"O acórdão do julgamento que equiparou a
homofobia ao racismo nem foi publicado ainda pelo Supremo Tribunal Federal, mas
o uso do poder público para tentar calar vozes dissidentes já foi colocado em
prática no estado de Pernambuco. O promotor Maxwell Anderson Vignoli, da 7.ª
Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania do Recife, ordenou a instauração
de inquérito para investigar o que seriam “práticas LGBTfóbicas” da parte de um
sacerdote católico, ocorridas em uma missa celebrada em 30 de junho deste ano.
Naquele dia, poucas semanas depois da
conclusão do julgamento no STF que decidiu pela equiparação entre racismo e
homofobia, o padre Rodrigo Alves de Oliveira Arruda divulgou, antes do fim da
missa, um abaixo-assinado em apoio ao Projeto de Decreto Legislativo 404/19,
que buscava suspender ou limitar os efeitos da decisão do Supremo. Na ocasião,
o sacerdote afirmou que o STF promovia “ativismo judicial”, alertando para
possíveis ameaças à liberdade de expressão. “Isso é uma mordaça. Você não pode
ter a expressão de teor religioso, científico, contrário ao que essas pessoas
pensam”, disse o padre, segundo relato do Jornal do Commercio."
"Não podemos descartar que um objetivo
das alas mais radicais do movimento LGBT efetivamente seja a supressão da
liberdade de expressão quando se trata da crítica ao comportamento
homossexual"
"A crítica feita pelo sacerdote,
portanto, dirigiu-se apenas à decisão judicial em si e a possíveis
consequências dela, sem fazer nenhum comentário específico sobre o
comportamento homossexual. Mesmo assim, foi o suficiente para que a ONG LGBT
Leões do Norte buscasse o Ministério Público, baseando-se na reportagem
publicada pelo jornal recifense, e para que o promotor Vignoli determinasse o
início do inquérito para apurar “possíveis violações dos direitos da população
LGBT”, conforme a portaria datada de 4 de outubro e publicada na edição de 15
de outubro do Diário Oficial do MP-PE. Tanto o padre Arruda quanto
representantes da ONG Leões do Norte e da Arquidiocese de Olinda e Recife terão
de prestar depoimento em data ainda não definida.
Ora, até onde se sabe, o direito de discordar
publicamente de uma decisão judicial, da aprovação de um projeto de lei ou de
um ato do Poder Executivo continua em pleno vigor no Brasil. Assim, a mera
abertura de um inquérito motivado por críticas à decisão de junho do STF já
pode ser considerada uma aberração típica de Estados de exceção, motivada por
uma lógica torta. Segundo os ativistas, como a crítica se dirigiu a uma decisão
que beneficia a população LGBT, ela automaticamente configuraria um ato
homofóbico. A isso se chama non sequitur, expressão latina que designa a
falácia lógica em que a conclusão não deriva das premissas.
Estariam os ativistas LGBT e o promotor
Vignoli ignorando que a crítica pública a uma decisão judicial é direito
garantido constitucionalmente? Não nos parece que eles desconheçam as garantias
da liberdade de expressão, e nem da liberdade de consciência e de crença,
protegidas em diversos dispositivos ao longo da Carta Magna. E seria
inverossímil que um grupo militante da causa homossexual desconhecesse o voto
do ministro Celso de Mello, relator da ADO 26, que explicitamente salvaguardou
a liberdade religiosa, afirmando que “a livre expressão de ideias de
pensamentos e convicções em sede confessional não pode e não deve ser impedida
pelo poder público, nem pode ser submetida a ilícitas interferências do Estado,
de qualquer cidadão ou instituição da sociedade civil”. Por isso, temos de
perguntar: o que desejam, afinal, os militantes que pedem a investigação do
padre Arruda?"
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