Em entrevista à TV italiana na noite deste domingo (8), o
prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé*, o cardeal alemão Gerhard
Müller, que os conservadores aguardavam como um “trunfo final” contra o Papa,
jogou uma pá de cal em suas pretensões. Apoiou Francisco e a Encíclica Amoris Laetitia sobre a família e enterrou a estratégia
de contrapor o Papa ao emérito Bento XVI, reafirmando unidade entre eles e
dizendo que a iniciativa opera “contra a fé católica”. [Se quiser, veja a
íntegra da entrevista em italiano aqui]
Ele descartou por completo a ideia do cardeal americano Raymond
Burke e seus três aliados (Walter Brandmüller, Carlo Caffarra e Joachim
Meisner) de aplicar uma “correção formal” contra o Papa. “Não haverá nenhuma
correção contra o Papa”, afirmou, completando: “Neste momento não
é possível um correção ao Papa porque não há nenhum perigo para a fé”.
A entrevista foi concedida ao jornalista Fabio Ragona no
programa Stanze
Vaticane (Aposentos
do Vaticano), do canal Tgcom24. O prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé
fez um duro ataque à publicidade que os cardeais deram à sua carta ao Papa com
as “dúbia”: “Qualquer um, sobretudo os cardeais da Igreja Romana, têm direito
de escrever uma carta ao Papa. Mas, com efeito, me surpreendi porque ela se
tornou pública, quase obrigando o Papa a dizer ‘sim’ ou ‘não’. Isto não me
agrada.”
O jornalista perguntou sobre a estratégia conservadora de opor Francisco
e Bento e qual seria a razão da iniciativa persistente. Müller explicou que os
dois “são pessoas diversas, com histórias muito diferentes, experiências
distintas, pessoas de duas culturas diversas, a cultura latino-americana e a
cultura europeia, mas eu penso que é contra a fé católica fazer este contraste
entre o papa emérito e o papa atual”, pois ambos são igualmente “dons de Deus
para a Igreja”.]
O cardeal encerrou a entrevista manifestando seu apoio à Amoris Laetitia: “O
Papa pede um discernimento sobre a situação destas pessoas que vivem uma união
não regular segundo a doutrina da Igreja sobre o matrimônio, o pede ajuda a
estas pessoas para encontrarem um caminho para uma nova integração à Igreja
segundo as condições dos sacramento, da mensagem cristã do matrimônio. Porém eu
não vejo nenhuma contraposição: or um lado temos a doutrina clara sobre o
matrimônio e de outro a obrigação da Igreja de se preocupar com estas pessoas
em dificuldades”.
A reação da mídia conservadora ao redor do mundo, na manhã desta
segunda, oscila entre o silêncio, ao contrário das fanfarras que estavam
desfilando quase diariamente, reportagens discretas que tentam amenizar a
contundência do golpe contra a ideia de uma rebelião até a exasperação aberta
–um padre escreveu num site ultraconservador brasileiro que a entrevista de
Müller é “ABSOLUTAMENTE INACREDITÁVEL!”.
Por Mauro Lopes.
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* A Congregação para a Doutrina da Fé é a sucessora
da Santa Inquisição Romana e Universal, ou Santo Ofício, a mais antiga das
congregações do Vaticano, instituída em 1542 pelo Papa Paulo II. Originalmente
era exclusivamente um de Tribunal para causas de heresia e cisma e, nessa
condição, conduziu a Inquisição. Mais adiante, passou a ser responsável pela
elaboração do Index dos
Livros Proibidos. Com
o tempo, passo a ser a responsável pela difusão e defesa da fé católica. O papa
emérito Bento XVI foi prefeito desta Congregação e, nessa condição, aplicou
punições variadas a dezenas de teólogos que não comungassem da visão
conservadora do catolicismo, entre eles Leonardo Boff, Juan A. Estrada,
José María Castillo, Gustavo Gutiérrez, Jon Sobrino, Andrés Torres Queiruga,
José Antonio Pagola, Ivone Gebara, Margaret Farley… Com Francisco, a
congregação está deixando de ter caráter policialesco-persecutório, mesmo com
um conservador como Müller na condição de prefeito.
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Caminho
pra casa
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