas com o que se faz e que se é.
Assim foi no começo. O estudo de maior autoridade
sobre “missão e propagação do cristianismo nos primeiros três séculos”, conclui
que “a mera existência e o trabalho constante das comunidades individuais foi o
principal fator na propagação do cristianismo[5]“. Neste ano da misericórdia
vale a pena lembrar em que consistiu este “trabalho” da comunidade cristã. Além
da ajuda fraterna entre si, consistia nas obras de misericórdia com todos: no
cuidado com os órfãos, com os enfermos, os prisioneiros. A força destas
iniciativas era tão evidente que, querendo contrariar o crescimento da fé
cristã, o imperador Juliano, que voltou para a religião pagã, tentou introduzir
análogas instituições de caridade no âmbito civil.
Há um ditado em Inglês que adquire um significado
todo particular aplicado à evangelização: “Os fatos falam mais do que as
palavras”: “Deeds speak louder than words”. Uma frase muitas vezes repetida por
Paulo VI na Evangelii nuntiandi diz assim: “”O homem contemporâneo escuta com
melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres, ou, se escuta os mestres é
porque são testemunhas[6]“.
Um dos mais famosos filósofos moralistas do século
passado (não há necessidade de mencionar o seu nome) certa noite foi
surpreendido em um local com uma companhia pouco edificante. Um colega lhe
perguntou como podia conciliar a sua conduta com o que escrevia nos seus
livros; ele respondeu tranquilamente: “Alguma vez você viu uma placa de
sinalização caminhar para a direção que indica?”. Uma resposta brilhante, mas
que se condena a si mesma. Os homens não sabem o que fazer com “placas de
sinalização” que mostram a direção, mas que não se movem um centímetro.
Eu tenho um bom exemplo da eficácia do testemunho,
na própria ordem religiosa à qual pertenço. A maior contribuição, mesmo se
escondida, que a ordem dos capuchinhos deu à evangelização nos cinco séculos de
sua história não foi, creio eu, a de pregadores profissionais, mas o exército
de “irmãos leigos”: simples e ignorantes porteiros dos conventos ou pedintes.
Populações inteiras recuperaram ou manteram sua fé graças ao contato com eles.
Um deles, o Beato Nicolau de Gesturi, falava tão pouco que as pessoas o
chamavam de “Frei silêncio”. Até na Sardenha, depois de 58 anos da sua morte, a
ordem dos Capuchinhos se indentifica com frei Nicola de Gesturi, ou também com
frei Inácio de Laconi, outro santo frei pedinte do passado. O mesmo acontece
aqui em Roma, no começo da Ordem, com são Felix de Cantalice. Realizou-se a
palavra que Francisco de Assis dirigiu um dia aos fradres pregadores: “Por que
vocês se gloriam da conversão dos homens? Saibam que quem os converteu foram os
meus frades simples com as suas orações[7]”.
Certa vez, durante um diálogo ecumênico, um irmão
Pentecostal me perguntou – não para criar polêmica, mas para tentar entender
mesmo – por que nós católicos chamamos Maria de “Estrela da Evangelização”. Foi
a ocasião também para mim de refletir sobre este título atribuído a Maria por
Paulo VI, na conclusão da Evangelii nuntiandi. Cheguei à conclusão de que Maria
é a estrela da evangelização, porque não trouxe uma palavra particular para um
povo particular, como fizeram os maiores evangelizadores da história; mas levou
a Palavra feito carne e levou-a (também fisicamente) ao mundo inteiro! Nunca
pregou, só pronunciou pouquíssimas palavras, mas estava cheia de Jesus e por
onde andava exalava o seu perfume, tanto que João Batista deu-se conta desde o
ventre de sua mãe. Quem pode negar que a Virgem de Guadalupe tenha desempenhado
um papel fundamental na evangelização e fé do povo mexicano?
Falando para um ambiente curial, parece-me justo
destacar a contribuição que podem dar – e que dão, de fato – à evangelização
aqueles que passam a maior parte do seu tempo atrás de um escritório e tratando
negócios aparentemente não relacionados com a evangelização. Concebe-se o
próprio trabalho como serviço ao Papa e à Igreja; renova vez ou outra esta
intenção e não permite que a preocupação da carreira tome conta do seu coração.
O modesto funcionário de uma Congregação contribui para a evangelização mais do
que um pregador profissional, se este procura agradar mais os homens do que a
Deus.
Como se
tornar evangelizadores
Se o compromisso de evangelização pertence a todos,
procuremos ver quais são os pré-requisitos e as condições para tornar-se
realmente evangelizadores. A primeira condição nos é sugerida pela palavra que
Deus dirigiu a Abraão: “Sai da tua terra e vai” (cf. Gn 12, 1). Não há missão e
envio sem uma saída prévia. Falamos muitas vezes de uma Igreja “em saída”.
Devemos dar-nos conta de que a primeira porta da qual sair não é aquela da
Igreja, da comunidade, das instituições, das sacristias; é aquela do nosso
“eu”. Explicou-o muito bem, em certa ocasião, o próprio Papa Francisco: “Estar
em saída, dizia, significa antes de mais nada sair do centro para deixar a Deus
no Centro”. “Descentralizar-nos de nós mesmos e recentralizar-nos em Cristo”,
diria Teilhard de Chardin.
Mais intenso que o grito dirigido a Abraão, é o de
Jesus àquele que chama para colaborar com ele no anúncio do Reino: “Parte, sai
do teu eu, negue a si mesmo! Então tudo se torna meu. A tu vida muda, o meu
rosto se torna o teu. Não eres mais tu que vives, mas eu que vivo em ti”. É o
único modo para vencer o enxame de invejas, ciúmes, medos de perder a face,
rancores, ressentimentos, situações de antipatia que enchem o coração do homem
velho; para ser “habitados” pelo Evangelho e espalhar o odor de Evangelho.
A Bíblia nos dá uma imagem que contém mais verdade
do que tratados inteiros de pastoral do anúncio: aquela do livro comido que
lemos em Ezequiel:
“Olhei e vi avançando para mim uma mão, que
segurava um manuscrito enrolado, que foi desdobrado diante de mim: estava
coberto com escrita de um e de outro lado: eram cânticos de luto, de queixumes
e de gemidos. Filho do homem, falou-me, come o rolo que aqui está, e, em
seguida, vai falar à casa de Israel. Abri a boca, e ele mo fez engolir.
Filho do homem, falou-me, nutre o teu corpo, enche
o teu estômago com o rolo que te dou. Então o comi, e era doce na boca, como o
mel. (Ez 2, 9 – 3, 3; cf. também Ap 10, 2).
Há uma enorme diferença entre a palavra de Deus
simplesmente estudada e proclamada e a palavra de Deus antes “comida” e
assimilada. No primeiro caso fala-se de um pregador que “fala como um livro
impresso”; mas não se chega assim ao coração das pessoas, porque ao coração
chega só aquilo que parte do coração. “Cor ad cor loquitur, era o lema do beato
cardeal Newman.
Retomando a imagem de Ezequiel, o autor do
Apocalipse acrescenta uma pequena, mas significativa variação. Diz que o livro
engolido era tão doce quanto o mel nos lábios, mas amargo como o fel nas
entranhas (cf. Ap 10, 10). Sim porque antes de ferir os ouvintes a palavra deve
ferir o anunciador, mostrar-lhe o seu pecado e leva-lo à conversão.
Não é o trabalho de um dia. Porém, há uma coisa que
é possível fazer em um dia, hoje mesmo: concordar com esta perspectiva, tomar a
decisão irrevogável, na medida da nossa capacidade, de não viver mais para nós
mesmos, mas para o Senhor (cf. Rm 14, 7-9). Tudo isso não pode ser só fruto do
esforço ascético do homem; isso é também obra da graça, fruto do Espírito
Santo. “Porque não vivemos mais para nós mesmos, mas para ele (Cristo) que
morreu e ressuscitou por nós, mandou, o Pai, o Espírito Santo, primeiro dom aos
crentes”. Assim a liturgia nos faz rezar na Oração eucarística IV.
É fácil saber como se consegue o Espírito Santo em
vista da evangelização. Basta ver como Jesus o conseguiu e como a Igreja o
conseguiu no mesmo dia de Pentecostes. Lucas descreve assim o evento do batismo
de Jesus: “Enquanto Jesus, tendo sido batizado também ele, estava em oração, o
céu se abriu e desceu sobre ele o Espírito Santo” (Lc 3,21-22). Foi a oração de
Jesus que penetrou os céus e fez descer o Espírito Santo e o mesmo aconteceu
com os apóstolos. O Espírito Santo, em Pentecostes, desceu sobre eles enquanto
“perseveravam unanimemente na oração” (At 1, 14).
O esforço por um renovado compromisso missionário
está exposto a dois perigos principais. Um deles é a inércia, a preguiça, o não
fazer nada e deixar que os outros façam tudo. O outro é o cair em um ativismo
humano febril e vazio, com o resultado de perder aos poucos o contato com a
fonte da palavra e da sua eficácia. Também isso seria um cair no fracasso. Mais
aumenta o volume da atividade, mas deve aumentar o volume da oração.
Argumenta-se: isso é absurdo; o tempo é o que é! De acordo, mas quem
multiplicou os pães, não poderá, talvez, multiplicar também o tempo? Afinal de
contas, é o que Deus faz o tempo todo e que todos os dias fazemos a
experiência. Depois de ter orado, fazem-se as mesmas coisas em menos da metade
do tempo.
Argumenta-se ainda: Mas como estar tranquilos para
orar, como não correr, quando a casa pega fogo? É verdade também isso. Mas
imaginem esta cena: uma equipe de bombeiros recebeu um alarme e corre com as
sirenes ligadas para o lugar do incêndio; mas, chegando ao local, se dá conta
de que no reservatório não tem uma só gota de água. Assim somos nós, quando
corremos para pregar sem orar. Não é que falte a palavra; pelo contrário, menos
se reza mais se fala, mas não palavras vazias, que não tocam ninguém.
Evangelização
e compaixão
Juntamente com a oração outro meio para obter o
Espírito Santo é a retidão de intenção. A intenção ao pregar Cristo pode ser
poluída por várias causas. São Paulo elenca algumas na Carta aos Filipenses:
por conveniência, por inveja, por espírito de disputa e de rivalidade (Fl 1,
15-17). A causa que engloba todas as outras, no entanto, é uma só: a falta de
amor. São Paulo diz: “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos,
se não tiver amor, sou como bronze que soa ou como o címbalo que retine” (l Cor
13,1).
A experiência me fez descobrir uma coisa: que se
pode anunciar Jesus Cristo por motivos que não têm nada a ver com o amor.
Pode-se anunciar por proselitismo, para encontrar, no aumento do número dos
seguidores, uma legitimidade da própria pequena igreja, especialmente se
própria ou de recente fundação. Pode-se anunciar, interpretando literalmente
uma frase do Evangelho, para levar o Evangelho aos confins da terra (cf. Mc 13,
10), de modo a preencher o número dos eleitos, e apressar a volta do Senhor.
Algumas dessas razões não são em si ruins. Mas por
si só não são suficientes. Falta aquele genuíno amor e compaixão pelos homens
que é a alma do Evangelho. O Evangelho do amor só pode ser anunciado por amor.
Se não nos esforçamos para amar as pessoas que temos em frente, as palavras se
transformam facilmente em pedras que ferem e das quais é necessário defender-se
como de uma tempestade de granizo.
Sempre tenho perante os olhos a lição que a Bíblia,
implicitamente, nos dá com a história de Jonas. Jonas é forçado por Deus para
ir a Nínive pregar. Mas os ninivitas eram inimigos de Israel, e Jonas não
gostava dos ninivitas. Ele está visivelmente contente e satisfeito quando pode
gritar: “Ainda quarenta dias, e Nínive será destruída!”. A perspectiva não
parece desagradá-lo nenhum pouco. Só que os ninivitas se arrependem e Deus lhes
poupa do castigo. Neste momento Jonas entra em crise. “Tiveste compaixão –
disse Deus quase desculpando-se – de um arbusto… E então, não hei de ter
compaixão da grande cidade de Nínive, onde há mais de cento e vinte mil seres
humanos, que não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua mão esquerda”
(Jn 3, 10 ss). Deus deve fazer mais esforço para convertê-lo, o pregador, do
que para converter todos os habitantes de Nínive!
Amor, então, pelos homens. Mas também e acima de
tudo amor por Jesus. É o amor de Cristo que nos deve motivar. “Me amas? – disse
Jesus a Pedro – Apascenta as minhas ovelhas” (cf. Jo 21, 15 ss). É preciso amar
a Jesus, porque só quem está apaixonado por Jesus pode proclamá-Lo ao mundo com
profunda convicção. Só se fala com paixão daquilo que se está apaixonado.
Proclamando o Evangelho, tanto com a vida quanto
com as palavras, nós não damos a Jesus só a glória, damos-lhe também alegria.
Se é verdade que “a alegria do Evangelho preenche o coração e a vida daqueles
que se encontram com Jesus[8]”, é verdade também que quem difunde o Evangelho
enche de alegria o coração de Jesus. A sensação de alegria e bem-estar que uma
pessoa experimenta ao sentir de repente voltar o fluxo da vida em um dos seus
membros, até então inerte ou paralizado, é um pequeno sinal da alegria que
Cristo experimenta quando sente o seu Espírito voltar a vivificar algum membro
morto do seu corpo.
Há, na Bíblia, uma palavra que eu nunca tinha
notado antes: “Como o frio da neve no tempo da colheita é o mensageiro fiel
para com os que o enviam; ele refrigera a alma do seu Senhor” (Pv 25, 13). A
imagem do calor e do frio faz pensar em Jesus na cruz gritando: “Tenho sede!”.
É ele o grande “ceifeiro” sedento de almas, que somos chamados a refrescar com
o nosso humilde e devoto serviço ao Evangelho. Que o Espírito Santo, “principal
agente da evangelização”, nos conceda dar a Jesus esta alegria, com as palavras
ou com as obras, segundo o carisma e a tarefa que cada um de nós tenha na
Igreja.
Pe. Raniero
Cantalamessa, OFMCap.
_____________________________________________
[1] B. Paulo VI, Evangelii nuntiandi, nr. 75.
[2]
O slogan é de Marshall McLuhan, Understanding Media. The Extensions of
Man, Mc Graw Hill, New York 1964.
[3] DV, 2.
[4] Gregorio Magno, Omelie sul Vangelo, XVII.
[5]
A. von Harnack, Die Mission und Ausbreitung des Christentums in den ersten drei
Jahrhunderten, Hinrichs, Leipzig 1902; ed. it. Missione e propagazione
del cristianesimo nei primi tre secoli, Cosenza 1986, rist. 2009, pp.
321s.
[6] EN, 41.
[7] Celano, Vita Seconda, CXXIII, 164 (FF, 749)
[8] Papa Francisco, Evangelii gaudium, 1.
______________________________________
Tradução:
Thácio Siqueira
ZENIT
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