VIAGEM
APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO
A MOÇAMBIQUE, MADAGASCAR E MAURÍCIO
(4 - 10
DE SETEMBRO DE 2019)
ENCONTRO
COM AS AUTORIDADES,
O CORPO
DIPLOMÁTICO E VÁRIOS REPRESENTANTES
DA
SOCIEDADE CIVIL
DISCURSO
DO SANTO PADRE
Ceremony
Building, Antananarivo, Madagascar
Sábado,
7 de setembro de 2019
Senhor Presidente,
Senhor Primeiro-Ministro,
Ilustres membros do Governo e do Corpo
Diplomático,
Distintas Autoridades,
Representantes das Confissões religiosas e da
sociedade civil,
Senhoras e Senhores!
Saúdo cordialmente o Presidente da República
de Madagáscar e agradeço-lhe o amável convite para visitar este país, bem como
as palavras de boas-vindas que me dirigiu. O Senhor Presidente, falou com
paixão, falou com amor pelo Seu povo. Agradeço-Lhe pelo Seu testemunho de
patriota. Saúdo também o Primeiro-Ministro, os membros do governo, do corpo
diplomático e os representantes da sociedade civil. Dirijo uma saudação
fraterna aos bispos, aos membros da Igreja Católica, aos representantes de
outras confissões cristãs e de várias religiões. Agradeço a todas as pessoas e
instituições que tornaram possível esta viagem e, de modo particular, ao povo
malgaxe que nos acolhe com grande hospitalidade.
No preâmbulo da Constituição da vossa República,
quisestes consignar um dos valores fundamentais da cultura malgaxe: o
fihavanana, termo que evoca o espírito de partilha, ajuda mútua e
solidariedade; mas inclui também a importância dos laços familiares, da amizade
e da benevolência entre os homens e para com a natureza. Revelam-se, assim, a
«alma» do vosso povo e os traços peculiares que o caraterizam, constituem e lhe
permitem resistir, corajosa e abnegadamente, às múltiplas contrariedades e
dificuldades que tem de enfrentar diariamente. Se devemos reconhecer, valorizar
e apreciar esta terra abençoada pela sua beleza e inestimável riqueza natural,
não é menos importante fazê-lo também pela «alma» que vos dá a força de
permanecer empenhados com a aina (isto é, com a vida), como bem lembrou o padre
António de Pádua Rahajarizafy SJ.
Depois que recuperou a independência, a vossa
nação aspira à estabilidade e à paz, implementando uma alternância democrática
positiva que testemunha respeito pela complementaridade dos estilos e projetos.
Isto demonstra que «a política é um meio fundamental para construir a cidadania
e as obras do homem» (Francisco, Mensagem para o LII Dia Mundial da Paz, 1 de
janeiro de 2019), quando é vivida como serviço à coletividade humana. Por isso,
é claro que a função e a responsabilidade política constituem um desafio
permanente para quantos têm a missão de servir e proteger os seus compatriotas,
especialmente os mais vulneráveis, e de promover as condições para um
desenvolvimento digno e justo, envolvendo todos os atores da sociedade civil.
Porque, como lembrava São Paulo VI, o desenvolvimento de uma nação «não se
reduz a um simples crescimento econômico. Para ser autêntico, deve ser
integral, quer dizer, promover todos os homens e o homem todo» (Carta enc.
Populorum progressio, 14).
Nesta perspetiva, encorajo-vos a lutar,
vigorosa e decididamente, contra todas as formas endémicas de corrupção e
especulação, que aumentam a disparidade social, e a enfrentar as situações de
grande precariedade e exclusão que geram sempre condições de pobreza desumana.
Daí a necessidade de estabelecer todas as mediações estruturais que possam
garantir uma melhor distribuição do rendimento e a promoção integral de todos
os habitantes, especialmente dos mais pobres. Tal promoção não se pode limitar a
uma mera assistência, mas requer o seu reconhecimento como sujeitos jurídicos
chamados a participar plenamente na construção do seu futuro (cf. Francisco,
Exort. ap. Evangelii gaudium, 204-205).
Além disso, sabemos que não se pode falar de
desenvolvimento integral sem prestar atenção e cuidar da nossa Casa Comum. Não
se trata apenas de encontrar os instrumentos para preservar os recursos
naturais, mas de procurar «soluções integrais que considerem as interações dos
sistemas naturais entre si e com os sistemas sociais. [Porque] não há duas
crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise
socio-ambiental» (Francisco, Carta enc. Laudato si’, 139).
A vossa bela ilha de Madagáscar é rica de
biodiversidade vegetal e animal, e esta riqueza está particularmente ameaçada
pelo excessivo desflorestamento em proveito de poucos; a sua degradação
compromete o futuro do país e da nossa Casa Comum. Como sabeis, as florestas
ainda existentes estão ameaçadas pelos incêndios, a caça furtiva, o corte
desenfreado de madeiras preciosas. A biodiversidade vegetal e animal corre
perigo por causa do contrabando e das exportações ilegais. É verdade que muitas
destas atividades que prejudicam o meio ambiente são as que asseguram,
provisoriamente, a sobrevivência das populações envolvidas. Por isso, é
importante criar ocupações e atividades geradoras de rendimento que respeitem o
meio ambiente e ajudem as pessoas a sair da pobreza. Por outras palavras, não
pode haver verdadeira abordagem ecológica nem uma ação concreta de salvaguarda
do meio ambiente sem uma justiça social que garanta o direito ao destino comum
dos bens da terra às gerações atuais, mas também às futuras.
Todos nos devemos comprometer neste caminho,
incluindo a comunidade internacional. Muitos dos seus representantes estão hoje
aqui presentes. Ocorre reconhecer que a ajuda prestada por estas organizações
internacionais ao desenvolvimento do país é grande e atesta a abertura de Madagascar ao mundo. O risco é que esta abertura se torne uma suposta «cultura
universal» que despreza, enterra e suprime o patrimônio cultural de cada povo.
A globalização econômica, cujas limitações são cada vez mais evidentes, não
deveria conduzir a uma uniformização cultural. Se tomarmos parte num processo
em que se respeita as prioridades e os estilos de vida autóctones e são
honradas as expectativas dos cidadãos, havemos de proceder de modo que a ajuda
fornecida pela comunidade internacional não seja a única garantia do
desenvolvimento do país; há de ser o próprio povo que assumirá progressivamente
o seu controle, tornando-se artífice do seu próprio destino.
Por isso mesmo, devemos prestar uma particular
atenção e respeito à sociedade civil local, ao povo local. Ao apoiar as suas
iniciativas e ações, a voz de quem a não tem tornar-se-á mais audível, bem como
as várias harmonias, mesmo contrastantes, duma comunidade nacional que procura
a sua unidade. Convido-vos a imaginar este percurso, onde ninguém seja deixado
de lado, caminhe sozinho ou se perca.
Como Igreja, queremos imitar a atitude de
diálogo da vossa compatriota, a Beata Vitória Rasoamanarivo, beatificada por
São João Paulo II na visita que vos fez há trinta anos. O testemunho de amor
dela pela sua terra e as suas tradições, o serviço aos mais pobres como sinal
da sua fé em Jesus Cristo mostram-nos o caminho que também nós somos chamados a
percorrer.
Senhor Presidente, senhoras e senhores! Desejo
reafirmar a vontade e disponibilidade da Igreja Católica em Madagascar para,
num diálogo permanente com os cristãos das outras confissões, com os membros
das diferentes religiões e com todos os atores da sociedade civil, contribuir
para o advento duma verdadeira fraternidade que valorize sem cessar o
fihavanana, promovendo o desenvolvimento humano integral de modo que ninguém
fique excluído.
Com esta esperança, peço a Deus que abençoe
Madagáscar e aqueles que aqui vivem, que mantenha pacífica e acolhedora a vossa
linda ilha e a torne próspera e feliz. Obrigado.
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Santa Sé
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