Este
capítulo da coleta de assinaturas para uma proposta de “reforma política”
redigida por uma “coalizão” com entidades de esquerda, sindicais, corporativas
e eclesiais parece ter sido encerrado no último dia 20 de maio. Houve a entrega
do projeto de reforma política apoiado por esta Coalizão ao Congresso Nacional,
com cerca de 630.000 assinaturas, entre presenciais e eletrônicas.
Não quero
discutir mais os defeitos e a linha ideológica do projeto. Já o fiz diversas
vezes em outros artigos publicados aqui mesmo, como este , este, este e este. Como já foi dito, não se nega nem
a necessidade de fazer-se, no Brasil, uma reforma política urgentemente, nem a
necessidade de repensar a forma de financiamento de campanha. Mas incomoda aos
católicos a adoção, por parte de uma instituição eclesial, de um determinado
modelo em preferência a todos os outros, sem claras razões de fé e moral, a
apontar pendores estritamente ideológicos em matéria opinável. Mas a meditação
agora é outra.
Como foi
possível reunir tão poucas assinaturas?
Trata-se
de pensar como foi possível que uma coalizão que existe há mais de três anos, e
que é composta por entidades como a OAB e a CNBB, não tenha conseguido chegar
senão a pouco mais de um terço do número mínimo de assinaturas necessárias
para que a proposta se transformasse em projeto de lei de iniciativa popular. É
interessante proceder a esta reflexão, até por um imperativo bíblico: sempre
foi critério, para reconhecer uma eventual profecia ruim, examinar os
respectivos frutos.
Nem falo
aqui dos descaminhos da esquerda bolivariana em toda a América Latina. Estes
são por demais visíveis: falência dos respectivos países em que se instalou,
aumento da violência e da miséria, destruição dos respectivos regimes
democráticos e instauração de ditaduras que se proclamam “populares e
libertadoras”, mas cujos frutos estão bem claros para quem os quiser enxergar.
Devemos lutar para que esta situação jamais se instale no Brasil.
Mas falo
agora das lições que devemos refletir, nós católicos, sobre a forma com que
este episódio foi conduzido, para que possamos amar mais verdadeiramente a
Igreja, compreendê-la mais a fundo e colaborar efetivamente para a sua
santificação, que é o objetivo de todos, leigos e clérigos igualmente. Não
podemos pecar, nem por atos, nem principalmente por omissão.
Avaliando
a quantidade de assinaturas, nota-se que não foi, nem de longe, representativa
de qualquer popularidade da ideia entre os fiéis católicos. Ponderemos que o
último Censo, bem como as últimas pesquisas populacionais do IBGE, apontam que
cerca de 64% da nossa população é de católicos. Seriam cerca de 132 milhões de
católicos no país, dos quais pelo menos 30% declara ir à missa todos os
domingos – cerca de quarenta milhões de pessoas.
Assim,
apesar de dispor de um rebanho deste porte, e de contar com várias entidades
que se declaram “representativas” e “populares”, ao longo de três anos a
Coalizão só conseguiu convencer um grupo de “assinantes” que representa menos
de 1,5% dos católicos que vão à missa todo domingo, e menos de 0,4% do total de
brasileiros que se declaram católicos. Considerando que há diversas assinaturas
obtidas por outros membros da Coalizão, como a OAB e diversos órgãos de classe
e associações feministas e de “gênero”, isto significa que muito mais do que
99,6% dos católicos não assinaram o documento, ou que pelo menos 98,5% dos
católicos que costumam ir à missa no domingo não o fizeram.
Ainda que
se descontem deste total os católicos que não são eleitores, como os mais
idosos e os adolescentes, a proporção ínfima deve ser bem significativa: os
católicos, em massa, rejeitam as ideias da Coalizão. Então o assunto acabou.
Não se
alegue que a Coalizão, por qualquer motivo, não teve acesso ao grosso dos
católicos. Se isto de fato ocorreu, é uma notícia muito animadora para nós,
leigos. Isto significa que este setor da Igreja que se quer “popular” ou
“social”, e que se comprometeu com este setor ideológico da política
brasileira, não tem, nem de longe, a relevância numérica que ele próprio
acredita ter, entre os bispos. Não podemos duvidar que nossos santos bispos têm
o poder de mover milhões de pessoas em direção á verdade de Jesus. Ora, somente
a Jornada Mundial da Juventude colocou três milhões de católicos numa praia do
Rio de Janeiro, ano passado. Esta coalizão, em três anos, e valendo-se de
inúmeras ONGs além da CNBB, não conseguiu ultrapassar os seiscentos mil
apoiadores – alguns dos quais, inclusive, pode-se supor, apenas católicos
devotos que assinaram por temor reverencial, e não por convicção política.
Restar-nos-ia
concluir, caso optemos pela primeira resposta, que este projeto da Coalizão tem
uma esmagadora rejeição entre os católicos. Qualquer plebiscito que termine
com um resultado de 99,6% contra 0,4% encerra qualquer debate. Perdeu.
Caso a
interpretação seja a de que a Coalizão de alguma forma não teve acesso ao
grosso da população católica para obter suas assinaturas, deve-se então
concluir que a imensa maioria dos bispos agiu com extrema sabedoria e prudência
neste assunto, e que simplesmente não apoia a atuação da Coalizão. De fato,
pesquisando-se na Internet, descobre-se facilmente que não mais que meia dúzia
de bispos estão com seus nomes vinculados a esta proposta, e nem todos dentre
estes declararam-se incondicionalmente favoráveis. Quanto aos outras
quatrocentos e tantos bispos, se simplesmente não deram prosseguimento prático
a este intento nas suas próprias dioceses, estão demonstrando o que sempre se
soube: o pastoreio efetivo do rebanho, no final das contas, cabe a cada Bispo
em sua Igreja particular, e não às Conferências Episcopais nacionais como
instituição colegial. Estas são sempre estruturas de apoio, de diálogo, não de
substituição. A verdade na Igreja Católica jamais foi decidida e defendida no
voto. Mas é muito bom ver que ela pode prevalecer estrondosamente mesmo quando
é submetida ao voto.
Há
notícias de que este abaixo-assinado parece ter circulado efetivamente em
pouquíssimas dioceses. Não tenho dados concretos. Mas se isto ocorreu, foi
um grande alento para nós, católicos: nossos pastores exercem, muitas vezes
heroicamente, silenciosamente, seu pastoreio efetivo dentro das respectivas
dioceses, onde são assistidos pelo Espírito Santo; e são sábios o suficiente
para fazer com que projetos inadequados como este simplesmente não vinguem, por
simples falta de apoio prático, poupando o rebanho da exposição pública das
eventuais dissidências eclesiais frente a um ou outro mais entusiasmado neste
ou naquele caminho político.
É aí que
se mostra a força da Igreja: na sua aparente fraqueza.
É hora,
pois, de louvar o fim deste procedimento. Acabou. Que bom. Que morra assim,
silenciado e superado, para que a Igreja inicie, no Brasil, um novo capítulo de
sua história. Embora, é claro, as notícias veiculadas no próprio site da
Coalizão nos ameace com a continuação deste abaixo assinado. O que
seria, no entanto, um absurdo lógico: ninguém entrega ao legislativo
federal um abaixo assinado que ainda não terminou. Isto não seria sério.
Ninguém levaria a sério.
Mas não
podemos ficar desatentos: a crise política no país é gravíssima, e está longe
de terminar. Precisamos deste mesmo trabalho silencioso e santo para manter a
Igreja no seu rumo divino. Mas precisamos mais: queremos ser efetivamente
Igreja, queremos ser ouvidos e representados, nós, os 99,6% de silenciosos.
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ZENIT
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