Tendo sido eleito Bispo de Santo André-SP, em
minhas orações e reflexões pensei sobre o ministério episcopal, colocando por
escrito esta reflexão que está sendo oferecida ao povo da Diocese, (na forma
popular de pergunta e resposta), neste período preparatório para a posse
canônica, que se dará dia 26 de julho às 16h00 na Catedral Nossa Senhora do
Carmo. Compartilho aqui este texto que talvez possa servir aos irmãos e irmãs
que o lerem.
1. Como Deus
manifesta seu amor por nós?
De dois modos Deus dá prova de seu amor: a) Criando
e sustentando o mundo. b) Salvando o mundo através de seu Filho Jesus Cristo,
que se encarnou, morreu na cruz e ressuscitou, e de junto do Pai enviou o
Espírito Santo para formar a Igreja. Ela “é o Povo reunido na unidade do Pai e
do Filho e do Espírito Santo” (Vat. II - LG 4). Na Igreja as pessoas podem se
encontrar com Cristo, e por meio dele tornarem-se irmãos e filhos do mesmo Pai.
Na Igreja, pela fé batismal, se vive a comunhão libertadora do mal, do pecado e
da morte.
2. Qual é a
missão da Igreja?
A Igreja é missionária por natureza. Tem a missão
de anunciar o Reino de Deus como fez Jesus que é a luz dos povos (Lc 2,32). Ele
confiou à Igreja a missão, o poder e a obrigação de levar a luz do Evangelho a
toda criatura (Mc 16,15). A Igreja cumpre sua missão através da pregação da
Palavra, testemunho de fé, vivência da caridade e celebração dos santos
mistérios (sacramentos). A Igreja não é uma sociedade qualquer, ela é humano-divina,
brota do Mistério da Trindade. Por isso, não deve haver separação entre Cristo,
Reino e Igreja. A Igreja é comunhão de vida na fé, esperança e amor fraterno.
Advogada dos pobres e defensora da vida, porque defensora dos direitos de Deus
criador: “A Igreja é coluna e sustentáculo da verdade” (1Tm 3,15).
3. Como
podemos saber que Jesus Cristo é a cabeça do corpo que é a Igreja?
São Paulo deixou escrito sobre Jesus: “Ele é a
cabeça do corpo que é a Igreja” (Col 1,18); “Deus colocou tudo debaixo dos pés
de Cristo, e o constituiu acima de tudo como Cabeça da Igreja, que é seu
corpo...” (Ef 1,22); Jesus ressuscitado envia de junto do Pai o Espírito Santo
(cf. At 2,23) e “neste Espírito todos fomos batizados para formar um só corpo”
(1Cor,12,13), por isso, “...embora muitos, somos um só corpo em Cristo” (1 Cor
12,12). Ninguém pode dizer que ama a cabeça (Cristo), sem amar o corpo
(Igreja). “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5,25).
4. Como está
organizada a Igreja?
O Pai projeta a Igreja, Jesus a funda e é seu
Senhor, o Espírito Santo a dirige. A Igreja Povo de Deus não é, porém, uma
corrente de idéias, uma ONG, mas uma sociedade organizada a partir da fé.
Organizada porque “Cristo é nossa paz!” (Ef 2,14), nosso Deus não é Deus de
confusão. Na Igreja deve reinar a paz e o amor fraterno. Na Igreja existem
vários carismas, ministérios, serviços, em vista do bem comum de todo o corpo
da Igreja (1Cr 12, 4-11). Jesus instituiu os Apóstolos para governar a Igreja e
lhes deu poder (cf. Mt 28,18). “Quem vos ouve a mim ouve, quem vos despreza, a
mim despreza” (Lc 10,16). Os apóstolos, nos quais está fundada a Igreja,
seguindo os passos de Cristo, pregaram a Palavra da Verdade e fundaram as
comunidades, a Igreja. “É dever de seus sucessores perenizar esta obra” (Vat.
II - AG 1).
5. O Bispo
continua hoje a missão dos apóstolos?
O Concílio Vaticano II ensina que Jesus constituiu
o governo de sua Igreja da seguinte maneira: os bispos como sucessores dos
apóstolos, junto com o papa sucessor do apóstolo Pedro. Eles por mandato divino
regem a Igreja que é a Casa de Deus. Jesus enviou os apóstolos assim como ele
foi enviado (cf. Jo 20,21). Para que o episcopado fosse uno e indiviso, Jesus
colocou S. Pedro como princípio da unidade de fé e comunhão na Igreja. O papa
preside a Igreja na caridade e é cabeça do colégio dos bispos (cf. Mt 16,18).
Os apóstolos portanto, deixaram sucessores e eles são os bispos. Na nossa
Igreja Católica esta corrente é legítima e nunca se rompeu. A sucessão
apostólica foi transmitida de forma contínua até nossos dias. Assim o principal
ministério na Igreja é o dos bispos que conservam a semente do ministério
apostólico (cf. CDC cân. 375). Desde o século II é doutrina admitida sem
nenhuma dúvida que o bispo é legítimo sucessor dos apóstolos, princípio e
fundamento visível da unidade em sua própria Igreja.
6. Qual o
testemunho da Igreja dos primeiros tempos sobre o bispo?
A partir da Sagrada Escritura que fala do bispo
(epíscopo em grego igual a supervisor – cf. 1Ti 1,7-9), Santo Irineu no ano 140
atesta que a fé dos apóstolos é guardada pelos bispos, instituídos pelos
apóstolos e seus sucessores até nós (cf. Ad. Haer. III 2,2). São Cipriano de
Cartago no ano 258, nos ensina: “A Igreja é povo unido e rebanho que adere a
seu pastor. Em consequência, devemos compreender que o bispo está na Igreja e a
Igreja está no bispo, e que se alguém não está com o bispo, não está com a
Igreja” (Epistola 66,8.3). Vê-se assim que entre os fiéis dos primeiros
séculos, a figura do bispo já tinha o destaque necessário que chegou até nossos
dias. Nos bispos que recebem a plenitude do sacerdócio, nos presbíteros e
diáconos, seus auxiliares, Jesus sinaliza que cumpre sua promessa de estar
conosco, com a Igreja, até o fim dos tempos (cf. Mt 28,20).
7. Quais são
os ofícios e tarefas dos bispos?
É o próprio Jesus Cristo que age na Igreja através
de seus ministros. Para isso os bispos recebem a efusão dos dons do Espírito
Santo, mediante a imposição das mãos (desde os tempos apostólicos) na ordenação
episcopal (cf. At 1,8; Jo 20,22-23; 2Tm 1, 6-7). O bispo recebe a plenitude do
sacramento da Ordem para ser ministro de Cristo e dispensador dos mistérios de
Deus e garantia da unidade de sua Igreja (cf. 1Cor 4,1); dar testemunho do
Evangelho pela pregação (cf. Rm 15,16), administrar a justiça e o Espírito (cf.
2Cor 3,8-9). A sagração episcopal confere ao bispo a tarefa de santificar,
ensinar e governar a Igreja que lhe é confiada. O Concílio Vaticano II assim se
expressa: “Os Bispos, pois com seus auxiliares, os presbíteros e diáconos,
receberam o encargo de servir a comunidade, presidindo no lugar de Deus ao
rebanho do qual são pastores, como mestres da doutrina, sacerdotes do culto
sagrado e ministros do governo” (LG n. 20).
8. Como o
bispo deve exercer sua tarefa de presidir a Igreja?
A palavra chave para entender a missão do bispo é o
serviço. Jesus veio para servir: “Eu estou no meio de vós como aquele que
serve” (Lc 22,27). “Mediante a imposição das mãos e as palavras da consagração
é concedida a graça do Espírito Santo e impresso o caráter sagrado de tal modo
que os bispos, de maneira eminente e visível, fazem as vezes do próprio Cristo,
Mestre, Pastor e Pontífice e agem em seu nome” (Vat. II – LG n. 21). Ensinar:
são mestres, pregoeiros e guardiões da fé que deve ser crida e praticada;
vigilantes, devem afastar os erros que ameaçam o rebanho (2Tm 4,1-4).
Santificar: o bispo santifica seu povo rezando por ele, presidindo os
sacramentos mormente a Eucaristia e edificando a todos com o exemplo de sua
vida. Governar: o bispo tem autoridade para dirigir, organizar, legislar e
administrar o que se fizer necessário para edificar e favorecer o rebanho. Para
isso ele tem poder próprio, ordinário e imediato visando sempre a utilidade dos
fiéis e o bem da Igreja. Na perspectiva do Reino de Deus o maior é o que serve
(cf. Mc 10,43).
9. Como deve
ser o relacionamento dos fiéis com o bispo?
Na Igreja todos tem verdadeira dignidade a partir
do batismo. O bispo, pastor do rebanho, não vê os fiéis numa condição de
inferioridade ou passividade, mas como colaboradores, discípulos e missionários
como todos os batizados devem ser. Assim, o carisma episcopal que comporta um
verdadeiro poder conferido por Cristo, é um poder-serviço ao Povo de Deus. Os
fiéis devem ver no bispo um pai: “Da mesma forma, sabem que tratamos cada um de
vocês como um pai trata seus filhos” (1Tes 2,11). O bispo deve apascentar com
cuidado, “não pela força mas de livre vontade como Deus o quer” (1Pd 5,2). A
atitude dos fiéis em relação a seu bispo deve partir da fé em Jesus Cristo, o
Supremo Pastor, de quem o Bispo faz as vezes e representa. Deve ser uma atitude
de respeito, acatando a seus ensinamentos e colaborando com ele em tudo, para
que o bispo possa cumprir fielmente sua missão de amar e servir, em nome de
Jesus, o rebanho que lhe foi confiado. Os fiéis devem levar em conta que
misteriosamente, é Cristo que escolhe o bispo, assim como livremente escolheu
os apóstolos: “Não fostes vós que me escolhestes mas eu que vos escolhi” (Jo
15,16; cf. Mc 3,13).
10. Quais
são os símbolos episcopais e seu uso na liturgia?
Torna-se necessário dizer uma palavra, sobre alguns
símbolos recebidos pelo bispo no dia de sua ordenação episcopal e que lhe são
próprios e expressam seu ofício. Símbolos de uso comum dos bispos, cujo
significado muitas vezes, é desconhecido da maioria dos fiéis (cf. Dic.
Litúrgico, R. Berger, Loyola, 2005).
Báculo:
Bastão ou cajado, símbolo do poder-serviço e da missão de pastor. Tem uma
extremidade curva para puxar as ovelhas mais perto, impedindo que se dispersem,
e a outra extremidade reta ou pontuda para defender dos lobos. É usado somente
nas funções litúrgicas.
Mitra:
símbolo da santidade e poder espiritual. Com suas duas pontas voltadas para o
alto indica a pertença a Deus. Com suas duas partes separadas e duas ínfulas
(fitas que caem para traz), é símbolo da Antiga e Nova Aliança. Simboliza
também o capacete usado para defender a fé. É usada somente nas funções
litúrgicas.
Anel: É
sinal de união e fidelidade eternas. Sinaliza o dever do bispo, de ser guardião
da aliança de amor entre Cristo esposo, e sua esposa a Igreja (Diocese a ele
confiada), mantendo-a fiel na unidade e amor. É usado sempre pelo bispo.
Cruz
peitoral: A cruz é símbolo universal da mediação e do mediador (Jesus) como
duas ligações de pontos opostos. A partir da ressurreição, a cruz se torna
sinal da vitória sobre a morte, e da vida nova em Cristo, a qual o bispo,
sucessor dos apóstolos, deve anunciar. Usada sempre pelo bispo.
Solidéu:
barrete em forma de calota de cor roxa que substitui a tonsura (corte de cabelo
de forma redonda) a qual simboliza a total consagração da vida a Deus. É uma
peça não só litúrgica do vestuário episcopal, pode ser usada fora das
celebrações.
Cátedra:
Cadeira ou cátedra episcopal em lugar fixo e destacado no presbitério da igreja
Catedral (que se chama assim porque tem a cátedra episcopal, por isso também é
a igreja mãe da Diocese). A cátedra significa o ofício do bispo de presidir e
governar sua Igreja, a Diocese.
Lema:
Divisa, norma ou sentença curta que resume um ideal a ser atingido. Geralmente
os bispos escolhem um versículo da Sagrada Escritura para iluminar todo o seu
ministério. O lema de Dom Pedro é: In nomine Iesu - Em nome de Jesus (Cl 3,17)
Brasão:
Figura heráldica que compõem o distintivo de famílias, cidades, corporações ou
indivíduos. Nela aparecem elementos, cores e ornatos como símbolos
significativos, os quais no conjunto, compõem um programa de vida. É um
logotipo ou logomarca.
Dom Pedro
Carlos Cipollini
Bispo eleito
de Santo André (SP)
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