Passou quase despercebida na época, a indicação
feita pelo Papa João Paulo II, de um padroeiro para os políticos. O escolhido
foi S. Tomás Morus, santo inglês nascido em 1477, contemporâneo portanto,
dos albores do mundo moderno em ascensão, com a emergência dos Estados
nacionais e as grandes descobertas.
Tomás Morus foi advogado de formação humanista, pai
de família, membro do parlamento, desempenhou várias missões diplomáticas.
Conseguiu conciliar sua vida cristã autêntica, com carreira política bastante
ativa. Levantava-se bem cedo para rezar, antes de ir para o tribunal. Foi
nomeado pelo rei Henrique VIII, membro do conselho secreto, posteriormente
chanceler do Reino, em 1529, o mais importante cargo de governo abaixo do
rei. Sempre gentil, bem humorado, não deixou de se preocupar, estando no
governo, com a justiça social e a ética.
Sua obra famosa A Utopia, editada em
1516, descreve um Estado imaginário, sem propriedade privada nem dinheiro, um
Estado preocupado com a felicidade coletiva, ou seja: o bem comum. “Com efeito,
ser o único a viver em prazeres e delícias, tendo ao redor pessoas que gemem e
se lamentam, não é ser rei, é ser um guarda de prisão”, ele escreve no Livro Iº
desta obra, ao falar do bom governo e da justiça social.
Qual foi o segredo deste político bem sucedido que
não cedeu à corrupção? Segundo ele mesmo, foi a fidelidade à sua consciência.
Um filme famoso sobre sua vida se intitula a propósito: “O homem que não vendeu
sua alma”. Mesmo sendo amigo do rei, não cedeu ao Act of Supremacy, de 1534 que
colocava o rei como chefe supremo da Igreja da Inglaterra, após ter rompido com
o papa. O papa negara ao rei seu primeiro divórcio, deste divórcio se seguiram
outros tantos, além rainhas por ele executadas, como se sabe.
Tomas Morus foi preso e encarcerado. Na prisão
escreveu uma obra prima da língua inglesa: O diálogo do conforto contra
as tribulações e as memoráveis cartas a sua filha Margaret. Inúteis foram as
tentativas de corrompê-lo, foi fiel à sua consciência até o fim. O tribunal que
o julgou condenou-o a ser decapitado, o que ocorreu em Tower Hill em 06 de
junho 1535. Em 1935 foi canonizado. Sua festa no calendário litúrgico da Igreja
Católica é dia 20 de junho. Corajoso e tranqüilo, ao subir o patíbulo usou
ainda de seu bom humor, para descontrair o carrasco, pesaroso de ter de
executá-lo, disse-lhe: “ajude-me a subir; para descer, deixe por minha conta”.
É-nos oportuna a lembrança deste grande homem
público, que foi um sábio, principalmente quando em nosso país presenciamos os
lamentáveis acontecimentos envolvendo nossos políticos. Engaja-se hoje na busca
de poder a qualquer custo e falta-se com a ética. Tudo é levado em conta, menos
o essencial: o bem comum. A política que é a arte de trabalhar pelo bem comum,
perde-se em egoísmos.
O bem comum é o conjunto de condições concretas que
permitem a todos atingir níveis de vida compatíveis com a dignidade humana. A
corrupção porém, destrói o senso do bem comum na sociedade, desmoraliza a vida
pública, marginalizando e às vezes eliminando os honestos que se recusam a
corromperem-se. O que vemos são políticos desmoralizados, pelos quais a
nação perde o respeito, defenderem-se fazendo a mentira virar verdade e a
verdade tornar-se mentira.
Que Tomás Morus ilumine os políticos, para que
possam ter um mínimo de compostura. E que, os corruptos não nos façam esquecer
dos que se esforçam por serem honestos. Enfim, é permitido até mesmo pedir um
milagre ao santo. Que nossos políticos possam praticar o que ele ensina no seu
célebre livro já citado: “Velar por sua vantagem pessoal sem ofender as leis,
eis a sabedoria; trabalhar além disso pela vantagem da comunidade, eis a
virtude” ( Utopia, Livro IIº).
Dom Pedro
Carlos Cipollini
Bispo de
Santo André
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