Lula, o presidiário que presidiu o Brasil, foi autorizado pelo seu ex-advogado Dias Toffoli, que foi por ele indicado para o STF e que hoje preside a Suprema Corte, a acompanhar o funeral de seu irmão, Vavá. Porém, Toffoli não permitiu celulares, nem imprensa, nem declarações públicas de Lula. Lula desistiu.
Ou seja, Toffoli tratou o funeral do irmão de Lula como o que é: um funeral, não um necromício. Sempre que se diz que A = A, na clássica proposição aristotélica, a esquerda tem um siricutico de proporções continentais.
O pedido já havia sido negado pela juíza federal Carolina Lebbos, da 12ª Vara Criminal de Curitiba, e pelo desembargador de plantão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Leandro Paulsen. Apesar de Lula ser o presidiário mais gourmetizado do país, com uma miríade de regalias que estão acima da lei (Lula fica assistindo TV de alta definição o dia inteiro, tem duas horas de banho de sol por dia, recebe visitas políticas indefinidamente etc), havia um impedimento: os helicópteros da PF que poderiam levar Lula de Curitiba para São Bernardo estão sendo usados para resgatar as vítimas de Brumadinho (MG).
O PT de Lula é o mesmo de Dilma Rousseff e de Fernando Damata Pimentel, estes dois últimos mineiros que têm a lama de Brumadinho até o pescoço. Aliás, Dilma, que era presidente quando do desastre de Mariana, demorou sete dias para dar uma sobrevoada na região: comparativamente, seria como se fosse a Brumadinho apenas na próxima sexta-feira, dia 1.º de fevereiro. Mesmo assim, em acordo com o índice de prioridades do PT, o partido se ofereceu para fretar um avião para seu Supremo Líder sair da cadeia. A PF, obviamente, recusou a “oferta”.
Foi o suficiente para alguém como Ricardo Noblat, um dos jornalistas mais petistas do país, especializado em espalhar fake news modelo “Temer vai renunciar hoje”, ter uma turica devastadora e metralhar um ataque de pelancas digno da nova revista Veja para a qual trabalha (antes, o jornalista foi d’O Globo):
Lula não foi ao enterro do irmão João Inácio em 2004 quando não apenas estava livre, mas era o próprio presidente de República, assim como não foi ao velório do pai. Relata o Conexão Política:
No entanto, esteve presente em Belo Horizonte, participando da Reunião da Cúpula do Mercosul. Participou também de um jantar de confraternização, às 20h, na Granja do Torto, com ministros e assessores, no dia 17 de dezembro, dia seguinte da morte do irmão… dia do velório.
No dia 20 de janeiro de 2005 a Folha de São Paulo noticiou: Irmão do presidente sofre infarto e morre em São Bernardo do Campo. Eis que está escrito: “O presidente não foi ao enterro em São Bernardo por causa de sua viagem à Amazônia e à Colômbia”.
Antes disso tudo, em 1978 morre o pai de Lula… foi enterrado como indigente. Em 1980 Lula, sindicalista truculento, estava preso. Sua mãe faleceu e ele foi liberado para o velório. Cerca de duas mil pessoas acompanharam o velório e pediam “Lula Livre”. Ironicamente o cantor Agnaldo Timóteo protestava chorando: “Porque vocês não prendem os corruptos […]?”
Obviamente, ninguém gritou para prenderem os corruptos no necromício de Vavá, hoje.
O Direito, que deve ser, no mínimo, coerente, ou não é Direito e deve ser substituído, deveria se preocupar com tais fatos para cometer uma nova arbitrariedade a favor de Lula, que até preso continua acima da lei. Como bem lembrou Rafael Rosset:
Em 2002, em plena campanha, Luis Inácio chorou copiosamente para as câmeras de Duda Mendonça. Falava da morte da primeira mulher, falecida 30 anos antes (a despeito do fato de o luto, quando do falecimento, ter sido espantosamente curto – dois anos após a morte de Lourdes, Luis Inácio já estava com família engatilhada ao lado de Marisa Letícia).
Em 2017, também em campanha, transformou o velório da segunda mulher, Marisa Letícia, em comício. E não teve o menor pudor em transformar o cadáver em arma contra seus adversários políticos: “Na verdade, Marisa morreu triste. Porque a canalhice que fizeram com ela… E a imbecilidade e a maldade que fizeram com ela… Eu vou dedicar… Eu tenho 71 anos, não sei quando Deus me levará, acho que vou viver muito porque eu quero provar que os facínoras que levantaram leviandade com a Marisa tenham, um dia, a humildade de pedir desculpas a ela”. Em 2018, Lula transformou sua prisão num circo, com direito a missa campal, showmício e utilização de sindicalistas como escudos humanos.
Agora, coincidentemente num momento em que tenta a todo custo vender uma certa narrativa (como em 2002 e 2017), Luis Inácio cria um inesperado amor fraternal pelo irmão Vavá, morto há dois dias. Interessantemente, a defesa já impetrava HC no TRF4 antes mesmo de a juíza Carolina Lebbos apreciar o pedido de salvo conduto, como se tivesse a certeza de que seria denegado, e estivesse mais preocupada em pautar o noticiário do que efetivamente obter a saída de seu cliente.
Lula, jogado na lata de lixo da história, e o PT, agora deram um passo além na aldrabice: nem se preocupam mais em, digamos, fingir que se tratava mesmo de um velório, ao qual Lula teria sido impedido de ir por um governo autoritário e anti-democrático, para chorar silenciosa e respeitosamente a morte do irmão em seu luto privado e contrito: falaram abertamente em um novo showmício. Em discursos para a nação (ou seja, para a meia dúzia de petistas que ainda se lembram de quem é Lula) para falar de política e de como é “preso político” (parece que chamar o Glen Greenwald não serviu pra nada).
Até quando se tentou rezar, pensando-se num Pai Nosso, os petistas responderam no coro: “Lula livre!” repetido roboticamente. Definitivamente, acreditam que o Pai do Universo é Lula, que criou o Céu e a Terra no princípio, e algum dia voltará para julgar os vivos e os mortos, e seu reino não terá fim.
Está inventado o necromício. O PT havia diminuído o grau de sacralidade e verdade da nação, ao ponto de pessoas extremamente poderosas (como jornalistas de grandes veículos) não darem mais valor à vida desabridamente, amortecendo corações. mas o PT sempre consegue surpreender e descer mais o nível. O necromício foi propalado abertamente.
Defuntos já foram usados como armas políticas: mais exatamente armas químicas. Conta-se que foram os tártaros contendo os avanços de Gengis Khan que primeiro atiraram corpos de mongóis mortos de pragas na própria Horda Dourada com catapultas, durante o cerco de Kafa. Naquela época, ninguém pensava em usar mortos do próprio exército para atacar o inimigo.
É um escárnio com os vivos e os mortos que um necromício seja aventado em público, que jornalistas da Veja o defendam sem sofrerem uma chuva de e-mails exigindo sua demissão, que o Brasil ainda comporte gente que transforme um defunto em uma arma política.
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Senso Incomum
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