O Tempo do Advento vivido pela Igreja e oferecido ao mundo como apelo à conversão é cheio de ensinamentos, correspondentes às realidades de nossa fé. Séculos se passaram, gerações e gerações de homens e mulheres plantaram e alimentaram a esperança, aguardando o cumprimento das promessas de Deus. Os profetas foram arautos da benevolência de Deus, cujo carinho e cuidado se refletia na atenção com aquele povo limitado e ao mesmo tempo teimoso na expectativa da realização dos planos de Deus.
Os tempos amadureceram e Deus realizou suas promessas, de forma surpreendente para todos os atores envolvidos na magnífica trama, cujas cenas se repetem diante dos olhos do mundo, nos presépios, pinturas, filmes, encenações teatrais, todas tentativas justificadas de uma aproximação ao mistério, que supera continuamente os nossos esforços. Por mais que nos empenhemos em penetrar nas páginas dos evangelhos, sempre estas nos superarão, pois se trata de realidades pensadas desde toda a eternidade. Possuí-las completamente seria pretender-nos maiores do que o próprio Deus. Surpresas fazem parte da revelação, processo que se completou com o final da era apostólica, mas se torna dom para cada pessoa de fé. A nós, na presente geração, cabe a abertura ao mistério, deixar que o coração se abra à perene novidade de Deus. Ninguém pretenda que a Bíblia esteja fechada, mas acolha continuamente a beleza do que Deus pode e quer oferecer-nos. Basta começar a aventura que começa com a profissão de fé no amor eterno de Deus.
A plenitude dos tempos aconteceu com a vinda do Salvador do mundo, nascido de uma mulher, como ensina o Apóstolo São Paulo: “Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que eram sujeitos à Lei, e todos recebermos a dignidade de filhos” (Gl 4, 4-5). Não é que os tempos amadureceram por si, mas o amor de Deus os fez completos, quando enviou o seu Filho ao mundo. A mulher que participou de perto, em nosso nome, da realização do mistério, é a Virgem Maria. Sua aventura pessoal foi de extrema simplicidade e, por isso mesmo, decisiva profundidade! Recebeu um anúncio, cujos detalhes certamente superam a aproximação da narrativa evangélica, especialmente nos descritos de São Lucas. Acredita-se que este evangelista tenha estado bem perto de Maria, com a qual teria dialogado, para descobrir coisas que só podiam vir das fímbrias do coração da Mãe.
Algumas atitudes de Maria nos fazem entrever a grandeza do mistério. Sua humanidade tinha sido muito preservada, certamente pela formação recebida de seus pais, Joaquim e Ana. Seu modo de agir e o canto do Magnificat revelam uma alma aberta para Deus, pronta para dar a grande resposta, em nome de todos os homens e mulheres, carentes da salvação que vem do alto. A viagem às montanhas de Judá foi feita com a presteza de quem se dispõe a servir e fazer o bem. Os três meses passados com Isabel, na preparação próxima do nascimento de João Batista foram vividos na dedicação, orvalhados de oração e diálogo, partilha sincera a respeito da obra realizada por Deus na alma daquelas duas mulheres, gerações diversas que se faziam uma coisa só, ligadas pelos laços do mistério.
Isabel, por sua vez, tinha amadurecido junto com seu esposo Zacarias, com a fé expectante e corajosa, capaz de enfrentar os sofrimentos, dos quais o maior terá sido a esterilidade, no meio de um povo desejoso de ver nascer em algum dos lares o Messias prometido. Uma de suas características, revelada esta pelas palavras pronunciadas à chegada de Maria, era a visão de fé, capaz de superar as aparências. De sua boca veio a primeira bem-aventurança: “Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu” (Cf. Lc 1, 39-45). Seu marido, sacerdote judaico, participou intensamente da manifestação da obra de Deus. E Maria, retornando a Nazaré, foi plenamente acolhida por José, seu esposo, a quarta figura neste quadro maravilhoso.
Mais do que as palhas da manjedoura, o mistério repousou sobre a aventura de fé vivida por tais personagens, às quais outras tantas se ajuntaram, passando por magos, pastores, anjos e animais do presépio! A maravilha que descobriram e da qual participaram foi o fato de Deus se tornar homem. Descobriram que os primeiros vagidos daquela criança inocente, nascida na pobreza, eram melodia para os ouvidos e o coração da humanidade. A carta aos Hebreus, no trecho proclamado no quarto Domingo do Advento, afirma de forma consoladora e exigente: “Por essa razão, ao entrar no mundo, Cristo declara: “Não quiseste vítima nem oferenda, mas formaste um corpo para mim. Não foram do teu agrado holocaustos nem sacrifícios pelo pecado. Então eu disse: Eis que eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade, como no livro está escrito a meu respeito” (Hb 10, 5-7).
Aquele que está acima dos céus, Deus infinito, que sabemos ser desde toda a eternidade Filho do Pai Eterno, assume uma carne, começa de pequeno, na escola da vontade do Pai. Sendo Filho, aprendeu a obedecer! (Cf. Hb 5,8). “Ele, existindo em forma divina, não se apegou ao ser igual a Deus, mas despojou-se, assumindo a forma de escravo e tornando-se semelhante ao ser humano. E encontrado em aspecto humano, humilhou-se, fazendo-se obediente até a morte – e morte de cruz! Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome, para que, no Nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, e toda língua confesse: ‘Jesus Cristo é o Senhor’, para a glória de Deus Pai” (Fl 2, 6-11). Ele não se envergonha de nada do que é humano! Só Deus pode ser assim, no meio de um mundo que rejeita pessoas e situações marcadas pela fragilidade e pela pobreza. Em tempo de Jubileu da Misericórdia, preparemo-nos para o Natal sem separar o que é divino do que é humano. E a humanidade fica muito melhor, infinitamente restaurada, por saber que nele e só nele se encontra a esperança!
Dom Alberto Taveira Corrêa,
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará
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