Um apelo
inspirado pela carta encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco foi assinado por
cardeais, patriarcas e bispos, representantes das conferências episcopais
continentais das diversas partes do mundo, e dirigido à COP 21, à Conferência
das partes sobre a mudança climática que terá lugar em Paris de 30 de Novembro
a 11 de Dezembro próximos, com o convite a trabalhar pela aprovação de um
acordo sobre o clima que seja equitativo, juridicamente vinculante e que leve a
uma mudança verdadeira.
Representando a Igreja Católica dos cinco
continentes, nós, Cardeais, Patriarcas e Bispos, juntámo-nos para expressar, em
nosso próprio nome e em nome das populações ao nosso cuidado, a esperança muito
difusa de que um acordo climático justo e juridicamente vinculativo será
alcançado nas negociações da COP 21, em Paris. Apresentamos uma proposta de
linhas de orientação com dez pontos, a partir da experiência concreta de
pessoas de todos os continentes, e estabelecendo um elo entre as alterações
climáticas e a injustiça social e exclusão social dos nossos cidadãos mais
pobres e mais vulneráveis.
Alterações
Climáticas: desafios e oportunidades
Na sua carta encíclica, Laudato Si’ (LS), dirigida
‘a cada pessoa que habita neste planeta’ (LS 3), o Papa Francisco sustenta que
‘as mudanças climáticas constituem atualmente um dos principais desafios para a
humanidade’ (LS 25). O clima é um bem comum, que pertence a todos e a todos se
destina (LS 23). ‘O meio ambiente é um bem coletivo, património de toda a
humanidade e responsabilidade de todos’ (LS 95).
Quer sejamos crentes ou não, estamos hoje de acordo
que a terra é essencialmente uma herança comum, cujos frutos se destinam ao
benefício de todos. Para os crentes, trata-se de uma questão de fidelidade ao
Criador, uma vez que Deus criou o mundo para todos. Por conseguinte, qualquer
abordagem ecológica deve integrar uma perspetiva social que tenha em atenção os
direitos fundamentais dos pobres e mais desfavorecidos (LS 93).
Os danos provocados no clima e no meio ambiente têm
enormes repercussões. O problema gerado pela dramática aceleração das
alterações climáticas tem efeitos globais. Constitui um desafio à redefinição
das nossas noções de crescimento e de progresso. Coloca uma questão de estilo
de vida. É imperativo que encontremos uma solução que seja consensual, devido à
escala e à natureza global do impacto do clima, pelo que se exige uma
solidariedade que seja universal, uma ‘solidariedade entre as gerações’ e
‘entre os indivíduos da mesma geração’ (LS 13, 14, 162).
O Papa define o nosso mundo como ‘a nossa casa
comum’ e, no exercício do nosso ofício de administradores, temos de dar atenção
à degradação humana e social que é consequência de um meio ambiente
deteriorado. Apelamos a uma abordagem ecológica integral, apelamos a que a
justiça social ocupe um lugar central, ‘para ouvir tanto o clamor da terra como
o clamor dos pobres’ (LS 49).
O
desenvolvimento sustentável deve incluir os pobres
Enquanto deplora o impacto dramático das rápidas
alterações climáticas no nível dos oceanos, em fenómenos climáticos extremos,
nos ecossistemas em deterioração e na perda de biodiversidade, a Igreja é
também testemunha de como as alterações climáticas estão a afetar as
comunidades e populações vulneráveis, que são gravemente prejudicadas. O Papa
Francisco alerta-nos para o impacto irreparável das alterações climáticas
desenfreadas em muitos países em desenvolvimento do mundo. Além disso, no seu
discurso às Nações Unidas, o Papa afirmou que o abuso e a destruição do meio
ambiente são também acompanhados de um persistente processo de exclusão1.
Líderes
corajosos à procura de acordos executáveis
A edificação e manutenção de uma casa comum
sustentável requerem uma liderança política corajosa e imaginativa. São
necessários sistemas normativos que estabeleçam com clareza determinados
limites e assegurem a proteção do ecossistema (LS 53).
Há dados científicos credíveis que sugerem que as
alterações climáticas aceleradas são resultado da atividade humana desenfreada,
ao serviço de um modelo particular de progresso e de desenvolvimento, e que uma
das causas principais reside na excessiva dependência dos combustíveis fósseis.
O Papa e os Bispos católicos dos cinco continentes, sensíveis aos danos que são
provocados, apelam a uma drástica redução das emissões de dióxido de carbono e
outros gases tóxicos.
Unimos a nossa voz ao apelo do Santo Padre em favor
de um progresso significativo em Paris, de um acordo compreensivo e de mudança
apoiado por todos, com base em princípios de solidariedade, justiça e
participação2. Este acordo deve colocar o bem comum à frente dos interesses
nacionais. É também essencial que as negociações desemboquem num acordo
executável que proteja a nossa casa comum e todos os seus habitantes
Nós, Cardeais, Patriarcas e Bispos, proferimos um
apelo geral e propomos dez propostas específicas de orientação. Apelamos à COP
21 que formule um acordo internacional para limitar o aumento global da
temperatura aos parâmetros atualmente sugeridos pela comunidade científica
global, de modo a evitar impactos climáticos catastróficos, especialmente para
os mais pobres e para as comunidades mais vulneráveis. Estamos de acordo quanto
à existência de uma responsabilidade comum, mas também diferenciada, de todas
as nações. Os distintos países alcançaram um estádio diverso de
desenvolvimento. É imperativo que se trabalhe em conjunto em prol de um
empreendimento comum.
Os nossos
dez apelos:
1. ter em atenção não apenas as dimensões técnicas
mas particularmente éticas e morais das alterações climáticas, como indicado no
Artigo 3 da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas
(CQNUAC).
2. aceitar que o clima e a atmosfera são bens
comuns globais que a todos pertencem e a todos se destinam.
3. adotar um acordo global justo, de mudança e
juridicamente vinculativo, com base na nossa visão comum do mundo que reconhece
a necessidade de viver em harmonia com a natureza, e que garanta que todos
possam fruir dos direitos humanos, incluindo os direitos dos Povos Indígenas,
das mulheres, jovens e trabalhadores.
4. impor limites estritos ao aumento global da
temperatura e estabelecer um objetivo de completa descarbonização para meados
do século, com vista a proteger as comunidades de primeira linha que sofrem os
impactos das alterações climáticas, como aquelas das Ilhas do Pacífico e das
regiões costeiras. • assegurar que o limite de temperatura é codificado num
acordo global juridicamente vinculativo, com compromissos e ações de mitigação
ambiciosos por parte de todos os países, reconhecendo as suas responsabilidades
comuns, mas diferenciadas, e respetivas capacidades (CBDRRC), com base em
princípios de equidade, responsabilidades históricas e no direito ao
desenvolvimento sustentável para assegurar que as reduções das emissões dos
governos estão em linha com o objetivo de descarbonização, os governos têm de
desenvolver revisões periódicas dos compromissos que estabelecem e das ambições
que manifestam. E, para terem sucesso, estas revisões têm também de se basear
nos dados científicos e na equidade e devem ser obrigatórias.
5. desenvolver novos modelos de desenvolvimento e
estilos de vida que sejam compatíveis com o clima, enfrentem as desigualdades e
tirem as pessoas da pobreza. Um elemento primordial para que tal aconteça é pôr
fim à era dos combustíveis fósseis, calendarizando a redução das emissões de
combustíveis fósseis, incluindo as emissões militares, da aviação e da marinha,
e proporcionando a todos o acesso a energias renováveis económicas, fiáveis e
seguras.
6. assegurar que as pessoas possam ter acesso à
água e à terra para desenvolverem sistemas alimentares resistentes às condições
climatéricas e sustentáveis, que deem prioridade às soluções propostas pelas
populações e não aos lucros.
7. assegurar que os mais pobres, mais vulneráveis e
quantos sofrem maiores impactos possam participar em todos os níveis dos
processos de tomada de decisões.
8. assegurar que o acordo de 2015 aponte para uma
abordagem de adaptação que responda adequadamente às necessidades imediatas das
comunidades mais vulneráveis e tenha em conta as alternativas locais.
9. reconhecer que as necessidades de adaptação
dependem do sucesso das medidas de mitigação a serem tomadas. Os responsáveis
pelas alterações climáticas têm a responsabilidade de apoiar os mais
vulneráveis na sua adaptação, a gerirem as perdas e os danos, e devem partilhar
a tecnologia e o saber-fazer necessários.
10. oferecer quadros de referência claros quanto ao
modo como os países irão dar resposta à provisão de compromissos financeiros
fiáveis, consistentes e adicionais, assegurando um financiamento equilibrado de
ações de mitigação e necessidades de adaptação.
Tudo isto implica uma educação e uma consciência
ecológica sérias (LS 202-215).
Oração
pela Terra
Deus de amor, ensina-nos a cuidar deste
mundo como nossa casa comum.
Inspira os líderes governamentais que se
reúnem em Paris:
− para que escutem e prestem atenção ao
clamor da terra e ao clamor dos pobres;
− para que se unam de mente e coração
dando uma resposta corajosa;
− que busque o bem comum e proteja o belo
jardim terrestre que criaste para nós, para todos os nossos irmãos e irmãs,
para todas as gerações vindouras.
Ámen
____________
1 Discurso do Santo Padre, Sede da Organização das
Nações Unidas, Nova Iorque, Sexta-feira 25 de Setembro de 2015.
2 Discurso do Papa Francisco aos Ministros do Meio
Ambiente dos Países Membros da União Europeia, Cidade do Vaticano, Quarta-feira
16 de Setembro de 2015.
BISPOS SIGNATÁRIOS DA PRESENTE DECLARAÇÃO:
Sua Eminência o Cardeal Oswald GRACIAS
Arcebispo
de Bombaim, Índia, Presidente da FABC (Ásia)
Sua Excelência Mons. Gabriel MBILINGI,
CSSp
Arcebispo
de Lubango, Angola, Presidente do SECAM (África)
Sua Eminência o Cardeal Péter ERDŐ
Arcebispo
de Esztergom – Budapeste, Hungria, Presidente da CCEE (Europa)
Sua Excelência Mons. Joseph E. KURTZ
Arcebispo
de Louisville, USA, Presidente da USCCB (USA)
Sua Eminência o Cardeal Reinhard MARX
Arcebispo
de München und Freising, Alemanha, Presidente da Comece (Europa)
Sua Excelência Mons. John RIBAT, MSC
Arcebispo
de Port Moresby, Papua-Nova Guiné, Presidente FCBCO (Oceania)
Sua Eminência o Cardeal Rubén Salazar
GÓMEZ
Arcebispo
de Bogotá, Colômbia, Presidente del CELAM (América Latina)
Sua Excelência Mons. David DouglAs CROSBY
Bispo
de Hamilton, Canada, Presidente do CCCB-CECC (Canadá)
Sua Beatitude o Cardeal Béchara Boutros
RAÏ
Patriarca
de Antioquia dos Maronitas (Líbano),
Presidente
CCPO, (Conselho dos Patriarcas católicos de Oriente)
Escrito em colaboração com as redes católicas CIDSE
(Coopération Internationale pour le Développement et la Solidarité) e Caritas
Internationalis, e com o patrocínio do Pontifício Conselho «Justiça e Paz».
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News Va.
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