Viajando pela Galileia, Jesus pergunta aos
discípulos o que pensam dele. Pedro, em nome de todos, confessa que Ele é o
Cristo, o Messias esperado há séculos. Para evitar toda possibilidade de
equívoco, Jesus explica claramente como pretende atuar a sua missão. Libertará,
sim, o seu povo, mas pagando em primeira pessoa: deverá sofrer muito, ser
rejeitado, ser morto e, três dias depois, ressuscitar. Pedro, como muitos
outros, imaginava o Messias como alguém que agiria como poder e força, vencendo
os romanos e dando à nação de Israel seu devido lugar no mundo. E recrimina
Jesus que, por sua vez, o repreende: “Não tens em mente as coisas de Deus, e
sim, as dos homens” (cf 8,31-33).
Jesus retoma o caminho, dessa vez rumo a Jerusalém,
onde se cumprirá o seu destino de morte e ressurreição. Agora que seus
discípulos sabem que Ele irá para morrer, será que ainda querem segui-lo? As
condições que Jesus coloca são claras e exigentes:
“Se alguém
quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me!”
Todos tinham ficado fascinados por Ele, o Mestre,
enquanto lançavam as redes para a pesca ou estavam à mesa dos impostos. Tinham
abandonado barcos, redes, a mesa, pai, casa, família, para segui-lo. Viram
milagres, ouviram palavras de sabedoria. Seguiram-no animados por alegria e
entusiasmo.
No entanto, seguir Jesus significava compartilhar
plenamente sua vida e seu destino: o insucesso e a hostilidade, até mesmo a
morte, e que tipo de morte! A mais dolorosa, reservada aos assassinos e aos
mais atrozes delinquentes. Uma morte que as Escrituras definiam “maldita” (cf
Dt 21,23). Até o nome “cruz” aterrorizava. É a primeira vez que essa palavra
aparece no Evangelho. Quem sabe que impressão ela deixou naqueles que o
escutavam.
Agora que Jesus afirmou claramente sua própria
identidade, pode mostrar com igual clareza a identidade do seu discípulo. Se o
Mestre ama seu povo até o ponto de morrer por ele, também o discípulo deverá
deixar de lado seu próprio modo de pensar, para compartilhar em tudo o caminho
do Mestre, a começar pela cruz.
“Se alguém
quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me!”
Ser cristão significa ser outro Cristo: que haja “o
mesmo sentir e pensar que no Cristo Jesus”, que “humilhou-se, fazendo-se
obediente até a morte – e morte de cruz!” (Fl 2,5.8), até poder dizer com
Paulo: “Eu vivo, mas não eu, é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20); não saber
outra coisa “a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado” (1Cor 2,2). É Jesus
que continua a viver, a morrer, a ressuscitar em nós. Mas, como seguir Jesus de
modo a se tornar como o Mestre?
O primeiro passo é “renunciar a si mesmo”, ao
próprio modo de pensar: não pensar de acordo com os homens, mas de acordo com
Deus. Às vezes procuramos o sucesso fácil e imediato, olhamos com inveja a quem
faz carreira, sonhamos em ter uma família unida e em construir ao nosso redor
uma sociedade fraterna, uma comunidade cristã, mas sem ter de pagar por tudo
isso um caro preço. Renunciar a si mesmo significa entrar no modo de pensar que
Jesus mostrou: a lógica da semente que deve morrer para produzir frutos, da
alegria maior que se encontra ao dar do que ao receber, do oferecer a vida por
amor, do tomar sobre si a própria cruz:
“Se alguém
quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me!”
A cruz de “cada dia”: uma doença, uma demissão, a
incapacidade de administrar problemas familiares ou profissionais, o insucesso
em criar relacionamentos autênticos, a sensação de impotência diante dos
grandes conflitos mundiais, a indignação diante dos constantes escândalos na
sociedade… Ninguém precisa procurar a cruz: ela vem quando menos esperamos e da
forma que nunca imaginamos. O convite de Jesus é “tomá-la”: não aceitá-la com
resignação, como um mal inevitável, não deixá-la cair sobre nós, esmagando-nos,
nem sequer suportá-la com atitude estoica e desprendida. Mas acolhê-la como
possibilidade de viver em comunhão com Ele inclusive naquela dor, porque, com a
sua cruz, Jesus tomou sobre seus ombros todas as nossas cruzes. Portanto, em
todo sofrimento podemos encontrar Jesus.
A esse respeito Igino Giordani considera que a cruz
“pesa menos se Jesus nos faz as vezes de Cireneu”. E pesa ainda menos,
continua, se a carregarmos juntos: “Uma cruz carregada por uma criatura, no fim
esmaga; carregada juntamente por várias criaturas tendo Jesus no meio, ou seja,
tomando Jesus por Cireneu, torna-se leve: jugo suave”.
Portanto, tomar a cruz, sabendo que Ele a carrega
conosco, é relação, é pertencer a Jesus até à plena comunhão com Ele, até nos
transformarmos em “outros Ele”. É assim que seguimos Jesus e nos tornamos
verdadeiros discípulos. Então a cruz será também para nós “força de Deus” (cf
1Cor 1,18), caminho de ressurreição. Em cada fraqueza encontraremos a força, em
cada escuridão, a luz, em cada morte, a vida, porque encontraremos Jesus.
Fabio Ciardi
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Movimento Focolares
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