segunda-feira, 17 de agosto de 2020

A bondade de Deus tem limites?



A tendência da natureza humana decaída pelo pecado original é ver Deus de maneira unilateral, amando-O não como Ele é de fato, mas como gostaríamos que ele fosse. E, ademais, contemplar exclusivamente aquelas qualidades divinas que não contundem o nosso errado modo de ser. E tudo isso porque a visualização verdadeira de Deus exige uma conversão.

“Deus é tão bondoso, Ele vai ter pena desse pobre coitado”. Quantas vezes ouvimos essa máxima utilizada para justificar ações erradas e pecaminosas. Pecados horrorosos, públicos e advertidos, que são cometidos por esse “pobre coitado” que não quer nem ouvir falar de Deus, de religião e de Igreja. Devemos odiar o pecado e amar o pecador; isso é real, mas, antes de amar o pecador, devemos amar a Deus que é ofendido pelo pecador e ter “pena” do Divino Ofendido.

Devemos amar a Deus porque Ele pune o pecado, e não apenas porque premeia a virtude.

Façamos uma pequena viagem, reportando-nos aos tempos em que a sociedade era governada por monarcas, muitos dos quais, santos. Estamos em uma corte onde mora o rei, nobre varão, que ama seus súditos como filhos, e é amado por todos como verdadeiro pai.

Certo dia, velando pela harmonia de seu reino e atendendo aqueles que vinham apresentar algum problema e pediam o auxílio do rei, apresentou-se, um homem, realmente atormentado, que deixava entrever em seu olhar um ódio assanhado contra o rei, a nobreza, e tudo quanto havia de superior à sua pessoa. Nem mesmo a bondade imensa do olhar da rainha-mãe, que estava ao lado do rei e derramava torrentes de carinho sobre aquele pobre coitado, foi capaz de mudar seu coração odioso.

Após dizer algumas palavras ao santo monarca, não se conteve esse miserável, e, aproveitando-se de uma distração da guarda real, atirou-se sobre a rainha e, desferindo alguns golpes, deixou-a ferida, a ponto de escorrer seu nobre sangue. Rapidamente foi imobilizado pelos guardas e posto diante do rei.

O que fará o monarca? Terá pena desse pobre coitado e despedirá impunemente o agressor de sua bondosa mãe? Mas, não era ele tão misericordioso, será o caso de punir esse coitado? 

Certo dia, um jovem estudante da universidade de Pavia, de um talento extraordinário, mas do nefando número daqueles que profanam tudo que é santo por meio de palavras e atos, fez uma visita, durante as férias acadêmicas, a um de seus amigos do campo. Em uma noite, conforme o seu costume, o jovem ímpio começou a dizer coisas de um cinismo revoltante a ponto de proferir, contra a Santíssima Virgem, Mãe de Deus, as mais grosseiras blasfêmias. Todos que o escutavam ficaram cheios de horror, especialmente a senhora da casa, uma dama piedosa que ordenou que o blasfemador se calasse. A conversa se interrompeu, todos permaneceram calados, e cada um se retirou para seu quarto, sem dúvida, para suplicar a Maria que tivesse piedade desse miserável. Um horrível espetáculo estava para acontecer na manhã seguinte. O jovem estudante não se levantou na hora de costume. Dois de seus colegas foram ao seu quarto, bateram à porta, mas ninguém respondeu. Abriram então, à força, e entraram. Mudos de espanto, encontraram-no morto sobre a cama, e seu cadáver estava preto como um carvão.[1]

Terrível história, mas que mostra bem a justiça de Deus. Não era mais que cabível a punição desse blasfemador empedernido? Não tivera ele muitas oportunidades de arrepender-se de seus pecados?

Com efeito, Deus quis nos dar um reflexo de sua bondade e, assim, deu-nos uma Mãe, Maria Santíssima, repleta desse atributo para que Ela pudesse conferi-lo a todos os homens que se consideram seus filhos. A estes oferece Ela os tesouros de sua insondável misericórdia a fim de resgatá-los e conduzi-los à salvação eterna.

Portanto, atentar contra Maria Santíssima e odiar sua bondade é atentar contra o próprio Deus. Nossa Senhora tem um importante papel na balança da misericórdia e justiça de Deus.

Voltemo-nos para Ela e peçamos para que nossa vida seja conforme ao seu Imaculado Coração. Saberemos, assim, amar a Deus em sua totalidade e em seus mais variados aspectos. De fato, se a Santíssima Virgem é um oceano de bondade, Deus é a bondade infinita mesmo na justiça!


Por Odair Ferreira

[1] Baseado em Dictionnaire d’Exemples, Tome I. Paris: Établissements Casterman.
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Gaudium Press

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