Estas palavras, lidas na leitura da Missa da Noite, dão bem o sentido
da presente celebração. Nasceu para nós um Menino; foi-nos dado um Filho! Vamos
encontrá-lo pobrezinho e frágil, deitado na manjedoura, alimentado por uma
Virgem Mãe, guardado por um pobre carpinteiro. Mas, quem é este Menino? Quem é
este Filho? Agora, com o sol já claro e alto, podemos enxergar melhor o
Mistério: meditemos bem sobre o que celebramos na noite de ontem para hoje, no que
professamos neste dia tão santo!
Este menininho, a Escritura nos diz que ele é a
Palavra eterna do Pai: esta Palavra “no princípio estava com Deus… e a
Palavra era Deus”. Esta Palavra, que dorme agora no presépio, depois de ter
mamado, é aquela Palavra poderosa pela qual tudo que existe foi feito, “e
sem ela nada se fez de tudo que foi feito”. Esta Palavra tão potente, feita tão
frágil, esta Palavra que sempre existiu e que nasceu na madrugada de hoje, esta
Palavra que é Deus, feita agora recém-nascido, é a própria Vida, e esta Vida é
a nossa luz, é a luz de toda humanidade. Fora dela, só há treva confusa e
densa! Sim, fora do Deus feito homem, do Emanuel, não há vida verdadeira! O
Autor da Carta aos Hebreus, na segunda leitura, diz que, após ter falado aos
nossos pais de tantos modos, Deus, agora, falou-nos pessoalmente no seu
Filho, “a quem ele constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual
também criou o universo”; somente a ele, o Pai disse: “tu és o meu Filho,
eu hoje te gerei!” Por isso, somente eles nos dá o dom da vida do próprio Deus!
Eis o mistério da festa de hoje: nesta criancinha
nascida para nós, Deus visitou o seu povo, Deus entrou na humanidade. Que
mistério tão profundo: ele, sem deixar de ser Deus, tornou-se homem
verdadeiramente. Deus se humanizou! Veio desposar a nossa condição humana, veio
caminhar pelos nossos caminhos, veio experimentar a dor e a alegria de viver
humanamente: amou com um coração humano, sonhou sonhos humanos, chorou lágrimas
humanas, sentiu a angústia humana… Ele, Filho eterno do Pai, tornou-se filho
dos homens para salvar toda a humanidade, “tornou-se de tal modo um de
nós, que nós nos tornamos eternos!”
Ó criatura humana, por que temes com a vinda do
Senhor? Ele não veio para julgar ninguém. Não nasceu para condenar. Por isso
ele apareceu como criancinha e não como um rei potente; pode ser encontrado na
manjedoura, não no trono. Seu chorinho é doce, não afugenta ninguém. Sua mãe
enfeixou seus bracinhos frágeis: por que ainda temes? Ele não veio armado para
punir. Ele está aí franzino para ficar junto de nós e nos libertar! Celebra,
pois, a chegada do teu maior Amigo! Canta Aquele que foi sempre, no sono e na
vigília, esperado e ansiado, o guarda de Israel, o consolo da humanidade, o
alento do nosso coração. Ele chegou, finalmente! Chegou para nunca mais nos
deixar, porque desposou para sempre a nossa pobre humanidade! São Jerônimo, com
palavras cheias de ternura, medita sobre este mistério: “O Cristo não
encontra lugar no Santo dos Santos, onde o ouro, as pedras preciosas, a seda e
a prata reluziam: não, ele não nasce entre o ouro e as riquezas, mas nasce num
estábulo, na lama dos nossos pecados. Ele nasce num estábulo para reerguer os
que jazem no meio do estrume: ‘Ele retira o pobre do estrume’. Que todos os pobres
encontrem nisso consolo! Não havia outro lugar para o nascimento do Senhor, a
não ser um estábulo; um estábulo onde se achavam amarrados bois e burros! Ah!
Se me fosse dado ver este estábulo onde Deus repousou! Na realidade, pensamos
honrar o Cristo retirando o presépio de palha e substituindo-o por um de prata…
Para mim tem mais valor justamente o que foi retirado: o paganismo merece prata
e ouro. A fé cristã merece o estábulo de palha. Pois bem! Ouvimos a criança
choramingar no estábulo: adoremo-la, todos nós, no dia de hoje. Ergamo-la em
nossos braços, adoremos o Filho de Deus. Um Deus poderoso, que por longo tempo,
bradou alto dos céus e não salvou ninguém: agora choramingou e salvou. A
elevação jamais salva; o que salva é a humildade! O Filho de Deus estava no
céu, e não era adorado; desce à terra e passa a ser adorado. Mantinha sob seu
domínio o sol, a lua, os anjos, e não era adorado; nasce na terra, homem, homem
completo, integralmente homem, a fim de curar a terra inteira. Tudo o que não
assumisse de humano, também não salvaria…”
É este o mistério do Santo Natal! Tenhamos o
cuidado de não parar nas aparências, de não ficarmos somente na meiga cena do
Menino, com a Virgem e são José! Este Menino é o Emanuel, o Deus-conosco! Este
Menino veio como sinal de contradição, pois diante dele ninguém pode ser
indiferente: ou se o acolhe, ou se o rejeita: “A Palavra estava no mundo,
e o mundo foi feito por meio dela, mas o mundo não quis conhece-la. Veio para o
que era seu, e os seus não a acolheram. Mas, a todos os que a acolheram, deram
a capacidade de se tornarem filhos de Deus…” Pois bem: acolhamo-la, a Palavra
que se fez Menino, Filho que nos foi dado! Se o acolhermos de verdade, na
pobreza do dia-a-dia, no esforço de uma vida santa, então poderemos cantar com
o salmista: “Cantai ao Senhor Deus um canto novo, porque ele fez
prodígios! O Senhor fez conhecer a salvação, e às nações, sua justiça. Os
confins do universo contemplaram a salvação do nosso Deus. Aclamai o Senhor
Deus, ó terra inteira, alegrai-vos e exultai!”
Vamos todos! Sejamos testemunhas da graça deste
dia, da novidade desta festa. E cumpram-se em nós as palavras da Escritura na
leitura da missa de hoje: “Como são belos, sobre os montes, os pés do
mensageiro que anuncia a paz, de quem anuncia o bem e prega a salvação e diz a
Sião: o teu Deus reina! O Senhor consolou o seu povo! O Senhor desnudou seu
santo braço aos olhos de todas as nações; todos os confins da terra hão dever a
salvação que vem do nosso Deus”. Sejamos mensageiros dessa paz, dessa boa nova,
sejamos testemunhas do Menino, irradiemos a graça do Santo Natal! Amém.
Dom Henrique
Soares da Costa
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Presbíteros
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